Saia curta, liberdade longa. | Adriane Pasa | Digestivo Cultural

busca | avançada
47694 visitas/dia
1,9 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Festival Curta Campos do Jordão abre inscrições para a décima edição
>>> De médica a paciente: a emocionante jornada de Mariana Mendes
>>> César Oiticica inaugura exposição Frente a Frente no Paço Imperial
>>> Ícone do jazz internacional, saxofonista Igor Butman se apresenta pela primeira vez no Brasil em dez
>>> Ética do Cuidado e Anticapacitismo
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
Colunistas
Últimos Posts
>>> Henrique Meirelles conta sua história (2024)
>>> Mustafa Suleyman e Reid Hoffman sobre A.I. (2024)
>>> Masayoshi Son sobre inteligência artificial
>>> David Vélez, do Nubank (2024)
>>> Jordi Savall e a Sétima de Beethoven
>>> Alfredo Soares, do G4
>>> Horowitz na Casa Branca (1978)
>>> O jovem Tallis Gomes (2014)
>>> A história do G4 Educação
>>> Mesa do Meio sobre o Primeiro Turno de 2024
Últimos Posts
>>> E-books trazem uso das IAs no teatro e na educação
>>> E-book: Inteligência Artificial nas Artes Cênicas
>>> Publicação aborda como driblar a ansiedade
>>> E-book apresenta ferramentas de IA a professores
>>> E-book: Estágios da Solidão: Um Guia Prático
>>> O jardim da maldade
>>> Cortando despesas
>>> O mais longo dos dias, 80 anos do Dia D
>>> Paes Loureiro, poesia é quando a linguagem sonha
>>> O Cachorro e a maleta
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Um conto-resenha anacrônico
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> YouTube, lá vou eu
>>> Direções da véspera II
>>> Em noite de lua azul
>>> Há algo especialmente podre...
>>> Ivan Junqueira desvendando Otto Maria Carpeaux
>>> A poesia é traduzível?
>>> Quem é (e o que faz) Julio Daio Borges
>>> Armazém de secos e molhados
Mais Recentes
>>> Piratas À Vista! de Samir Machado De Machado pela FTD (2019)
>>> Mestiça cientificidade de Gisele Martins Venancio; André Furtado pela Eduff (2020)
>>> O poder da ação de Paulo Vieira pela Gente (2015)
>>> O Conde De Monte Cristo de Alexandre Dumas pela FTD (2014)
>>> Os Cavaleiros Que Fizeram As Cantigas (estante Medieval 8) de José Antonio Souto Cabo pela Eduff (2012)
>>> Diáspora Negra E Lugares De Memória de Hebe Mattos pela Eduff (2013)
>>> Literalmente Falando de Solange Coelho Vereza pela Eduff (2007)
>>> Realidade Lacrimosa: O Melodramático No Documentário Brasileiro Contemporâneo de Mariana Baltar pela Eduff (2019)
>>> Lutas Por Educação No Brasil Recente: O Movimento Docente Da Educação Superior de Kênia Miranda pela Eduff (2017)
>>> Oficinas da memória teoria e prática de Beatriz Pinto Venancio; Maria Carmen Vilas-Bôas Hacker Alvarenga pela Eduff (2011)
>>> A Copa Do Mundo E As Cidades: Políticas, Projetos E Resistências de Vários Autores pela Eduff (2014)
>>> Prostituição Infanto-juvenil Na mídia de Leandro Feitosa Andrade pela Educ (2004)
>>> Presuncao De Inocencia: Uma Questao De Principio De Vinganca E De Principio De Justica de Monica Paraguassu Cor Silva pela Eduff (2011)
>>> Conceitos De Literatura E Cultura de Various pela Eduff (2013)
>>> Barbante, Ripas E Luta: Ocupações Organizadas De Terras Urbanas No Rio De Janeiro, 1983-1993 de Gerônimo Leitão pela Eduff (2016)
>>> Luz Através Da Janela de Lucinda Riley pela Novo Conceito (2015)
>>> Diário De Um Policial: O Submundo Do Crime Narrado Por Um Comandante Do Gate de Diógenes Lucca pela Planeta Do Brasil (2016)
>>> Deadman Amor Após a Morte - 2 volumes de Mike Baron; Kelley Jones pela Abril (1990)
>>> Educação: A Solução Está No Afeto de Gabriel Chalita pela Gente (2004)
>>> Linguagem Do Corpo 2 Beleza e Saúde de Cristina Cairo pela Mercuryo (2006)
>>> Quarteto Fantástico - Col. Os Heróis mais poderosos da Marvel 30 de John Byrne, Brian Michael Bendis pela Salvat (2016)
>>> O Bosque dos Lilases de Lauretta pela Paulinas (2000)
>>> O Filme Perdido de Cesar Gananian E Chico Franca pela Btfdreem (2023)
>>> Administração De Marketing de Philip Kotler pela Pearson (2015)
>>> A Saga Dos X-men Vol. 19 de Marc Silvestri pela Panini Brasil (2024)
COLUNAS

