Pessoas digitais | Ana Elisa Ribeiro | Digestivo Cultural

busca | avançada
84380 visitas/dia
2,0 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Documentário 'O Sal da Lagoa' estreia no Prime Box Brazil
>>> Mundo Suassuna viaja pelo sertão encantado do grande escritor brasileiro
>>> PEGADAS DA GÁVEA VAI MOVIMENTAR O BAIRRO DE 26 A 28 DE ABRIL
>>> Ole! Feira Flamenca completa 15 anos com programação especial em SP
>>> Desenhos de Bruno de Abreu sugerem memórias sem linearidade narrativa
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
>>> Xingando semáforos inocentes
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
>>> Esporte de risco
>>> Tito Leite atravessa o deserto com poesia
>>> Sim, Thomas Bernhard
Colunistas
Últimos Posts
>>> Glenn Greenwald sobre a censura no Brasil de hoje
>>> Fernando Schüler sobre o crime de opinião
>>> Folha:'Censura promovida por Moraes tem de acabar'
>>> Pondé sobre o crime de opinião no Brasil de hoje
>>> Uma nova forma de Macarthismo?
>>> Metallica homenageando Elton John
>>> Fernando Schüler sobre a liberdade de expressão
>>> Confissões de uma jovem leitora
>>> Ray Kurzweil sobre a singularidade (2024)
>>> O robô da Figure e da OpenAI
Últimos Posts
>>> Salve Jorge
>>> AUSÊNCIA
>>> Mestres do ar, a esperança nos céus da II Guerra
>>> O Mal necessário
>>> Guerra. Estupidez e desvario.
>>> Calourada
>>> Apagão
>>> Napoleão, de Ridley de Scott: nem todo poder basta
>>> Sem noção
>>> Ícaro e Satã
Blogueiros
Mais Recentes
>>> E eu não gosto também de Tolstoi
>>> Steve Jobs (1955-2011)
>>> A favor do Brasil, contra a seleção!
>>> Um pequeno retângulo azul
>>> Sangue, Carne e Fritas
>>> Entrevista com Leandro Carvalho
>>> O conto como labirinto em Milton Hatoum
>>> Somos diferentes. E daí?
>>> Free: o futuro dos preços é ser grátis
>>> Bonecas Russas especial
Mais Recentes
>>> No Tempo Do Feudalismo de Maria Jose Acedo Del Olmo pela Ática (2004)
>>> Pare De Se Sabotar E De A Volta Por Cima de Flip Fippen pela Sextante (2010)
>>> 3 Marias, 3 Bolos, 3 Meninos de Sueli Ferreira De Oliveira pela Cpb (2011)
>>> Manual De Esportes Do Cascão de Mauricio de Sousa pela Globo (2003)
>>> Almanaque Jedi - Guia Do Universo Star Wars Feito Por Fas Para Fas de Brian Moura, Henrique Granado pela Leya Brasil (2015)
>>> Amores Em Cena Numa Noite De Verão de Gerlis Zillgens pela Melhoramentos (2008)
>>> Diario De Uma Garota Nada Popular - Vol. 3,5 de Rachel Renee Russell pela Verus (2012)
>>> Almanaque Sitio - Futebol de Fulvio Giannella Junior pela Globo (2012)
>>> O Outro Lado Da Ilha - Serie Vaga-Lume de José Maviael Monteiro pela Atica (1987)
>>> Crônica De Um Amor Louco - Coleção L&pm Pocket 574 de Charles Bukowski pela L&pm (2009)
>>> A Literatura Portuguesa Através dos Textos de Massaud Moisés pela Cultrix (1987)
>>> Pinóquio As Avessas de Rubem Alves - Mauricio de Sousa pela Verus - Mauricio de Sousa (2010)
>>> O Livro De Ouro Do Universo de Ronaldo Rogerio De Freitas Mourao pela Nova Fronteira (2001)
>>> Tudo Sobre Canarios de Mauro Mello Mattos pela Ediouro (1987)
>>> A Revolução Tecnologica da Gramatizaçao de Sylvain Auraux pela Unicamp (1992)
>>> A Vida de Cristo Ilustrada por Gustave Doré de Gustave Doré - Prof E Olivio pela Expel (1966)
>>> Liturgia - Peregrinacao Ao Coracao Dos Misterio de Valeriano Santos Costa pela Paulinas (2009)
>>> Leonardo Da Vinci - O Códice Atlântico - vol 1 de Leonardo Da Vinci pela Folio (2008)
>>> Uma Ponte Para Terebin de Leticia Wierzchowski pela Record (2006)
>>> A Turma Da Rua Quinze de Marçal Aquino pela Ática (2015)
>>> Eclipse de Stephenie Meyer pela IntrÍnseca (2009)
>>> Murilo Rubiao de Murilo Rubiao pela Companhia De Bolso (2010)
>>> Programação Orientada a Objetos com Java de Barnes Kolling pela Pearson (2009)
>>> Programa Do Livro-texto de Daltamir Justino Maia pela Pearson (2006)
>>> E Eu Com Isso? de Brian Moses pela Scipione (1999)
COLUNAS

Quarta-feira, 4/5/2005
Pessoas digitais
Ana Elisa Ribeiro
+ de 6300 Acessos
+ 1 Comentário(s)

Você que lê o Digestivo Cultural provavelmente lê mais do que um bilhetinho de namorada e escreve mais do que apenas o seu nome. Também já deve ter passado daquela fase em que é preciso pintar o dedão de preto e esfregá-lo no papel. Pois bem, é assim que as pessoas deixam de ser analfabetas, mas isso não é suficiente para que sejam letradas.

