Os quase-livros | Wellington Machado | Digestivo Cultural

busca | avançada
55671 visitas/dia
2,1 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Festival da Linguiça de Bragança celebra mais de 110 anos de seu principal produto, em setembro
>>> Rolê Cultural do CCBB celebra o Dia do Patrimônio com visitas mediadas sobre memória e cultura
>>> Transformação, propósito, fé e inteligência emocional
>>> Festival de Inverno de Bonito(MS), de 20 a 24 de agosto, completa 24 anos de festa!
>>> Bourbon Street Fest 20 Anos, de 24 a 31 de agosto, na casa, no Parque Villa Lobos e na rua
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Chegou a hora de pensar no pós-redes sociais
>>> Two roads diverged in a yellow wood
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
Colunistas
Últimos Posts
>>> Into the Void by Dirty Women
>>> André Marsiglia explica a Magnitsky
>>> Felca sobre 'adultização'
>>> Ted Chiang sobre LLMs e veganismo
>>> Glenn Greenwald sobre as sanções em curso
>>> Waack: Moraes abandona prudência
>>> Jakurski e Stuhlberger na XP (2025)
>>> As Sete Vidas de Ozzy Osbourne
>>> 100 anos de Flannery O'Connor
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
Últimos Posts
>>> Jazz: música, política e liberdade
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Ofício da Palavra (BH)
>>> Nerd oriented news
>>> Para você estar passando adiante
>>> O fim (da era) dos jornais, por Paul Starr
>>> Macunaíma, de Mário de Andrade
>>> Anos Incríveis
>>> Risca Faca, poemas de Ademir Assunção
>>> Camuflagem para e-readers
>>> Deus Sabia de Tudo e Não Fez Nada
>>> Um Furto
Mais Recentes
>>> Os Segredos de Uma Encantadora de Bebês de Tracy Hogg pela Manole (2025)
>>> Feng Shui O Livro das Soluções - 150 Soluções Simples Para Sua Saúde e Felicidade No Lar Ou No Escritório de Nancilee Wydra pela Pensamento (1996)
>>> A Camareira de Nita Prose pela Intrínseca (2022)
>>> Desperte Seu Poder de José Roberto Marques pela Buzz (2017)
>>> Torto Arado de Itama Vieira Junior pela Todavia (2020)
>>> Americanah de Chimamanda Ngozi Adichie pela Companhia Das Letras (2014)
>>> Descubra Seus Pontos Fortes de Marcus Buckingham pela Gmt (2015)
>>> Segredos Da Mente Milionaria de T. Harv Eker pela Sextante (2006)
>>> Um Novo Mundo - O Despertar De Uma Nova Consciencia de Eckhart Tolle pela Editora Sextante (2010)
>>> Plantas Que Curam: Cheiro De Mato de Panizza Sylvio pela Ibrasa (1997)
>>> O Segundo Sexo I- Fatos e Mitos de Simone de Beauvoir pela Nova Fronteira
>>> O Segredo Dos Gnios de Renato Alves pela Fisicalbook (2010)
>>> A era das Revoluções 1789 - 1848 de Eric J. Hobsbawm pela Paz E Terra (1998)
>>> Feliz Ano Velho de Marcelo Rubens Paiva pela Brasiliense (1986)
>>> Poder Do Habito de Charles Duhigg pela Objetiva (2012)
>>> Canção No Tempo: 85 Anos De Músicas Brasileiras: 1958 - 1985 de A - Vol. 2 Canção No Tempo pela Editora 34 (2009)
>>> Minigramática de Ernani Terra, José De Nicola pela Scipione (2001)
>>> Guia de Medicina Homeopática de Dr. Nilo Cairo pela Teixeira (1981)
>>> A Crise Agrária de Alberto Passos Guimarães pela Paz e Terra (1982)
>>> Tocar: Terapia do Corpo e Psicologia Profunda de Deldon Anne Mcneely pela Cultrix (1995)
>>> Sitemas Hamiltonianos Caos e qualificação de Alfredo M Ozorio de Almeida pela Unicamp (1995)
>>> Tipos e Aspectos do Brasil de Varios pela Ibge (1970)
>>> Sem Medo de Vencer Ser de Roberto Shinyashiki pela Gente (1993)
>>> Minha Primeira Biblia de Reginaldo Manzotti pela Petra (2012)
>>> A Loira do Banheiro e Outras Histórias de Unknown Author pela Atica (2010)
COLUNAS

