Silêncio | Verônica Mambrini | Digestivo Cultural

busca | avançada
55773 visitas/dia
2,0 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Núcleo de Artes Cênicas (NAC) divulga temporada de estreia do espetáculo Ilhas Tropicais
>>> Sesc Belenzinho encerra a mostra Verso Livre com Bruna Lucchesi no show Berros e Poesia
>>> Estônia: programa de visto de startup facilita expansão de negócios na Europa
>>> Água de Vintém no Sesc 24 de Maio
>>> Wanderléa canta choros no Sesc 24 de Maio
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
>>> Xingando semáforos inocentes
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
>>> Esporte de risco
>>> Tito Leite atravessa o deserto com poesia
>>> Sim, Thomas Bernhard
>>> The Nothingness Club e a mente noir de um poeta
Colunistas
Últimos Posts
>>> Folha:'Censura promovida por Moraes tem de acabar'
>>> Pondé sobre o crime de opinião no Brasil de hoje
>>> Uma nova forma de Macarthismo?
>>> Metallica homenageando Elton John
>>> Fernando Schüler sobre a liberdade de expressão
>>> Confissões de uma jovem leitora
>>> Ray Kurzweil sobre a singularidade (2024)
>>> O robô da Figure e da OpenAI
>>> Felipe Miranda e Luiz Parreiras (2024)
>>> Caminhos para a sabedoria
Últimos Posts
>>> AUSÊNCIA
>>> Mestres do ar, a esperança nos céus da II Guerra
>>> O Mal necessário
>>> Guerra. Estupidez e desvario.
>>> Calourada
>>> Apagão
>>> Napoleão, de Ridley de Scott: nem todo poder basta
>>> Sem noção
>>> Ícaro e Satã
>>> Ser ou parecer
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Notas de Protesto
>>> Um imenso Big Brother
>>> O enigma de Lindonéia
>>> Breve reflexão cultural sobre gaúchos e lagostas
>>> Orson Welles
>>> Crônica do Judiciário: O Processo do Sapo
>>> O produto humano
>>> O Conselheiro também come (e bebe)
>>> Do Manhattan Connection ao Saia Justa
>>> O Presépio e o Artesanato Figureiro de Taubaté
Mais Recentes
>>> África e africanias de José de Guimarães pela Museu afro brasil (2006)
>>> Caderno de leitura e literatura de Valores culturais pela Sesi-SP (2014)
>>> O Corpo Fala - Aprenda a captar os sinais de alerta de Patricia Foster pela Best Seller (1999)
>>> Historias Divertidas - Coleção Para Gostar De Ler de Vários autores pela Ática (2011)
>>> Livro Jovem Você Vai Se Arriscar? de Collin Standish pela Gutenberg (2022)
>>> Asa Branca de Luiz Gonzaga; Maurício Pereira pela Difusão Cultural do Livro (2007)
>>> Quanto Mais Eu Rezo, Mais Assombração Aparece! de Lenice Gomes; Angelo Abu pela Cortez (2012)
>>> O Bom É Inimigo do Ótimo de John L. Mason pela Legado (2004)
>>> Livro Adolescer, Verbo Transição de Organização Pan pela Opas (2015)
>>> Orientações e ações para a educação das relações étnico-raciais de Ministério de Estado da Educação pela Mec (2006)
>>> A Secularização - Coleção Teologia Hoje de Hubert Lepargneur pela Duas Cidades (1971)
>>> Livro A Família Gera o Mundo - As catequeses de quarta-feira de Papa Francisco pela Paulos (2016)
>>> Jesus e As Estruturas De Seu Tempo de E. Morin pela Edições Paulinas (1982)
>>> Nascido Profeta: A Vocação De Jeremias de Airton José Da Silva pela Edições Paulinas (1992)
>>> Livro SASTUN - Meu Aprendizado com um curandeiro Maia de Rosita Arvigo com Nadine Esptein pela Nova Era (1995)
>>> Livro Ele e Ela - Ditado pelo Espírito Maria Nunes de João Nunes Maia pela Fonte Viva (1999)
>>> A Arte De Morrer de Antônio Vieira; Alcir Pécora pela Nova Alexandria (1994)
>>> Superando o racismo na escola de Kabengele Munanga pela Mec (2008)
>>> A Vida Pré-Histórica: O Homem Fóssil - Coleção Prisma de Josué C. Mendes / Michael H. Day pela Melhoramentos (1993)
>>> Jack definitivo de Jack Welch / John A. Byrne pela Campus (2001)
>>> Você não está sozinho de Vera Pedrosa Caovilla/ Paulo Renato Canineu pela Abraz (2002)
>>> Livro Direito Empresarial e Tributário 220 de Pedro Anan Jr. e José Carlos Marion pela Alínea (2009)
>>> Paradiplomacia no Brasil e no mundo de José Vicente da Silva Lessa pela Ufv (2007)
>>> O mundo em que eu vivo de Zibia M. Gasparetto pela Espaço vida e consciência (1982)
>>> Orar é a solução de Joseph Murphy pela Record (1970)
COLUNAS

