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Terça-feira, 8/3/2022
Sobre a literatura de Evando Nascimento
Jardel Dias Cavalcanti
+ de 4700 Acessos



No livro A desordem das inscrições (contracantos), Evando Nascimento afirma: “Amo o improviso, sobretudo do jazz. Todavia, justamente nessa arte, improvisar nada tem de amadorístico, pois, para bem realizá-lo, o músico precisa dominar perfeitamente a técnica, e o faz geralmente a partir de uma linha melódica pré-definida. O verdadeiro improviso equivale a poder andar de olhos fechados por um vasto território, depois de tê-lo palmilhado atentamente de olhos bem abertos, durante anos, décadas.”

Esta talvez seja a chave essencial para se compreender a literatura (e os ensaios) de Evando Nascimento. Dentre a vasta produção do autor, seja na área ensaística ou da criação de contos e romance, o que se pode perceber é que existe uma correlação entre um pensamento de ruptura, de experimento e, ao mesmo tempo, uma segurança em relação ao que se quer transmitir.

Então, o improviso, se quisermos usar essa palavra, não tem aqui nada de superficial, ao contrário, tem bases sólidas em leituras e frequentação a um universo literário, artístico e filosófico muito bem assimilado. Seja num ensaio sobre Clarice Lispector, seja numa discussão sobre um teórico da literatura (Silviano Santiago) ou da filosofia (Derrida), seja uma discussão sobre a arte de Oiticica, seja numa palestra ou na sua produção literária, vamos encontrar uma reflexão que não é aventureira, superficial ou cambaleante. O solo é firme, assegurado por amplo conhecimento de causa, o que não impede os voos ousados em todas essas áreas. A combinação de boa formação universitária e convivência com a literatura e as artes, claro, colaboraram para isso.

O que nos ocupa aqui é pensar a área de criação literária de Evando Nascimento, embora sua ensaística e seus contos (e também seu romance recente sobre Van Gogh) se casem perfeitamente no seu projeto como pensador. Insisto, desde já, na palavra pensador (jamais a palavra “intelectual” caberia aqui, pois estamos tratando de um homme de lettres), porque a interconexão entre invenção e reflexão não se descasam em nenhuma das áreas em que o autor navega. Aliás, uma das maiores riquezas de sua obra é justamente a não separação dessas áreas, produzindo uma crise nos gêneros que, em outros tempos, inclusive, se criticavam e se demarcavam numa separação como afirmação de seu valor particular e até hierárquico.



Nos trabalhos de Evando Nascimento esses muros que dividiam áreas de criação e pensamento foram dinamitados. O encontro ou a não demarcação desses gêneros é, portanto, uma atividade que permite ao autor um livre e pleno desenvolvimento da imaginação, não seu contrário. Vale notar que essa superação não se dá por meios puramente intelectuais, mas como necessidade de ampliar o campo imaginativo da literatura que o autor produz.

A sua produção literária compreende os seguintes livros: Retrato Desnatural (Diários - 2004 a 2007), publicado pela Record em 2008; Cantos do Mundo, publicado pela Record em 2011; Cantos Profanos, publicado pela Biblioteca Azul, em 2014; A Desordem das Inscrições (contracantos), publicado pela 7 Letras, em 2019; e sua recente obra, o romance Diários de Vincent (impressões do estrangeiro), publicado pela Circuito, em 2021.

No que diz respeito aos seus contos, cuja própria determinação “conto” como gênero definido fica incerta, a literatura apresenta-se como uma ruptura de todos os nosso hábitos e, acima de tudo, de nossos hábitos poéticos. Como se o autor obrigasse a literatura a apagar seus elementos que a definiriam exemplarmente e simplesmente como literatura. É um outro campo que se abre, também, para o leitor, convidado a rever sua condição de “leitor de literatura”.

Existe uma frase de Bachelard que poderíamos usar como ferramenta de entendimento da literatura de Evando Nascimento: “É necessário que o leitor se prepare dinamicamente para receber sua revelação ativa, para aí colher uma nova experiência das maiores mobilidades vivas: a mobilidade da imaginação.”