Terça-feira, 13/7/2010
Os quase-livros
Wellington Machado
+ de 4600 Acessos


LIANA TIMM© (http://timm.art.br/)

Nunca mais ouvi falar do tal escritor. Mas já se passaram alguns anos que eu, na sala de espera da dra. Cristiane, dentista, li em uma revista cuja capa fora extraída, uma matéria sobre a descoberta de vários manuscritos de um escritor húngaro chamado Kovács. Não consegui decorar seu sobrenome e não me perdoo até hoje por não ter anotado em algum papel. Kovács teria morrido no ano de 1919.

Foram descobertos em um baú antigo ― daqueles empoeirados que se vê em filmes como O Nome da Rosa ―, nos porões de uma mansão, vários cadernos manuscritos que, à primeira vista, comporiam cinco ou seis romances. Diante da descoberta, a Biblioteca Pública de Budapeste se comprometeu a financiar a contratação de professores de literatura e vários outros especialistas para analisar os manuscritos.

Não tive notícia mais sobre o destino dos trabalhos, e muito menos das obras. Mas um detalhe me chamou a atenção. Um respeitado professor de literatura que teve um primeiro contato com os manuscritos declarou que Kovács se tratava de um escritor excepcional, cuja obra rivalizaria ― quiçá superaria ― com a de Franz Kafka. Segundo o especialista, o conteúdo daqueles originais, se descobertos e publicados nos anos 20, mudaria o rumo de toda a literatura ocidental.

Há exemplos de livros que quase tiveram o mesmo destino, ou seja, quase não existiram (ou só existiram) por obra de terceiros. O exemplo clássico é o de Max Brod, amigo de Kafka, que teria cometido uma "boa desobediência" (para os amantes da literatura) ao não destruir os manuscritos, de anotações ou até de livros prontos, que o escritor julgava de qualidade duvidosa.

Lembro de ter lido em algum lugar que o escritor João Ubaldo Ribeiro, depois de um esforço hercúleo, escrevendo à máquina (em papel ofício e cópia carbono) o calhamaço Viva o Povo Brasileiro, teria rejeitado(!) o livro. Num ato de repulsa ou de perfeccionismo, o escritor jogou as mais de mil páginas datilografadas em uma caixa e deixou-a abandonada em um canto da casa, sujeita a infiltrações e traças. O romance teria sido arrancado à força de suas mãos ― literalmente roubado ― pelo editor, que o publicou.

Mais recentemente, vimos a quase "não existência" do livro de Nabokov, O Original de Laura. Escrito a lápis em fichas catalográficas quando o escritor estava internado para se tratar de uma infecção na Suíça, o romance quase não existiu por duas vezes. Na primeira, Nabokov teria orientado a sua esposa a destruir as fichas. Após a morte desta, ficou nas mãos do filho Dmitri a publicação (ou a destruição) dos manuscritos. Decadente, necessitando de dinheiro para pagar despesas com a saúde debilitada, o filho mandou para o prelo as fichinhas.

O livro 2666, do chileno Roberto Bolaño, teve situação diferente. Houve também, como no caso do João Ubaldo, desobediência por parte do editor. Bolaño, que sabia que morreria por problemas hepáticos, determinou que o 2666 fosse publicado em cinco partes distintas, em volumes separados, a fim de sustentar a família por um bom tempo. O editor ignorou a vontade do autor e mandou um tijolo para as livrarias.

