Cinquenta tons de cinza no mundo real | Jardel Dias Cavalcanti | Digestivo Cultural

busca | avançada
43087 visitas/dia
1,2 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Festival de Teatro de Curitiba para Joinville
>>> TIETÊ PLAZA INAUGURA A CACAU SHOW SUPER STORE
>>> A importância da água é tema de peças e oficinas infantis gratuitas em Vinhedo (SP)
>>> BuZum! encena “Perigo Invisível” em SP e público aprende a combater vilões com higiene
>>> Exposição de arte Dispositivos
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> O batom na cueca do Jair
>>> O engenho de Eleazar Carrias: entrevista
>>> As fitas cassete do falecido tio Nelson
>>> Casa de bonecas, de Ibsen
>>> Modernismo e além
>>> Pelé (1940-2022)
>>> Obra traz autores do século XIX como personagens
>>> As turbulentas memórias de Mark Lanegan
>>> Gatos mudos, dorminhocos ou bisbilhoteiros
>>> Guignard, retratos de Elias Layon
Colunistas
Últimos Posts
>>> Uma aula sobre MercadoLivre (2023)
>>> Lula de óculos ou Lula sem óculos?
>>> Uma história do Elo7
>>> Um convite a Xavier Zubiri
>>> Agnaldo Farias sobre Millôr Fernandes
>>> Marcelo Tripoli no TalksbyLeo
>>> Ivan Sant'Anna, o irmão de Sérgio Sant'Anna
>>> A Pathétique de Beethoven por Daniel Barenboim
>>> A história de Roberto Lee e da Avenue
>>> Canções Cruas, por Jacque Falcheti
Últimos Posts
>>> Nem o ontem, nem o amanhã, viva o hoje
>>> Igualdade
>>> A baleia, entre o fim e a redenção
>>> Humanidade do campo a cidade
>>> O Semáforo
>>> Esquartejar sem matar
>>> Assim criamos os nossos dois filhos
>>> Compreender para entender
>>> O que há de errado
>>> A moça do cachorro da casa ao lado
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Deus Sabia de Tudo e Não Fez Nada
>>> Querem acabar com as livrarias
>>> As máximas de Chamfort
>>> Impressões sobre São Paulo
>>> Menos Guerra, Mais Sexo
>>> A esquerda nunca foi popular no Brasil
>>> A Teoria de Tudo
>>> Anna Karenina, Kariênina ou a do trem
>>> A LIRA de Ricardo Aleixo
>>> Eitonilda rumo aos 100K
Mais Recentes
>>> A bruxa Salomé de Audrey Wood pela Ática (1999)
>>> Conversando com Deus de Joseph Murphy pela Record (1962)
>>> Resistência dos Materiais: Para Entender e Gostar de Manoel Henrique Campos Botelho pela Blucher (2013)
>>> Duelo de Gigantes: Veja grandes batalhas entre os dinos! de Jinny Johnson e Monica Alves pela Girassol (2015)
>>> Tipos de mentes - Rumo a uma compreensão da consciência de Daniel C. Dennett pela Rocco (1997)
>>> Las Místicas Orientais de Daniel Odier Marc De Smedt pela Martínez Roca (1975)
>>> Estruturas de Aço: Dimensionamento Prático de Acordo com a NBR 8800:2008 de Walter Pfeil; Michèle Pfeil pela Ltc (2014)
>>> Tripla Espionagem (como novo) de Ken Follett pela Arqueiro (2019)
>>> Encontro dinossauros incríveis e muito mais! de Vários autores pela Ciranda Cultural
>>> Tratado descritivo do Brasil em 1587 de Gabriel Soares de Sousa pela Companhia nacional (1987)
>>> Estruturas de Aço, Concreto e Madeira: Atendimento da Expectativa Dimensional de Yopanan C. P. Rebello pela Zigurate (2005)
>>> O parque das irmãs magníficas (como novo) de Camila Sosa Villada pela Tusquets (2022)
>>> O Calendário da Sabedoria de Winifred A. Parley pela Pensamento
>>> As cartas de Ronroroso: Minha bruxa que não quer ser bruxa de Hiawyn Oram e Sarah Warburton pela Salamandra
>>> Kundalini o Fogo Sagrado Da Serpente de Rosane Mary Zacharias pela Popular (1984)
>>> Noite sobre as águas (Muito Bom) de Ken Follett pela Arqueiro (2016)
>>> Sonhos de Avalon: A última profecia de Bianca Briones pela Bertrand Brasil
>>> Fundações Diretas: Projeto Geotécnico de José Carlos A. Cintra; Nelson Aoki; José Henrique Albiero pela Oficina De Textos (2014)
>>> Presente a Dádiva que Abençoa a Quem o Dá de R. R. Soares pela Graça (2000)
>>> Biblía Sagrada- Nova versão internacional de Nvi pela Thomas Nelson
>>> Fundações por Estacas: Projeto Geotécnico de José Carlos A. Cintra; Nelson Aoki pela Oficina De Textos (2014)
>>> O homem que foi quinta-feira (um pesadelo) de G. K. Chesterton pela Círculo do livro (1974)
>>> A Garota de Boston (como novo) de Anita Diamant pela NVersos (2016)
>>> Sala de aula que espaço é esse? de Org. Regis de Morais pela Papirus (1988)
>>> Ismael de Daniel Quinn pela Círculo do livro (1992)
COLUNAS