Letrado não é aquela pessoa que lê muitos livros de literatura e sabe uns trechos de Macbeth de cor. Letramento é um conceito da área de educação que ganhou as escolas e tem sido tratado com muita deferência, especialmente pelos professores de Português.

O letramento, especialmente discutido pela Profa. Magda Becker Soares, vem oferecer um gradiente de versatilidade do indivíduo na lide com textos de gêneros diversos. Não basta assinar o nome para ser letrado, mas também não se deixa de sê-lo caso sejam conhecidos alguns parâmetros das produções textuais orais e escritas que circulam na sociedade.

Para ser letrado, é preciso saber passear por entre os textos, lê-los conforme as condições para as quais e nas quais foram produzidos. Também é necessário saber estabelecer a comunicação por meio de gêneros diversificados de textos, com funções e aparatos de produção diversos.

Com o computador e a Internet, as pessoas inventaram, pelo uso, novas formas de interagir. Junto com isso, emergiram novos gêneros de texto, embora familiares, já que costumam ser parentes de gêneros mais antigos. O e-mail guarda os genes da carta; o chat aproveita aspectos da conversa telefônica; as reportagens ganham uma fragmentação facilitadora para a leitura em tela. E as pessoas que têm acesso à rede começam a navegar pelo letramento digital, em que textos têm especificidades desenvolvidas para o novo meio.

A perspectiva histórica esclarece que as interfaces do computador foram desenvolvidas à semelhança dos materiais impressos. Exemplos disso são a "página" em branco do Word e os ícones que representam lixeiras e pastas. Essa representação foi pensada para aproximar o leitor da máquina, e não para causar nele a sensação da ignorância. O teclado do computador guardou semelhanças com o teclado da máquina de datilografar; a área de trabalho foi feita com ícones justamente para quem não sabe ler. E assim caminharam os projetos que procuravam a adesão do leitor.

Discutir letramento é, obrigatoriamente, também pensar as práticas de leitura dos suportes digitais, que ainda estão por serem estabelecidas nos usos sociais que fizermos delas. Na escola, o professor se depara com dois extremos: o aluno que não aprendeu a usar as máquinas e o aluno que só sabe usá-las. Dois extremos igualmente importantes e cujas falhas começam a aparecer. De um lado, indivíduos que não conhecem as possibilidades da rede; de outro, indivíduos que trocaram a manipulação e a pesquisa pelas respostas prontas do buscador Google. O resultado, no entanto, é o mesmo: pessoas que não sabem ler e selecionar informação.

A pesquisa na escola, há aproximadamente vinte anos, era pedir aos alunos que procurassem nas enciclopédias famosas um verbete de biologia ou a vida de um cientista. Os garotos e garotas daquela época sabiam procurar em índices remissivos e navegavam pelos verbetes com bastante desenvoltura. Assim que encontravam o objeto de pesquisa, copiavam caprichosamente no caderno e entregavam à professora, que dava visto em 30 ou 40 trabalhos idênticos. Não se ensinava a pensar, a triar, a procurar com a inteligência, a fazer perguntas específicas e tirar as respostas do geral, a organizar, a escrever autoralmente.

Hoje em dia, a escola pede a pesquisa e o aluno não tem sequer o trabalho de copiar. A chave de tudo está na Internet, que oferece trabalhos prontos para impressão. Esses alunos também não triam, não selecionam, não pensam autonomamente e, em geral, são incapazes da escrita autoral. A tecnologia muda, mas a escola continua a mesma.

Letramento é empregar todas as fontes, saber lê-las e saber organizar o que é de interesse de cada um ou o que é pertinente a uma proposta de estudo e pesquisa.

Meninos "analógicos" não sabem buscar com instrumentos eletrônicos; meninos "digitais" precisam aprender a navegar uma enciclopédia, um sumário de revista e as páginas de um livro. Uns não sabem o que é verbete e nem que a lombada é tão importante em alguns tipos de livro de consulta; outros não sabem o que é um link e como funciona um sistema de busca digital. De qualquer forma, importante é não separar as mídias como se fossem estanques e levar as pessoas a navegar por todo tipo de suporte, todo gênero de texto. Cada indivíduo deve alcançar o letramento, seja ele no papel ou no monitor.