Há casos também de futura inexistência de livros. Mistérios que atiçam desejos de leitores e do famélico marketing das editoras. É o caso do escritor J.D. Salinger, autor do livro O apanhador no campo de centeio. Há especulações de todo gênero; uma das quais a de que o escritor teria deixado, no cofre de sua casa, algumas obras prontinhas para serem publicadas aos poucos, garantido a grana para até a quinta geração dos Salinger. Mas o mistério persiste. Sabe-se que o escritor teria, ou pelo menos dava sinais de ter, assim como Raduan Nassar, abandonado a literatura de vez para viver os afazeres de um dia simples. E se, ao abrirem o cofre de Salinger, um vazio escuro e melancólico ecoar lá de dentro?

Obras e, por consequência, escritores podem não ter existido por inúmeros motivos. Um empregado de alguma casa que tenha jogado no lixo, por engano, caixas e mais caixas de manuscritos. Um amigo que, ao contrário de Max Brod, tenha realmente acatado a ordem do escritor e inutilizado sua obra. Esposas ou maridos em crise conjugal que, num rompante momentâneo, queimaram cadernos do parceiro. Editores que simplesmente rejeitaram obras-primas.

Sabemos e temos acesso apenas ao que existe, óbvio. Dante, Cervantes, Balzac, Kafka, Dostoiévski, Proust, Flaubert existiram porque se "salvaram" desses "destruidores", além do inegável talento, claro. Mas se eles não tivessem sido descobertos? O destino da literatura moderna, por exemplo, tão influenciada por Kafka, seria o mesmo? Quantos escritores não "aconteceram", por inúmeros motivos, mas existiram de fato e escreveram obras importantes que não chegaram até nós?

A dra. Cristiane nunca fez reparo em meus dentes. Tenho ojeriza a revistas sem capa e ensebadas. Detesto sala de espera. A possibilidade de se encontrar uma revista que aborde literatura ― e húngara!? ― nesse ambiente é remotíssima. Vários escritores como o Kovács, que é uma ficção, poderiam ter existido e, quem sabe, mudariam os rumos da literatura e da sociedade ― para melhor ou pior ― se tivessem sido publicados.

Seria como se, guardadas as devidas proporções, a humanidade não tivesse moldado a razão como ela é (segundo a linha evolutiva dos pré-socráticos, Sócrates, Platão, Aristóteles etc.), mas seguido um outro caminho que não o da racionalidade como a conhecemos e praticamos. Literariamente, somos o que somos devido ao que descobrimos, voluntária ou involuntariamente. Tornamo-nos uma possibilidade entre várias. Poderíamos ter sido bem melhores ou bem piores, de acordo com aquilo que sepultamos.


Wellington Machado
Belo Horizonte, 13/7/2010

Quem leu este, também leu esse(s):
01. House e o retorno dos fãs de Carla Ceres
02. Amazon 451 de Diego Viana
03. Recordações de Sucupira de Luis Eduardo Matta
04. O Oscar e a reencarnação de Marcelo Miranda
05. adoravelmente imbecil de Fabio Danesi Rossi


Mais Wellington Machado
Mais Acessadas de Wellington Machado em 2010
01. A ilusão da alma, de Eduardo Giannetti - 31/8/2010
02. Enquanto agonizo, de William Faulkner - 18/1/2010
03. Meu cinema em 2010 ― 1/2 - 28/12/2010
04. A sombra de Saramago - 3/8/2010
05. Guimarães Rosa em Buenos Aires - 28/9/2010


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Recruta Zero - os Anos Dourados
Mort Walker
Kalaco
(2011)



Caminhos de Evangelização
José Antonio Pagola
Vozes
(2020)



Ética
Newton Bignotto e Outros
Companhia das Letras
(1992)



Estratégia de Empresas
David Menezes Lobato
Fgv
(2009)



O Encontro
John Updike
Portugalia
(1980)



A Biblioteca de C. S. Lewis
James Stuart Bell / Anthony P. Dawson
Mundo Cristão
(2006)



Atlas de Neurologia Clinica
J. D. Spillane
Labor



Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção Vol. I
Ministério do Meio Ambiente
Biodiversidade 19
(2008)



Leis do inquilinato comentadas 4ª edição
Antônio josé de souza levenhagem
Atlas
(1978)



Como Saí do buraco
Fly
Inspira
(2013)
+ frete grátis





busca | avançada
55671 visitas/dia
2,1 milhões/mês