Terça-feira, 3/9/2013
Cinquenta tons de cinza no mundo real
Jardel Dias Cavalcanti
+ de 11100 Acessos

"O que a ética e a moral condenam, arte pode transformar em prazer."

Os efeitos da leitura do livro Cinquenta tons de cinza, de E L James, começam a aparecer na prática sexual das leitoras. As mulheres com quem me encontrei ultimamente exigem "apanhar", "serem punidas". As frases que ouço são mais ou menos as mesmas: "Quero sair com a bunda ardendo", "quero ser estapeada", "quero levar muita chinelada", "quero minha vagina ardendo de tanto apanhar", "quero ser amarrada e apanhar", "quero ser punida por ser uma menina má" etc.

São frases que também se pode encontrar pelas páginas de Cinquenta tons de cinza e que agora ganham as ruas. Começa-se a se construir um teatro de experiências nas relações sexuais no qual a dor, a punição, a violência sobre o corpo feminino se transformam num fetiche das próprias mulheres.

E os homens, reeducados na lei Maria da Penha para tratarem com delicadeza as mulheres, se veem na obrigação de liberarem seus instintos agressivos sobre as mesmas. E algeme-se as mulheres para lhe dar palmadas na bunda, no rosto, na vagina e onde mais for exigido pelo sexo feminino.

É claro que, como entre os personagens masculino e feminino do livro, nestas relações reais também se estabelece um "contrato" em que os limites são dados pelos participantes. As práticas expandem a experiência para algo diferente, ousado, mas sem levar o casal para experiências extremas.

Claro que se você for delicado demais, as mulheres vão chiar dizendo: "mais força, quero sair com a bunda ardendo". Você terá que calcular o grau de suportabilidade da dor da parceira, manejando com eficiência o chinelo ou a palma da mão. Ela vai gritar, mas você vai ter que adivinhar se é um grito de dor/prazer com o que ela, apesar de sofrer, estará dentro dos limites do que quer sofrer de dor/prazer. Não há uma medição clara para o que é suportável, porque por vezes é o insuportável que gerará o prazer.

Nesse tipo de relação você também deve estar atento aos limites da violência para que não haja comprometimento real da vida da pessoa. Portanto, há um grau de repressão dos instintos (violentos) em jogo também.

A fantasia liberada pelo livro é real. Como no romance Werther, de Goethe, que gerou uma onda de suicídios, o romance Cinquenta tons de cinza está gerando uma onda de meninas/mulheres dispostas a experimentar os prazeres da dor, da submissão. Imagine-se a quantidade de jovens leitoras que esse livro teve. Imagine-se os pensamentos que passaram pela cabeça e pelos corpos dessas leitoras de três volumaços cheios da boa e velha sacanagem. Querendo ou não, a literatura forma as almas e os corpos. Ela é perigosa por isso. Como ela pode ser libertadora, também, por isso.

Leitoras do livro são também as mulheres maduras. Aquelas que descobrem de repente que a relação com seus parceiros tem sido apenas burocrática, sem graça, e que relação sexual mesmo, aventureira, quente, radiante, é aquela apresentada pelos personagens Grey e Steele. Começa-se a exigir do parceiro uma mão mais forte, mais agressiva, acompanhada de aparelhos ("brinquedos") que lhes darão um pedaço do paraíso. Ou procura-se novos parceiros, dispostos a colocar a mulher no papel da personagem do livro.

Aquilo que antes era apenas um instrumento para apimentar a relação, um tapinha aqui e outro acolá, se torna agora o centro da relação. Busca-se o prazer na dor, mulheres querendo ser levadas ao orgasmo através de pequenas torturas, produzidas por tapas ou através do uso de determinados aparatos eróticos (algemas, chicotes, etc).

