Rotina, por que não? | Ana Elisa Ribeiro | Digestivo Cultural

busca | avançada
85620 visitas/dia
2,0 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Yassir Chediak no Sesc Carmo
>>> O CIEE lança a página Minha história com o CIEE
>>> Abertura da 9ª Semana Senac de Leitura reúne rapper Rashid e escritora Esmeralda Ortiz
>>> FILME 'CAMÉLIAS' NO SARAU NA QUEBRADA EM SANTO ANDRÉ
>>> Inscrições | 3ª edição do Festival Vórtice
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
>>> Xingando semáforos inocentes
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
>>> Esporte de risco
>>> Tito Leite atravessa o deserto com poesia
>>> Sim, Thomas Bernhard
Colunistas
Últimos Posts
>>> Glenn Greenwald sobre a censura no Brasil de hoje
>>> Fernando Schüler sobre o crime de opinião
>>> Folha:'Censura promovida por Moraes tem de acabar'
>>> Pondé sobre o crime de opinião no Brasil de hoje
>>> Uma nova forma de Macarthismo?
>>> Metallica homenageando Elton John
>>> Fernando Schüler sobre a liberdade de expressão
>>> Confissões de uma jovem leitora
>>> Ray Kurzweil sobre a singularidade (2024)
>>> O robô da Figure e da OpenAI
Últimos Posts
>>> AUSÊNCIA
>>> Mestres do ar, a esperança nos céus da II Guerra
>>> O Mal necessário
>>> Guerra. Estupidez e desvario.
>>> Calourada
>>> Apagão
>>> Napoleão, de Ridley de Scott: nem todo poder basta
>>> Sem noção
>>> Ícaro e Satã
>>> Ser ou parecer
Blogueiros
Mais Recentes
>>> E-mails a um jovem resenhista
>>> O Conflito do Oriente Médio
>>> García Márquez 1982
>>> Sex and the City, o filme
>>> Evangelización
>>> 2007 enfim começou
>>> Depeche Mode 101 (1988)
>>> Borges: uma vida, por Edwin Williamson
>>> Why are the movies so bad?
>>> Histórias de gatos
Mais Recentes
>>> Manual Prático De Levitação de Elias Jose pela Gryphus (2005)
>>> Livro Temas Sobre Lazer de Heloisa Turini Bruhns (0rg.) pela Autores Associados (2000)
>>> Fé E Emoções de Ney Bailey pela Candeia (1986)
>>> Um Diario Imperial de Gloria Kaiser pela Reler (2005)
>>> Outlander - Os Tambores do Outono de Diana Gabaldon pela Arqueiro (2016)
>>> Escritos e Biografias de São Francisco de Assis de São Francisco de Assis pela Vozes (1988)
>>> Avivamento Total: O Cristão Como Verdadeiro Modelo Para A Sociedade Da Qual Faz Parte de Caio Fábio pela Vinde (1995)
>>> Profecias Morenas de Jorge De Souza Araujo pela Uesc (2014)
>>> A Moura Torta 603 de Roseane Pamplona pela Folha de S. Paulo (2022)
>>> Um Chamado Divino de Unknown pela Fisicalbook
>>> Gramática Latina de Napoleão Mendes de Almeida pela Saraiva (1990)
>>> Viagem A Portugal de Jose Saramago pela Companhia Das Letras (1997)
>>> Livro Itaipu. Integração Em Concreto Ou Uma Pedra No Caminho de Pinto pela Amarilys (2009)
>>> Mateus: O Menino Que Falava Com Deus de Daniella Priolli e Carvalho pela Léon Denis (2005)
>>> Um Chamado Divino de Unknown pela Fisicalbook
>>> Cidade e Urbanismo - História, Teorias e Práticas de Nino Padilha pela Faufba (1998)
>>> Broquéis E Faróis de João da Cruz e Sousa; organizado por Carlos Henrique Schroeder pela Avenida (2007)
>>> Livro SAE -Sistematização da Assitência de Enfermagem -PLT 130 de Meire C. Tannure - Ana Maria Pinheiro pela Gen - Guanabara
>>> Páginas De Luz de Denise Lopes Menezes pela São Cristóvão (2003)
>>> Páginas De Luz de Denise Lopes Menezes pela São Cristóvão (2003)
>>> Teologia Do Antigo Testamento de Eugene H. Merrill pela Shedd (2009)
>>> Livro Lettre À Ménécée de Pénisson, Pierre Epicure pela Hatier (1999)
>>> Comentário Bíblico De Matthew Henry de Matthew Henry pela Cpad (2006)
>>> Convite de Roque Jacintho pela Luz no Lar (1991)
>>> Pensar Com Tipos de Ellen Lupton pela Cosac & Naify (2013)
COLUNAS

