Bataille, o escritor do exagero | Daniel Lopes | Digestivo Cultural

busca | avançada
42527 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> ZÉLIO. Imagens e figuras imaginadas
>>> Galeria Provisória de Anderson Thives, chega ao Via Parque, na Barra da Tijuca
>>> Farol Santander convida o público a uma jornada sensorial pela natureza na mostra Floresta Utópica
>>> Projeto social busca apoio para manter acesso gratuito ao cinema nacional em regiões rurais de Minas
>>> Reinvenção após os 50 anos: nova obra de Ana Paula Couto explora maturidade feminina
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
Colunistas
Últimos Posts
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Google Fontes
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Ler, investir, gestar
>>> Caixa Dois, sem eufemismos
>>> Fé e razão
>>> all type
>>> Um cara legal
>>> Histórias de agosto
>>> O mal no pensamento moderno
>>> Yarny e My Writing Spot
Mais Recentes
>>> Brincando Com Móbiles de Thereza Chemello pela Global (1999)
>>> O Informante - Cinemateca Veja de Abril Coleções pela Abril (2008)
>>> Doncovim? - a História de uma Semente de Gente de Andre J. Gomes pela Volta e Meia (2015)
>>> Do Tamanho Certinho de Claudio Cuellar pela Paulinas (2005)
>>> O Temor Do Sábio de Patrick Rothfuss pela Arqueiro (2011)
>>> Brincando Com Colagens, Recortes e Dobraduras de Rosangela Paiva do Nascimento pela Global (1985)
>>> Bis (autografado) de Ricardo da Cunha Lima; Luiz Maia pela Cia das Letrinhas (2010)
>>> Lewis the Duck - Goes to Mexico de Bill Duncan; Christian Ducan pela Hilton (2010)
>>> Rex, o Cachorro Que Tinha Medo de Trovoada de Jorge Calife, Vinicius Vogel pela Record (2004)
>>> Os Legados De Lorien: Livro 4 - A Queda Dos Cinco de Pittacus Lore pela Intrínseca (2013)
>>> Brincar Com Arte - Argila de Patricia Vibien pela Ibep Nacional (2005)
>>> O Menino do Caracol de Fernando Pessoa pela Global (2022)
>>> Maquiavel Essencial - 200 Pensamentos Escolhidos de Wagner Barreira pela No Bolso (2017)
>>> O Natal do Avarento (acompanha Suplemento de Leitura) de Charles Dickens; Telma Guimarães pela Scipione (2004)
>>> Eu Escolhi Viver de Yannahe Marques; Rose Rech pela Citadel (2021)
>>> O Cardeal e a Sra White de Eduardo Paraguassu pela Dpl (2005)
>>> Os Grandes Exploradores - Vol. 01 de Laurosse pela Larousse (2009)
>>> O Soluço do Sol de Valeria Valenza; Pina Irace pela Melhoramentos (2018)
>>> A Descoberta da América - Disney de Disney pela Abril (2011)
>>> Terapia das Perturbações Espirituais de Romário Menezes pela Dpl (2015)
>>> Danubio Azul Valsa de Johann Strauss de Esther Abbog pela Casa Sotero
>>> Conchas e Búzios de Manuel Rui pela Ftd (2013)
>>> A Expansão da Consciência e as Vibrações Psíquicas da Alma de J. Humberto E. Sobral pela Dpl (2002)
>>> Corpo Feliz - Melhore Sua Postura sem Extresse de Penny Ingham; Colin Shelbourn pela Publifolha (2003)
>>> Alice No Pais Do Quantum de Robert Gilmore pela Zahar (1998)
COLUNAS

Terça-feira, 23/10/2007
Bataille, o escritor do exagero
Daniel Lopes
+ de 8200 Acessos
+ 2 Comentário(s)

Georges Bataille (1897-1962) foi um exagerado. Sua proposta intelectual foi nada menos que desvendar a totalidade da condição humana. Mesmo que soubesse ser isso impossível, não poupou esforços em sua busca e, para tanto, dedicou-se à ficção e à filosofia, que por sua vez englobava os mais diversos ramos do conhecimento. E, enquanto é bastante comum que escritores tenham sua ficção invadida por sua história pessoal e por suas idéias filosóficas, podemos dizer que poucos conseguiram se igualar a esse francês no que toca ao seguinte ponto: nele, essas três esferas formam um triângulo que em nenhum momento consegue ser rompido.