Segunda-feira, 12/2/2007
Silêncio
Verônica Mambrini
+ de 4600 Acessos
+ 4 Comentário(s)


Ilustra by Guga Schultze

Os ônibus rugindo presos sobre as avenidas, as maritacas em revoada barulhenta e algazarra, pessoas matraqueando cada vez mais alto em ambientes fechados. O rádio de um vizinho, a televisão eternamente ligada, o barulho do Messenger chamando insistentemente. O zumbido interminável e subterrâneo das CPUs processando, dos ventiladores esfriando as máquinas pensantes. A balada barulhenta na rua de baixo, os cachorros que latem dia e noite, as motos competindo num racha de madrugada. Turbinas de aviões vibrando, marteladas e furadeiras em uma reforma que nunca termina, música surgindo abafada não se sabe de onde, todos os sons transformados numa compacta massa sonora. A pancada aguda e impiedosa de um tiro. Pneus derrapando, burburinho, chuva, o metralhar nas teclas do computador. O motor da geladeira, a bomba de ar no aquário, a resistência aquecendo a água do chuveiro. A madeira da casa e dos móveis estalando, a respiração suja e rouca, as patas das baratas se arrastando por baixo dos móveis. A freqüência sutil e persistente da rede elétrica por dentro das paredes. E mesmo sendo uma ausência, em qualquer casa urbana o silêncio surge como uma ilha, material e sólido.

Ruído e silêncio em excesso são, ambos, enlouquecedores. Mas, em nome de valores como progresso e de uma suposta civilização, a sociedade ocidental contemporânea se construiu no som, optou por ele. O ruído é um resíduo da modernidade do qual parecemos nem mesmo nos dar conta. O efeito-estufa, a implosão da continuidade do tempo e a fragmentação da realidade, o excesso de imagens e a rapidez com que elas passam e se alternam diante do olhar, todos esses sintomas da pós-modernidade e da sociedade industrializada já foram de um modo geral assimilados, mas ainda incomodam, atordoam. O ruído, efeito colateral menor, não é percebido tão intensamente não porque não incomode; mas porque sua abundância afeta a capacidade de sentir, pouco a pouco.