Segunda-feira, 23/2/2015
Saia curta, liberdade longa.
Adriane Pasa
+ de 12000 Acessos


Duas moças vendo uma vitrine em Toronto, Canadá, 1937. (Alexandra Studios)

Em maio de 2014 eu estive em Vancouver, no Canadá, passando férias. Era começo da primavera e ainda estava um pouco frio, mas o que me chamou a atenção foi o comprimento das saias e shorts de algumas moças, que andavam tranquilamente pelas ruas com suas pernas brancas de fora (quem sou eu pra falar de pernas brancas...). Comecei a prestar atenção nisso e reparei que os homens não mexiam com nenhuma mulher, por mais curta que fosse a saia. E olha que algumas chegavam a mostrar um pedacinho da bunda. As adolescentes então andavam quase peladas, mesmo no frio. Fiquei imaginando como deveria ser no verão.

Depois de uns dias, com olhar mais apurado, reparei que os homens não só não mexiam como nem sequer olhavam. Os pescoços continuavam no lugar e cada um seguia seu rumo, tranquilamente. Na verdade, lá ninguém está nem aí com o outro, acho que podem andar com uma melancia na cabeça que ninguém liga. Meu marido estava estarrecido. Ele também nunca tinha visto coisa parecida. Fiquei "cuidando" dele porque virava o pescoço em vários momentos pois as saias eram realmente curtíssimas. Eu fiquei com medo de alguma mulher se sentir invadida e chamar a polícia. Eu também olhei, mas qualquer coisa eu podia alegar que estava admirando a roupa (eu adoro moda rsrs). A gente estava mesmo perplexo com a atitude dos homens, isso chamou a nossa atenção mais que qualquer perna de fora. Pelo menos a minha.

Lá as pessoas parecem até meio assexuadas se comparadas aos brasileiros. Mas não são, obviamente. São assim porque existem leis que protegem as mulheres desde sempre. E todo mundo sabe que leis mexem com culturas e hábitos das pessoas, influenciando suas atitudes. Eu já tinha ouvido falar sobre isso, tinha visto vídeos e lido coisas em vários blogs, tenho uma grande amiga que mora em Toronto e ela também havia comentado comigo a respeito, mas uma coisa é saber e outra é ver com os próprios olhos.

Eu não tinha levado nenhuma saia curta porque estava frio pra burro, equivalente ao começo do inverno em Curitiba, cidade onde moro. Mas devia ter levado e experimentado a sensação de liberdade que é andar por aí pelas ruas sem olhares engraçadinhos, assovios, carros que andam devagar ao teu lado parecendo ter um serial killer dentro, palavras chulas e por aí vai. Curitiba é muito ruim neste aspecto. Além de aturar os caras sem noção (não é à toa que chamam essa cidade de "Rússia Brasileira"), se a gente sai de saia curta ou qualquer roupa mais justa ou decotada, tem que aguentar também os olhares reprovadores das senhorinhas conservadoras de plantão ou das esposas ciumentas. Eu costumo dizer que sair de minissaia aqui em Curitiba é como cometer um crime. Quem mora aqui e é mulher sabe do que eu estou falando. Em lugares quentes a liberdade é maior. Mas aqui, onde a gente consegue usar minissaia umas três vezes por ano e é uma cidade ultraconservadora, é um ato de coragem.

Já ouvi todo tipo de besteiras em relação a este assunto. Como por exemplo, "ah, mas que graça tem morar num lugar como o Canadá, onde não mexem com você e nem te olham?", pois eu respondo: toda a graça do planeta. Não existe nada mais sensacional para uma mulher (e para qualquer pessoa) poder ir e vir sem ser invadida, sem ter que aturar desrespeito e sem ficar com medo. Por que dá medo. As pessoas precisam entender isso. Viver num lugar onde parte da população acha que os estupros acontecem porque as mulheres "provocam" usando roupas "ousadas" é muito perigoso. Outra bobagem é quando falam "ah, mas se for um homem bonito a mulher não acha ruim...". É claro que incomoda, porque o critério não é esse. A beleza não está acima do respeito. E tudo depende do contexto. Uma coisa é andar nas ruas e ser assediada, outra é estar na balada ou em algum lugar de paquera onde existe o desejo de ser notada. É claro que se uma mulher solteira vai a um lugar para paquerar e ninguém a nota, pode ser uma frustração. Mas ela quer isso, é diferente. E pra bom entendedor, um olhar de uma mulher basta pra saber o que ela quer ou não.

Mas voltando à Vancouver, com um olhar atento, observei a atitude das mulheres em relação a este assunto, no seu comportamento corporal. É totalmente diferente do nosso. Não existe gente puxando a saia pra baixo pra disfarçar, como quem quer "corrigir" um erro, não existe subir uma escada rolante e ficar cuidando de quem está atrás, não existe aquele olhar sempre em alerta que temos que ter por aqui, pensando que um dia ou outro teremos que usar nossos golpes de Muay Thai (aliás, é uma boa ideia fazer aulas de defesa pessoal).