Assim é que eu encontrei no prefácio escrito para sua novela Madame Edwarda (inédito no Brasil) a filosofia que norteia toda sua obra. E assim é que lemos nas "reminiscências" de Histoire de l'oeil (no Brasil História do olho, Cosac Naify, 2003, 138 págs.) as experiências pelas quais o autor passou na infância e que basearam a construção dessa história de outra forma estranhíssima. Volto já a esses pontos.

Antes, é preciso dizer que também na vida pessoal Bataille freqüentou os extremos. Se, filho de pais não religiosos, após a morte destes resolveu adotar o cristianismo, chegando a matricular-se num tradicional seminário em 1917, na década de 30 ele se tornaria um membro do Círculo Comunista Democrático. Isso para, no final das contas, ficar conhecido como o "novo Marquês de Sade" - só que um Sade surrealista!

Mas, à Histoire de l'oeil. Como é de praxe em Bataille, trata-se de um livro pequeno, que narra as aventuras de dois jovens de dezesseis anos (de dezesseis anos!) que saem em busca do prazer que os sentidos podem proporcionar. Os jovens - Simone e o narrador - se conhecem numa praia, e, a partir de então, passam a dar asas à imaginação.

Não se trata, no entanto, de um livro que possa ser classificado como pornográfico e ponto final (como o foi logo após ser lançado, em 1928). Bataille tinha uma visão peculiar da realidade, que, numa peça de ficção, deveria ser mostrada em seu extremo. Onde encontramos isso dito explicitamente? No citado prefácio a Madame Edwarda: "O que significa a verdade fora da representação do excesso, se assim não vemos o que excede a possibilidade de ver, o que é intolerável de ver, como o que, no êxtase, é proibido de ser fruído? Se assim não pensamos o que excede a possibilidade de pensar...?"

A realidade extremada inclui a inversão de papéis. Assim, em Histoire..., é a mãe que surpreende a filha (Simone) em atos, hum..., heterodoxos com seu colega (o narrador), quando na maioria dos contos e romances o que ocorreria, no máximo, seria a filha surpreender a mamãe com a boca na botija do papai ou de outrem. E qual a reação da filha ao ser surpreendida pela mãe? Ela ordena: "Faça de conta que não viu nada". E assim se fez.

E, quando um bando de pré-adolescentes se reúne, o resultado não é o que comumente se esperaria, mesmo se imaginamos alguma diversão entre eles. A congregação da meninada dá nisso: "Resultou um odor de sangue, de esperma, de urina e de vômito que fazia recuar de horror". De fato, os personagens de Bataille só atingem o prazer por meios não convencionais. Assim, pululam em cada página os líquidos vitais - não apenas suor, sêmen e saliva, como também muito sangue e urina. São eles que, digamos assim, lubrificam a máquina da novela, e a mantém seguindo em frente.

Nos extremos de Bataille, obviamente não poderia faltar o sacrilégio. Simone, o narrador e um senhor inglês amigo dela vão aprontar das suas na Espanha - lugar-chave na formação do escritor, pois foi lá que ele descobriu e se impressionou com a tourada (presente na Histoire...), e onde deixou-se apaixonar por Nietzsche. No país ibérico, dentro de uma igreja, o trio envolve em orgia um pacato padre, que, mesmo a contragosto, tem ereção, goza e morre. Na seqüência, tem seu olho arrancado pelo inglês, a pedido de Simone, que quer realizar a fantasia de enfiá-lo no próprio ânus. Antes de morrer, o padre teve de escutar a "missa" que o inglês rezou a Simone: "(...) essas hóstias que você vê são o esperma de Cristo em forma de petit gâteau. Quanto ao vinho, os eclesiásticos dizem ser o sangue. Eles nos enganam. Se fosse mesmo o sangue, eles beberiam vinho tinto, mas eles bebem vinho branco, sabendo bem que se trata da urina".