As novas gerações já assimilaram o excesso visual, ainda que ele seja incômodo. É impossível não ceder, já que ele vem da televisão há muito tempo, do computador recentemente, e constantemente surgem novas mídias como suporte para um fluxo cada vez maior de informação. No que se refere a urbanismo, por exemplo, surgiu recentemente a tentativa de domar o cenário urbano por meio da lei "Cidade Limpa", que regulamenta a publicidade em outdoors e fachadas em São Paulo desde janeiro deste ano. Independentemente de dar certo, é uma tentativa de construir uma cidade visualmente mais harmoniosa. O mais perto que existe de uma lei para minorar o problema da poluição sonora em São Paulo é o "Psiu" (executado pela Divisão Técnica de Fiscalização do Silêncio Urbano), que fiscaliza o barulho de casas noturnas e restaurantes, templos religiosos e outras atividades cuja natureza cause poluição sonora. Mas, conforme dizem as leis que determinam a ação do Psiu, é preciso que o nível de ruído seja prejudicial à saúde ou bem-estar da população. Geralmente, quando esse tipo de fiscalização pública entra em ação, os níveis já extrapolaram o saudável há tempos e estão no limiar do suportável. O som ambiente sobe subrepticiamente, continuamente.

O som e o silêncio se tornaram uma questão fundamental para mim. A audição, como todos os sentidos, pode ser treinada, estimulada. Simplesmente refletir sobre ela, focar a atenção no que (não) se ouve é suficiente para começar a ouvir melhor. Respeitadas as limitações orgânicas de cada aparelho auditivo, é sempre possível ouvir mais. O inferno começou para mim de forma banal: um dia, ao desligar o computador, percebi que o ambiente que parecia silencioso para mim na verdade tinha o ruído forte de fundo da máquina. Barulho menor e uniforme, mas imperceptível até ser interrompido - um artifício do cérebro para manter a sanidade. Uma caixa de Pandora que mudou não só minha audição, mas como meus outros sentidos mediam minha percepção de mundo. É por isso que mais barulho automaticamente significa menos sensibilidade, incapacidade de captar nuances.

Desde então tento manter períodos de "jejum de sons"; literalmente um protesto silencioso. Pessoas que ligam a TV apenas para interromper o silêncio me incomodam, e não é pelo barulho em si, é pela falta de capacidade de lidar com o que o silêncio simbolicamente sugere: solidão, por exemplo. Metrô, motocicleta, tráfego de caminhão, caminhão de lixo: ruídos que estão constantemente na rotina, e que sequer entrariam numa descrição de romance urbano (mais charmoso falar de um barulho qualquer isolado na madrugada). Mas esses ruídos oscilam entre 90 e 120 decibéis, nível que pode causar perda irreversível da audição. Não é alarmismo: esse grau de ruído já foi socialmente assimilado como normal, sem ser. Uma solução prática para o problema é inviável, porque interfere na economia. Não dá para parar ônibus e metrô, tampouco imagino que existam empresários dispostos a investir em redução de emissão sonora no transporte público. Essa questão, perto de mil outras mais urgentes, é totalmente irrevelante.

(Levanto e vou até a cozinha buscar um copo d'água. Pela janela, vejo o lampejo claro da lua, por trás de uma camada de névoa. Resolvo sair até o quintal e olhar com calma, na noite de lua e verão, uma paisagem querida - é o último mês na casa em que cresci e vivi até hoje. Não só a paisagem, mas o ambiente sonoro é familiar. O vento ciciante, baixinho, uma ou outra motocicleta - sempre há uma, não importa a hora - e grilos, constantes, eternos, som de fundo da minha vida desde sempre. Uma combinação de sons tão poderosa quanto um cheiro da infância, como a voz de uma pessoa amada que já morreu.)

Creio que, com o perdão do terrível trocadilho, não haja eco para um breve manifesto em favor do silêncio, em seus infinitos graus de diluição. Mas ainda assim, é possível deixar de fazê-lo?