Casilla del diablo
"ciempiés, ey!" E eu corria, corria, corria, ia em direção à travessa estreita e virava à direita, outra travessa, mais uma e então pensava que estaria na avenida de seis pistas. Àquela hora não havia carros e nem pessoas. Poderia correr e correr até me livrar dele. "ciempiés! Ey!". Logo atrás de mim. Corria mais do que eu e vinha célere em direção à minha nuca. Nem sei se era mesmo homem. Talvez fosse um travesti. As unhas eram grandes como as da minha avó, a que era pomba-gira. Os cabelos dele são compridos e cheiram mal. "Pára". Não sei español. Não podia assistir sequer aos seriados da tevê a cabo. Corro, corro, corro e sei que ele quer me pegar e eu tenho razão para correr muito. A próxima travessa me deixa perto da Santa Casa de Misericórdia. Diz o porteiro do prédio que aquilo lá é um hospital. Não dá abrigo às almas penadas e nem é refúgio de quem arranhou os brios do santo de cabeça. "Ciempiés". Ele sequer perde o fôlego. Corro muito para entrar num bar, qualquer porta aberta que me abrigue por uns instantes. Posso despistá-lo. Posso me travestir de dona louca ou de santa desatadora de nós. A esta hora da madrugada até mesmo os bandidos já estão podres de bêbados. "La finca, ey". Tem voz de mexicano, mas sei que o diabo é chileno, como Neruda, eu acho. Dizia minha mãe que o diabo é poeta. Deus deve ser editor. "Finca la linda!". Corro, corro, tropeço, trôpego novamente, tropeço, mas não caio. Corro e quase não respiro. Corro e atravesso avenidas. Nem há trânsito por aqui. As lendas desta cidade incluem o capeta do Vilarinho. Dizem que ele vem para atacar meninas insinuantes. Mas não sou insinuante, nem menina. "Finca la linda!" E se eu parasse? E se eu o mirasse nas pupilas? E se o perguntasse o que quer? Ele quase me alcança. Eu corro mais. Mais uma rua. Mais duas e estarei em casa. Mas sempre me disseram que o diabo tinha patas e chifres. E talvez fosse rabudo e vermelho como um porco velho. Não imaginei que ele fosse chileno. Argentino já me havia passado pela cabeça. "Finca!" Um carro, dois. Será que ninguém vê? Ele me pega pelo pé. Rolamos no chão até esfolarmos as testas. Não tem chifres nem olhos de fogo. Mas chama-se Ignácio e me diz que ha me capturado e que "soy el guardián del diablo".

Nota do Editor
O conto (acima) foi originalmente publicado no especial "Cramulhão", da revista Patife, editada por Ana Elisa Ribeiro junto com Jorge Rocha e George Cardoso.


Ana Elisa Ribeiro
Belo Horizonte, 4/5/2005

Mais Ana Elisa Ribeiro
Mais Acessadas de Ana Elisa Ribeiro em 2005
01. Mapa da sala de aula - 6/4/2005
02. Para gostar de ler? - 24/8/2005
03. Publicar um livro pode ser uma encrenca - 28/12/2005
04. Escrever bem e os 10 Mandamentos - 20/7/2005
05. Sexo pra quê? Texto onde? - 26/1/2005


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
4/5/2005
13h56min
Interessante, Ana Elisa, você ter escrito sobre letramento sem citar a erudição, um termo em desuso hoje. Após mais de uma década lidando com TI, percebi que minha formação humanística era praticamente nula e, hoje, estou finalizando minha graduação em Filosofia. Por que estou te contando isso? Porque, com o passar do tempo, a verticalização do conhecimento nos deixa com uma sensação de vazio existencial. É a hora em que buscamos entender nossas relações humanas e, principalmente, descobrir quem somos. Na Idade Moderna, havia o Studia Humanitatis, hoje não temos algo parecido na grade curricular de nosso ensino. Erudição, letramento, talvez fique difícil em meio à luta pela sobrevivência diária, que nos consome, mas ainda é um objetivo fascinante. Ah, antes que me esqueça, os ícones da área de trabalho foram criados como interface gráfica, intuitiva, facilitadora, não tendo absolutamente nenhuma ligação com o analfabetismo.
[Leia outros Comentários de Marcelo Zanzotti]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




A Lenda de Argaios
Thiago Tavares
Feic
(2013)



O Guia Do Mochileiro Das Galáxias Vol. 1
Douglas Adams
Sextante
(2004)



Apresentações Vencedoras
Nei Loja
Record
(2004)



Jogadas de Abertura
Steven James
Companhia Nacional
(2015)



Praticando o caminho de Santiago
José Maria de Mesquita Jr.
O autor
(2000)



Curso de Direito do Trabalho Aplicado, V. 1
Homero Batista Mateus da Silva
Rt
(2017)



Febre de Cavalos
Leonardo Padura
Boitempo
(2022)



Projeto Felizes para Sempre
Alisa Bowman
Sextante
(2011)



Livro Literatura Estrangeira While England Sleeps
David Leavitt
Houghton Mifflin Company
(1995)



O Trem das Sete 302
Raul Seixas
Sampa





busca | avançada
84380 visitas/dia
2,0 milhão/mês