Dezembros Selvagens, de Edna O'Brien | Ricardo de Mattos | Digestivo Cultural

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Quinta-feira, 19/2/2004
Dezembros Selvagens, de Edna O'Brien
Ricardo de Mattos
+ de 7800 Acessos

Por vezes arrisco adquirir obras de compositores e escritores desconhecidos por mim. Não é raro entrar na livraria ou na loja de artigos musicais, deparar-me com um nome inédito, folhear ou ouvir trechos das músicas e adquirir o livro ou o CD. Este tipo de aposta é parece revelar uma predisposição ao jogo. Contudo, afirmo que até hoje só tive ganhos. Ocorre ainda eu obter - aqui reunidos o comprar e o ganhar - uma obra alvo de investigação prévia e mínima, insuficiente para a maioria das pessoas. É o caso de Dezembros Selvagens, o segundo livro da escritora irlandesa Edna O'Brien (1.932) lançado no Brasil, primeiro de ficção. O outro foi a biografia de James Joyce e faz parte d'uma coleção de livros com textos sucintos sobre a vida de algumas personalidades, entre as quais Mozart e Santo Agostinho.

O irlandês encontra muito de sua história e de sua mitologia n'este romance. Na primeira metade do século XIX as plantações irlandesas de batata foram devastadas por um fungo e a carestia conseqüente baptizou o período como o da Grande Fome. Informações da época consignam o advento nocturno da praga de ferrugem e é com este facto que O'Brien compara o retorno d'um personagem à comunidade rural de Cloontha. Este esmero não prejudica a leitura pelo alienígena, amparado como está por notas suficientes. Narrativa linear, variando com elegância de coloquialismos à correção, sempre uma exposição competente do íntimo de suas criaturas.

Joseph Brennan é o ápice do triângulo principal de personagens. Filho de uma antiga família do lugarejo montanhês, construiu seu Tir-na-N-og particular e qualquer mudança ou ameaça de alteração aflige-o até a loucura. Toda sua vida, sua fazenda, seus hábitos e até a vida de sua irmã, tudo era organizado da forma mais próxima possível de seu ideal. Para algumas mudanças terem lugar, tornou-se necessário vir alguém de fora, pois os locais não se atreveriam a afrontar Brennan. Até determinado ponto ele tem razão. Quem tem seu locus amoenus, com raízes estendidas pelo tempo, referências, lembranças e sabe valorá-los, incomoda-se com a insensibilidade alheia. Brennan erra primeiro ao encarar como afronta pessoal as mudanças advindas com os novos tempos; segundo, ao ofender-se com tudo feito por seu vizinho Bugler. Terceiro erro, bem ligado ao segundo, interfere na vida exterior aos limites de sua propriedade. É triste constatar que ele poderia manter o estilo de vida com o qual estava habituado se não fosse por estes erros. Desgasta-se em demasia com seu medo, perde a percepção lúcida, emprega tempo e dinheiro com providências inúteis. Enquanto escrevo, lembro do personagem e percebo a acuidade de O'Brien ao imaginá-lo - ou retratá-lo.

Michael Bugler também era natural de Cloontha. Saiu d'esta comunidade para pastorear ovelhas na Austrália, abafando bastante a voz do sangue irlandês. Retornando, porta-se despreocupadamente. Não é proposital nem consciente o desagrado que causa a Brennan. Apenas dedicou anos ao cuidado de carneiros, sem nenhuma atenção para os assuntos genealógicos e consuetudinários. Voltou e não percebeu a importância deles para a comunidade, mormente para seu vizinho e rival. Bugler e Brennan estabelecem no princípio laços de amizade entusiasmada - pessoas de mesmo nível e origem deveriam ser amigas -, mas fracos demais para extinguir uma vendetta e impedir o surgimento de aborrecimentos.

Breege Brennan é peça do acervo pessoal de seu irmão Joseph. Com a chegada de Bugler, inicia-se um previsível e frágil romance e ela mostra não saber como agir. Também tem seu cosmos, inda que subsidiário ao do irmão, e encontra dificuldades para sair desta região íntima. Prova disso vem adiante quando ela engravida e precisa ser internada como histérica. Percebe-se que o sentimento comum aos irmãos é o medo, diferindo a manifestação. Joseph esfalfa-se buscando resguardar-se, Breege permanece inerte. Ele fala e ameaça, ela emudece: ambos temerosos ante o novo que um rejeita e o outro acolhe. Verifica-se a mesma ramificação na veneração pelos mortos. Joseph confere-lhes o tratamento de pais fundadores de sua estirpe; Breege visita o cemitério a fim de conservar a convivência com os entes dilectos.

O'Brien foi muito cuidadosa ao não deixar o sentimento demonstrado por Joseph em relação a Breege decair a um caso vulgar de ciúme incestuoso. Basta volver ao apego dele por suas coisas. Como irmão mais velho, imaginava caber a ele a escolha de um noivo para sua irmã e adequado aos seus próprios ideais, ou seja, alguém que não interferisse nos seus planos e hábitos. O filho de Breege poderia sair ao pai, indiferente às tradições e cismar com alterações. Poderia atrapalhar os planos post mortem de Brennan. Atente-se a este trecho: "Joseph se segurou no portão porque precisava, seu mundo estava escapando dele, se o que ouvira era verdade. (...) O pensamento de que ela podia ter se entregado, que o sangue de Bugler pudesse estar misturado ao deles o enlouqueceu ...".

Merecem atenção os personagens secundários. Até a primeira metade do romance eles aparecem regularmente, sendo posteriormente esquecidos. Cada um renderia ao menos um conto. Caco Velho, o homem deformado dedicado a epigramas. As irmãs Rita e Reena, cuja subsistência depende da utilização do sexo para coagir, ameaçar ou processar os homens conforme o caso e a necessidade. O juiz que preside a primeira lide entre Bugler e Brennan e os advogados na condução das demais disputas.

Para ir além






Ricardo de Mattos
Taubaté, 19/2/2004

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