Sexta-feira, 15/7/2011
Rotina, por que não?
Ana Elisa Ribeiro
+ de 5600 Acessos
+ 1 Comentário(s)

Um perigo grande repetir ideias e discursos que vêm de algum lugar muito genérico. Não sabemos de onde partem, por que existem, mas é certo que estão cheios de pequenas malícias. Por que não pensar nas coisas antes? Pensar antes de dizer? Pensar antes de propagar qualquer porcaria, invencionice meio pública?

Por diversas razões, eu me peguei pensando muito na rotina. Talvez porque ela seja reconfortante, além de repetitiva. Ou porque ela seja inexorável, ao longo da vida, e porque não se pode fugir dela, em alguma medida. Talvez porque haja uma música do Chico Buarque na minha cabeça, incessante, pregnante. Aquela canção que diz que "todo dia ela faz tudo sempre igual/me sacode às seis horas da manhã/me sorri um sorriso pontual/e me beija com a boca de hortelã". A música, intitulada "Cotidiano", não me parece menos do que a narrativa das delícias de uma rotina de cuidados e paixão. Há quem a leia com tristeza; há quem, como eu, não se furte aos prazeres de certa rotina e da intimidade, fundamental num mundo de efemeridades e fast-food (valendo para o sexo).

Que mal há na rotina? Qual é o tamanho do medo que se tem dela? Por que razão, em certas declarações, a rotina surge sob uma aura negativa? Onde é que não há rotina nesta vida? O que será tão flexível que possa oferecer uma experiência nova por minuto? E por que razão alguém passaria pela vida fugindo dos protocolos?

Que alguém me acordasse às nove da manhã (às seis é demais para mim, confesso) e, carinhosamente, me chamasse para o café com um beijo sabor menta; que alguém tivesse o cuidado de me esperar sair de carro pelo portão, nestes tempos de assaltos a mão armada na porta de casa; que alguém me jurasse amor à meia noite, todos os dias (ou quase todos); que alguém viesse me contar das tempestades e das bonanças do dia, da semana, do mês, do ano; que alguém pudesse ser alguém ao meu lado. Isso não pode ser totalmente ruim.

Essa rotina do toque, do acerto, dos horários, das responsabilidades e da companhia (verdadeira) me lembra também uma canção de Frejat, Guto Goffi e Mauro Santa Cecília, "Por você", que também me parece uma declaração desbragada de amor, especialmente quando se declara que alguém "desejaria todo dia a mesma mulher". Missão impossível, neste mundo de inoperâncias do compromisso e do engajamento afetivo. Missão impossível, neste mundo das vitrines onde se expõem moças que nunca seremos nós. Isso não pode ser rotina ruim: desejar todo dia a mesma pessoa, porque, por definição, desejar não passa por sentir-se obrigado, mal-aventurado, infeliz, forçado. Desejar é propulsão. Desejo move. Desejo altera. Desejo promove. Desejo impulsiona. Desejo faz mirar adiante. E isso não pode ser má rotina.

Os pés frios embaixo do edredon, a pipoca com filme, a chuva lá fora e o banho quente aqui dentro, as roupas trocadas no armário, o colorido do varal a dois, os pratos sujos na pia, os copos com manchas de vinho barato (ou as gordas taças caras), os chinelos embaixo da cama, os respingos fora da pia ou do vaso sanitário. Nada disso escapa à descrição de uma rotina, que, no entanto, não precisa ser vivida como se fora condenação. Não é. Não deveria ser. Deveria ser desejo, carinho e cuidado. Deveria ser repetida não à maneira do castigo de Sísifo, mas à moda das compulsões de desejo, à toda, com gosto, o famoso "gosto de quero mais".

