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Terça-feira, 26/11/2013
Obscura paisagem em peça de Mirisola e Oliveira
Jardel Dias Cavalcanti
+ de 4900 Acessos

A natureza do desejo não é composta de uma paisagem tranquila. Ela pode ser tanto trágica como cômica. Por vezes, uma sopa caudalosa e obscura dos dois elementos juntos. Mais ainda, é um circuito duplo que parece existir para se retroalimentar. Na ordem do desejo, será que os dois elementos existiram em algum momento separadamente? Parece que não. Esse é o caráter da peça Paisagem em Campos do Jordão, de Marcelo Mirisola e Nilo Oliveira, editada em formato digital pela E-Galáxia.

Contendo apenas dois atos, a peça coloca em cena quatro personagens. Dois amigos, Leo e Guga; Bia, a esposa de Leo; e sua filha, a menina Lili. O texto se abre com os dois amigos tomando uísque e ouvindo o cantor brega Elymar Santos. Em seguida, uma revelação feita por Leo ao amigo Guga. É a partir desta revelação que se desdobrarão todos os outros fatos da peça. O segundo ato é a consequência que o fato revelado tem na vida do casal Leo e Bia.

A conversa entre os dois amigos é hilária, primeiro pela sinceridade de Leo em revelar algo "inusitado" para Guga; depois trágica, pelo conteúdo e pelos desdobramentos que tal fato causou na vida de Leo. O que casa os dois elementos é a forma com que os autores descrevem a situação. A pista para se entender o "clima" da situação é a abertura com música (qualquer que seja) de Elymar Santos. Música do amor safado. É o sinal visível de que entramos em campo suspeito.

O título da peça, no mínimo irônico, serve para nos enganar a respeito do que nos espera. Ao contrário da paisagem de Campos do Jordão, que remete a uma vida bucólica, área de descanso de uma burguesia tranquila no reino dos seus desejos domesticados, o que a peça propõe é justamente o contrário, uma paisagem à margem desse mundo. Lugar onde os afetos são livres, ou se permitem entrar, ou acabam entrando, no reino de sua desordem e luxúria. Mas isso só se revela lentamente, em conta-gotas, quando acompanhamos o relato dos fatos pela boca de Leo e o desfecho dado por Bia.

Não há comedimento na fala dos personagens. Eles encarnam sua própria classe, sendo personagens com um devir real de seres humanos concretos em circunstâncias concretas (Lukács tremeu no inferno agora). Clareza e concisão fazem de suas falas o lugar também do desprendimento do desejo livre, de pessoas que não precisam se conter nas suas revelações. Afinal, são amigos há uns vinte anos, que sempre partilharam experiências e o relato das mesmas, vivendo suas putarias em circunstâncias "normais", como acreditava Guga. Ou seja, como sempre participaram de centenas de putarias juntos, pressupõe-se que não só podem se abrir um com o outro como têm quase certeza de que se conheçam intimamente. Nem tanto, pois é a novidade da revelação de Leo que inscreverá um novo capítulo na história dessa intimidade. A questão que Leo se coloca, nesse sentido, é de que não sabe se o mais bizarro é ter feito algo "anormal" ou contar o que fez ao amigo. Essa bizarrice é relatada em termos extremamente cômicos, dada a defesa hilária que justificaria sua "causa".

É aí que entram as categorias insanas do desejo, seu devir marginal, sua espacialidade deslocada, mesmo para quem pensa que está tranquilo em casa (ou numa casa de campo em Campos do Jordão).

Descrente das justificativas do amigo, Guga se agarra a uma série de condenações irônicas e surpresas com a nova atividade sexual do amigo:

"GUGA: Sob o signo da Rainha do Mar, o traveco chupava seu pau... Adivinhei?".

Mas o amigo tenta provar que há uma lógica nesse "desvio" que se apresenta.

"LEO: Para pra pensar, Guga. Você passou a vida inteira com um pau na mão. O seu pau."

Mas tal assertiva é imediatamente reprovada:

"GUGA: Sim. Para meu uso exclusivo. E para a felicidade das mulheres".

Dessas conversas que vão a cada momento se tornando mais hilárias, o que se torna claro é a propensão do desejo a tirar o chão dos personagens. O fato inusitado é a presença da menina Lili, que serve na peça para ser a mediadora e reveladora do beco sujo do desejo. Ao mesmo tempo que é quem revela para Bia, através da arte (um desenho escolar), o lugar impróprio onde Leo mergulhou, é também que acaba por desvelar aquilo que deveria ser secreto, mascarado, tornando a situação de crise o lugar apropriado para que se revele o verdadeiro segredo do desejo dos dois adultos. O rei está nu. A angústia, segundo Kierkegaard, é a vertigem da liberdade.

Desencadeada a crise, as revelações insuportáveis vêm à luz do dia e se tornam, agora, a límpida clareza do que cada um é, o que escondeu de si e do outro. E, principalmente, o que desejam um do outro. A escolha certa foi feita: descobrem-se verdadeiramente amantes.

O desejo oculto estava guardado no quarto do casal, desejo este que se revela apenas na crise das estruturas estabelecidas. Não seria essa peça uma alegoria da arte? Lugar onde o desejo pode viver às claras, fazer-se ouvir, liberar quem com ela toma contato? O desenho feito por Lili, afinal, foi quem desencadeou a revelação.

Nota do Autor:
Optou-se aqui por não se revelar o conteúdo total da peça para não se tirar o prazer do leitor de ser levado, aos sustos e rindo, para dentro de uma paisagem bastante distante da de Campos do Jordão.


Jardel Dias Cavalcanti
Londrina, 26/11/2013

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