Todas as referências a olhos e ânus ficam mais ou menos esclarecidas no texto que o autor escreve ao final do livro. É onde explica que foi filho de um pai sifilítico que acabaria cego e de uma mãe que, com a doença do marido, começara a se comportar como uma louca, tendo que ser vigiada pelo filho. "Na puberdade", lemos, "a afeição que eu sentia por meu pai se transforma em uma inconsciente aversão". A imagem da brancura dos olhos que não mais enxergam passa a repugná-lo. E Bataille fecha esse posfácio com um parágrafo que ilumina Histoire de l'oeil: "Essas lembranças, geralmente, não me incomodam mais. Elas, depois de longos anos, perderam o poder de me incomodar: o tempo lhes a neutralizado. Elas não podem retornar à vida a não ser deformadas, irreconhecíveis, sendo, ao curso da deformação, revestidas de um sentido obsceno".

Para ir além






Daniel Lopes
Teresina, 23/10/2007

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Serge Daney: o cinema como espelho de Humberto Pereira da Silva
02. Entre a folia e o Oscar de Marta Barcellos
03. Guia para escrever bem ou Manual de milagres de Ana Elisa Ribeiro
04. Leituras, leitores e livros – Final de Ana Elisa Ribeiro
05. Cegueiras dimensionais de Marcelo Barbão


Mais Daniel Lopes
Mais Acessadas de Daniel Lopes em 2007
01. O romance espinhoso de Marco Lacerda - 11/7/2007
02. Umas e outras sobre Franz Kafka - 27/8/2007
03. Bataille, o escritor do exagero - 23/10/2007
04. Dando a Hawthorne seu real valor - 2/10/2007
05. A dimensão da morte - 2/8/2007


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
24/10/2007
01h03min
Daniel nos deixa mal acostumados, pois torna a resenha tão agradável, que a vontade é seguir lendo o original e comentando com ele (Daniel), que só faz enxergar onde, normalmente, nosso míope olhar não alcança.
[Leia outros Comentários de Paulo Vilmar]
9/12/2007
11h20min
Muito interessante o texto. Talvez, via O Erotismo, chamá-lo de pensador "do excesso" ou da "pletora", seria mais interessante do que do "exagero", precisamente por Bataille ter diante das vistas uma coleção de pensamentos "da falta". Muito interessantes também as considerações do Fucô sobre ele. Muito boas as referências, especialmente das obras literárias! um abraço,
[Leia outros Comentários de Catatau]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




O Poder Disciplinar do Empregador
Arion Sayão Romita
Freitas Bastos
(1983)



Envelhecimento - Estudos e Perspectivas (lacrado)
Manuel José Lopes
Martinari
(2014)



A Armada do papa
Gordon Urquhart
Record
(2002)



As Armas da Persuasão
Robert B. Cialdini
Sextante
(2012)



Conjuntura Atual em OSPB 1º e 2º Graus
Gleuso Damasceno Duarte
Ed Lê
(1978)



The Moment Of Lift: How Empowering Women Changes The World
Melinda Gates
Flatiron Books
(2019)



História do Ministério Público de Minas Gerais Vol. 1 Joaquim Cabral
Joaquim Cabral Netto
Speed



Were in Business
Susan Norman
Longman
(1983)



Filhos Longe da Pátria - o Desafio de Criar Filhos Em Outras Culturas
Márcia Tostes
Vale da Benção
(2011)



Voo Fantasma
Bear Grylls
Record
(2016)





busca | avançada
42527 visitas/dia
1,7 milhão/mês