Rotina desgasta. Rotina enjoa. Rotina enoja. Rotina caleja. Rotina esgota. Rotina faz perder a noção do gosto. Essa é a rotina cárcere, alienada, alienante. Essa ninguém quer, de fato, mas mesmo ela pode viciar. Perdida, pode trazer lembranças que só se tornam saudade quando se avalia o prazer que poderia estar ali, embrulhado nos dias de tédio e nas noites de sonhar com outras rotinas. São todos rotinas. Não há quem viva sem elas, mesmo quando se adere a uma vida de descompromisso e pequenas febres. É preciso ter competência e fôlego longo para as rotinas. É preciso saber amar. É preciso amadurecer.

É na rotina que acontece o contraste com o inesperado. É na rotina que os gostos e os desgostos emergem. É na rotina que as pessoas se conhecem. Quem é alguém sem saber sua própria rotina? Estou para dizer que meu dia a dia verte horários, medos, desapegos, pequenos estilhaços e uma coleção de relógios de pulso. Em minha rotina cabem pessoas, comida, carro, segredos, anseios, trajetos, cumprimentos, tarefas, arremedos, quases e medidas exatas. Minha rotina me dá a medida do meu conforto, mas também do meu incômodo. Se algo escapa à minha rotina, eu me mordo. E se algo escapa também pode ser que eu experimente e goste. E pode ser que isso se torne parte da minha rotina, dali em diante. Ou que se transforme em um acidente, memória ruim, lembrança escura. Mas é na minha rotina que sei de mim e dos outros. É nela que seleciono o que sai e o que fica. Sem ela não sei para onde me movo porque não tenho referencial. Se não conheço as reações das partes do seu corpo, sua rotina, seu protocolo de afetos e calores, eu não sei o que fazer com você, quando está comigo. E por que não convidá-lo para minha rotina? Troquemos o hálito de hortelã pelo Halls cereja e estaremos combinados.


Ana Elisa Ribeiro
Belo Horizonte, 15/7/2011

Mais Ana Elisa Ribeiro
Mais Acessadas de Ana Elisa Ribeiro em 2011
01. É possível conquistar alguém pela escrita? - 21/1/2011
02. Meus livros, meus tablets e eu - 15/4/2011
03. Você viveria sua vida de novo? - 18/2/2011
04. À primeira estrela que eu vejo - 7/10/2011
05. Bibliotecas públicas, escolares e particulares - 20/5/2011


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
18/7/2011
12h07min
Mulher apaixonada está sempre em dúvida de querer mudar e ficar no mesmo. Não sabe se a primeira escolha da paixão é a melhor, mas quando parte para a segunda, fica com medo e retorna. E assim, também, é rotina (em espaços de tempos maiores). Tudo é rotina. Até escrever sobre ela. Mas que é ótima relembrar a rotina dos bons momentos, não resta dúvida. Salve a rotina. Parabéns, "Aninha". Viu só, uma novidade. Quanta intimidade?! Beijão estalado, quente, carinhoso e de muitos afagos!
[Leia outros Comentários de Cilas Medi]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Bibliothérapie
Marc-Alain Ouaknin
Seuil
(1994)



As Suas Lembranças São Minhas
Cecelia Ahern
Rocco
(2010)



Lugares da Psicologia
Berenice Carpigiani
Vetor
(2008)



O feijão e o sonho
Orígenes Lessa
Abril Cultural
(1980)



O Colecionador de Memórias
Cecelia Ahern
Novo Conceito
(2018)



Coleção Manual da Recreio Língua Portuguesa 2 Livros
Abril
Abril



Com Jesus na Contramão
Frei Carlos Mesters
Paulinas
(2013)



Lautréamont Ceuvres Complètes - Les Chants de Maldoror - Poésies
Garnier Flammarion
ThriftBooks
(1969)



Tecla e a Princesa
Núria Hervada
Sm



Geração Alpha. História - 8º Ano
Ana Lucia Lana Nemi; e Outros
Sm
(2017)





busca | avançada
85620 visitas/dia
2,0 milhão/mês