Nota do Editor
Leia também "Ensaios sobre o silêncio"


Verônica Mambrini
São Paulo, 12/2/2007

Quem leu este, também leu esse(s):
01. O melhor nacional do ano de Lucas Rodrigues Pires


Mais Verônica Mambrini
Mais Acessadas de Verônica Mambrini em 2007
01. Por onde andam os homens bonitos? - 17/12/2007
02. 453 – São Paulo para gregos e troianos - 29/1/2007
03. Insuportavelmente feliz - 17/9/2007
04. A Letras, como ela é? - 19/3/2007
05. A Arte da Entrevista - 8/10/2007


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
14/2/2007
15h32min
Cara Verônica, seu texto Silêncio é de uma sensibilidade gritante ("terrível trocadilho", né?). Há eco sim para manifestos como o seu. Parabéns de um leitor que se encantou com o que você escreveu. Se puder, veja os filmes "Os Cinco Sentidos" (de Jeremy Podeswa) e "O Segredo de Beethoven" (de Agnieszka Holland). Acho que você gostará. Tudo de bom!
[Leia outros Comentários de Marcus Terra]
14/2/2007
22h44min
Verônica, achei teu texto brilhante. Também sou contra o som e a fúria. Me incomoda, me agride, me irrita. Tem outra: em viagem recente, notei que, naqueles países mais miseráveis e debilitados, o nível de barulho aumenta. Na Áustria, por exemplo, nada se escuta, ninguém grita ou buzina. Na Romênia, a zoeira chega a incomodar a visão. E existe um célebre (para mim) aviso num subúrbio muito calmo da Austrália: "Não buzine, zona residencial". Pode?
[Leia outros Comentários de Cíntia Moscovich]
15/2/2007
11h27min
O silêncio sempre mora dentro de nós, mas, por medo do que ele possa nos dizer, nunca queremos ouvi-lo. E ficamos insistindo em abafar os nossos sentidos com barulhos que não nos dizem nada. Devemos parar e ouvir o que o silêncio que nos dizer.
[Leia outros Comentários de felipe coutinho]
21/2/2007
10h24min
Os contrastes, as pausas, as inflexões e tudo de que é constituído o silêncio; o prenúncio da mensagem, o instante exato da captura da atenção. Acho que é deste "estar" e "não estar" que vivenciamos, e nos ruídos ordinários onde se oculta tudo o que não é análogo, que se oculta o silêncio. O fundo sonoro numa grande cidade diluí nossa identidade no excesso de informação e rouba da nossa atenção a possibilidade de estabelecer uma relação densa com o objeto observado. Creio que a cena rural também tenha sua cortina de ruídos, com evolução seguramente menos tensa; e ainda assim desorienta. Precisamos aguçar os sentidos para ouvir o silêncio e além do ruído. As mensagens chegam do deserto, da conjunção de estrelas, dos mortos de quaisquer guerras insanas, e o silêncio ecoa questinador e urgente. Estamos alijados pela compreensão imediata do sonoro em detrimento da ausência das palavras. Às vezes choramos e todo o significado se estabelece, noutras nos calamos, eloquentes, num significado vasto e pleno.
[Leia outros Comentários de Carlos E. F. Oliveir]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Conhecimento Transdisciplinar
Laerthe Abreu Jr.
Unimep
(1996)



Estratégia de empresas 380
David Menezes Lobato
FGv
(2009)



Uma fábula
William Faulkner
Nova Fronteira
(1983)



Reflexões Sobre Temas Bíblicos
Fernando José Marques
Ordem do Graal na Terra
(2004)



Livro Sociologia Garotas de Programa Prostituição em Copacabana e Identidade Social
Maria Dulce Gspar
Jorge Zahar
(1985)



Livro Saúde O Pequeno Livro de Pilates Guia Prático que Dispensa Professor e Equipamentos
Erika Dillman
Record
(2004)



Caçada A Bomba Atômica De Hitler- A Corrida Secreta Para Impedir a Produção das Armas Nucleares dos Nazistas
Damien Lewis
Cultrix
(2017)



O Individualismo e os Intelectuais
émile Durkheim
Edusp
(2017)



Fetiche
Tara Moss
Fundamento
(2008)



Dr galton o Restaurador de Passados
Sidney fernandes
Ceac
(2016)





busca | avançada
55773 visitas/dia
2,0 milhão/mês