O livro Cinquenta tons de cinza é uma espécie de conto de fada erótico. A história é mais ou menos assim: menininha de classe inferior (estudante), desprotegida, virgem, que encontra seu príncipe encantado, necessariamente rico, forte e bonito, que lhe dá presentes (carros e celulares caríssimos) e em troca exige submissão sexual. Mas, também lhe proporciona uma educação para o prazer, que lhe garante uma onda de orgasmos inacreditáveis. Na primeira relação, por exemplo, na qual perdeu a virgindade, Steele já teve três orgasmos. E pensar que existem muitas mulheres que passam a vida toda sem nem saber o que é isso!

Para os homens, as pistas são claras. Se ganhar um chinelo de presente da parceira, sabe que deverá usá-lo nas nádegas da mesma. Se ganhar uma caixa com algemas, chicote, cordas, sabe que a relação vai ser de dominador e dominada.

Como no ideal do Marques de Sade, começa-se a construir uma relação cartesiana das práticas que geram prazer. Há um método a priori que agora governa o interesse dos encontros sexuais. Sabe-se que o mínimo que se pode fazer é bater, punir, gerar dor. É o código do prazer ensinado em Cinquenta tons de cinza e agora aprendido pelas leitoras do livro que mergulharão na dor e no prazer por ela gerado.

Considerado literatura pornográfica para donas de casa insatisfeitas sexualmente, o livro ensina às mulheres acomodadas novas formas de organizar seu prazer. Ou ao menos as leva a experimentar novas formas de luxúria, fazendo uso da dor e da submissão. Aquilo que era patrimônio de pessoas desviantes, loucas, pervertidas, se democratiza e vira método de prazer popularmente praticado por milhares de leitoras ansiosas por um paraíso semelhante ao encontrado pela senhorita Steele.

Se você ouvir no apartamento ao lado gritos de dor, sons de palmadas ou chicotadas, não se apavore e nem corra para chamar a polícia. Espere alguns minutos, pois o som do alívio pode aparecer em minutos, numa deliciosa exclamação: "Ahhhhh! Gozei!" Como a personagem Steele, sua vizinha vai "cair entorpecida, entre a realidade e a fantasia, num lugar onde não há limites rígidos nem brandos".

Não podemos deixar de dizer que apesar da aparente liberalidade dos atos sexuais descritos no livro, Cinquenta tons de cinza é uma obra de caráter conservador. Aposta na redenção final do personagem, enfim curado pela menininha, que por sua vez encontra para si seu príncipe encantado, refazendo as histórias que infantilizam o desejo feminino. A nova ordem que se configura é apenas uma paródia do desejo livre. Ela continua mulher de um homem só (segundo Simone de Beauvoir, a mulher que conheceu apenas um homem continua virgem, mesmo tendo feito sexo), treinada pelo homem experiente, que teve sua vida sexual rica antes de conhecê-la.

A causa originária da repressão feminina é a negação masculina do direito da mulher à existência individual. A autora compactua com esse machismo ao negar à mulher a honra de individualizá-la.

Para ir além:



Jardel Dias Cavalcanti
Londrina, 3/9/2013

Mais Jardel Dias Cavalcanti
Mais Acessadas de Jardel Dias Cavalcanti em 2013
01. A Última Ceia de Leonardo da Vinci - 12/2/2013
02. Mondrian: a aventura espiritual da pintura - 22/1/2013
03. Cinquenta tons de cinza no mundo real - 3/9/2013
04. Gerald Thomas: arranhando a superfície do fundo - 26/2/2013
05. O corpo-reconstrução de Fernanda Magalhães - 18/6/2013


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




De Mulheres e Sombras
Maria Telles Ribeiro
7 Letras
(2001)



Arsene Lupin Contra Herlock Sholmes
Maurice Leblanc
L&pm
(2021)



Ao Pé da Letra
Alina Perlman
Scipione
(1996)



A Piramide Iniciática
Joan Llarch
Record
(1983)



O conto brasileiro hoje - vol. XIII
Vários autores
Rg
(2010)



Grandes Personagens da Nossa História vol. 1
Victor Civita
Abril Cultural
(1969)



Elementos de Auditoria Governamental
Ana Paula Gomes
Elsevier
(2011)



Biblioteca da Matemática Moderna
Antônio Marmo de Oliveira
Lisa
(1970)



Historia Universal - 9 Volumes
H. G. Wells
Nacional
(1968)



A Mulher Que Pensava Demais - Memórias de uma Compulsiva (lacrado)
Joanne Limburg
Tinta Negra
(2013)





busca | avançada
43087 visitas/dia
1,2 milhão/mês