Enfim, é uma liberdade absurdamente deliciosa. E se alguém olha, olha discretamente e segue seu rumo, sem extrapolar nenhum limite. Eu fiquei com inveja das mulheres de lá, nesse aspecto. Pensei como seria bom se pudéssemos sair na rua com qualquer roupa que fosse, sem sermos invadidas por olhares, palavras ou até fisicamente. Óbvio que em todo lugar do mundo mulher sempre tem que se cuidar, principalmente à noite. Lá também tem estupradores e psicopatas. A diferença é que os crimes são raros e quando existem, a polícia age na hora. E a população também. Todo mundo ajuda a "caçar" o bandido, informando e espalhando os retratos falados.

Tem uma "regra" social no Canadá que é sempre manter um braço de distância da outra pessoa estranha ou colegas de trabalho. A gente anda nos ônibus e metrôs e consegue ver isso claramente. Tudo bem que lá tem bem menos gente e se fizéssemos isso no transporte público aqui teríamos que ter o triplo da frota. Mas sem comparação direta, analisando esta atitude simples, é algo muito genial. Eu, como Curitibana que sou, adorei a ideia. Não há nada mais incômodo que gente te encostando ou querendo forçar uma intimidade que não existe. Ou aqueles colegas de trabalho que cumprimentam com ~beijinho~? Qual a necessidade disso, minha gente?? É chato qualquer tipo de invasão, qualquer tipo de coisa que não pedimos ou dissemos "ok, pode fazer". Isso é uma regra da vida.

Torço muito para que um dia a gente chegue nesse patamar de respeito às mulheres e a todos os cidadãos e que as leis aqui sejam mais severas. Sei que o ser humano tem seu lado primitivo e isso nunca vai mudar, mas cada lugar pode dar uma ajudinha pra cultura evoluir. Afinal, acho que a gente está aqui nesse mundo pra isso, pra deixar de ser ogro. Também sei que roupas como a minissaia mexem muito com o imaginário masculino, o que é normal. Mas imaginação nunca foi algo proibido, além de não prejudicar ninguém. Acho que os canadenses imaginam coisas como qualquer ser humano normal, mas ninguém precisa saber o que está na mente deles, certo? Sempre que toco nesses assuntos de comparação com países de primeiro mundo, eu penso em tudo o que a gente deixaria de se preocupar e o que mudaria na vida prática do nosso cotidiano. É muita coisa que muda. É muito espaço que sobra no nosso "HD" pra pensar em coisas boas. É muita toxina de estresse que a gente deixaria de ter. É muito tempo economizado fazendo coisas bacanas, é muito lugar bonito que a gente poderia conhecer na cidade sem precisar ter um segurança por perto. É muita minissaia que poderíamos usar, a hora em que quiséssemos, de todos os tecidos, tamanhos e cores, sendo o que nós deveríamos ser desde que nascemos: livres.

A minissaia chegou no começo dos anos 60, tendo sua invenção atribuída à britânica Mary Quant, embora alguns mencionam também o francês André Courrèges. Veio como uma forma de rebeldia, de reivindicar o direito à sensualidade e questionar o que a sociedade impunha às mulheres como "decência". Depois foi adotada pelo estilista Yves Saint-Laurent e também Pierre Cardin, que usaram modelos ainda mais curtos. Combinados com sapatos de salto alto ou botas, causaram frisson. Pernas de fora pelo jeito sempre vão "causar" por aqui. Tomara que um dia a gente possa sapatear de minissaia na cara dessa sociedade. Sem sofrer assédio, claro.

" type="application/x-shockwave-flash" wmode="transparent" width="400" height="288">



Adriane Pasa
Curitiba, 23/2/2015

Mais Adriane Pasa
Mais Acessadas de Adriane Pasa
01. YouTube, lá vou eu - 5/9/2016
02. Casamento atrás da porta - 3/2/2014
03. Carta aberta a quem leu Uma Carta Aberta ao Brasil - 15/2/2016
04. Quando morre uma paixão - 22/9/2014
05. Saia curta, liberdade longa. - 23/2/2015


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Bem-vindo À Vida Real
Christian McKay Heidicker
Intrínseca
(2017)



A História do Trabalho no Porto do Rio
Pedro Tinoco
Id Cultural
(2019)
+ frete grátis



Artemisa El Espiritu Indomito de Cada Mujer
Jean Shinoda Bolen
Kairos
(2014)



Do Princípio do Mundo ao Fim do Câncer
Luiz Gonzaga Salgado, Caio Alves de Toledo
Rolengraf
(1976)



Qu'Est-Ce Que la Sémiologie?
Bernard Toussaint
Privat
(1978)



Rio das Flores
Miguel Sousa Tavares
Oficina do Livro
(2007)



Vida e Natureza - Tratamentos e Dietas Naturais 10ª Ed.
Desconhecido
Loyola
(2010)



A Vida Feliz 548
Sêneca
Escala
(2009)



S. Bernardo
Graciliano Ramos
Record
(2008)



Livro Literatura Estrangeira A Herdeira do Silêncio
Jenny Rugeroni
Livre Expressão
(2011)





busca | avançada
47694 visitas/dia
1,9 milhão/mês