A produção de um livro como Diários, tratado como ficção, já coloca o problema da “certeza” em questão, afirmando o primado da imaginação. Em um de seus ensaios, “Uma leitura nos trópicos”, o autor chama a atenção para a ideia de que “o que se fez imperativo nos últimos anos foi tornar cada vez mais iniludíveis os jogos entre subjetividade e objetividade.” Aliás, um dos pontos centrais da arte moderna é justamente a falência de uma relação clássica entre sujeito e objetos artísticos. E Evando Nascimento, conhecedor profundo de Derrida, com ele se irmana na ideia de que “o texto é um tecido, uma composição heterogênea feita de muitos fios, os quais uma vez entrelaçados implicam muitas camadas de leitura”.



Nesse sentido, a experiência do leitor é a de quem vai ter que aceitar o jogo do inverossímil como verdade, ou da verdade como inverossímil, para poder ter a experiência de uma reflexão criada na areia movediça da invenção literária. De certo modo, sabemos, só a arte proporciona essa entrada. O que importa na literatura de Evando Nascimento é borrar as áreas do saber e do criar, do pensar e do imaginar, é borrar as áreas da verdade e da não verdade, do objetivo e do subjetivo, numa construção que implode qualquer pragmatismo ou positivismo.

Há uma passagem em A Desordem das Inscrições que também serve como uma das chaves para adentrar a literatura do autor: “Um negro e um laranja bem fortes invadem a imagem, até se confundirem numa única mancha de negror alaranjado, tom sobre tom”. Por isso a não proposição de conceitos que formem uma unidade de sentido. Na sobreposição caudalosa das várias vertentes do autor como ensaísta, escritor, poeta, artista plástico, o resultado é a impossibilidade de uma unidade de significação que tinge todas as áreas “desessencializando as identidades discursivas”, como queria Blanchot.

Na avaliação de Leyla Perrone-Moisés, o tipo de literatura produzida por Evando Nascimento é daquelas “que desconfiam do sujeito como 'eu', do narrador, da narrativa, das personagens, da verdade e das possibilidades da linguagem de dizer a realidade. (...) Desconfiam da literatura como instituição e repetição de fórmulas.”

Leyla cita uma passagem do autor para falar da queixa dos escritores que hoje têm que lidar com o excesso de informação que os oprime: "Quando se começa, nunca se está diante da folha ou da tela em branco, no papel, pano ou cristal líquido, a folha lívida e lisa já está cheia de clichês, montoeira de inutilidades que é preciso limpar para iniciar o trabalho, e o principal clichê foi o que acabei de mencionar."

Ainda, segundo Leyla, “Evando Nascimento é o mais ensaístico de todos; fala de arte, de política, contém sua própria teoria e sua própria crítica, restando muito pouco a dizer ao 'amável crítico' que ele interpela ironicamente”.

Essas são virtudes de sua obra, que encontra um lugar dentro do universo de todas as rupturas que assistimos do século XX até hoje. Mas não repetindo fórmulas já consagradas, aponta para um lugar de risco, novo, ousado e aberto. “A única solução talvez seja simplesmente diferir”, diz o escritor. Para Evando Nascimento, como ele registra, a sua literatura pretende ter "um olhar desnudado sobre o incêndio, tentando segurar as brasas com os dedos e correndo o risco de esfolamento...".



Existe um elemento nos escritos de Evando Nascimento que não posso deixar de comentar. É aquela sensação de prazer que nos acomete nas leituras, fruto não só da percepção que temos do seu domínio impressionante da linguagem, mas daquela clareza de quem sabe comunicar o que necessita ser comunicado, com estilo, sem precisar ser empolado, acadêmico, ou seja, chato. O autor tem aquela leveza de quem sabe surfar nas ondas em que entra. E isso fica claro no espetáculo que assistimos, dessa flutuação leve e ao mesmo tempo sobre controle, em que as ondas tornam-se parte de seu corpo-escrita e lhes servem bem no seu balé aquático-literário.

Não surpreende que o novo livro de Evando Nascimento, O Pensamento Vegetal: a literatura e as plantas (Civilização Brasileira), aproxime plantas e literatura, numa análise “para além do cogito humano”, numa pesquisa sobre a tradução do universo vegetal pela literatura, essa forma singular de comunicação entre os humanos e a natureza.


Jardel Dias Cavalcanti
Londrina, 8/3/2022

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