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Quarta-feira, 24/6/2009
O primeiro parágrafo
Luiz Rebinski Junior
+ de 10100 Acessos
+ 3 Comentário(s)

Pegar um livro, abrir e ir de cara ao primeiro parágrafo é um artifício manjado para sentir se uma obra tem culhão, se vale a pena ser lida ou não. Não são poucos os leitores ilustres ― entre críticos e escritores ― que já admitiram utilizar o método do primeiro parágrafo ― e às vezes do último ― para selecionar a leitura de cada dia. É claro que não é um método lá muito confiável, mas tem seu charme. O perigo é descartar um bom livro por conta de um início apagado, pouco vibrante. Mas é o risco que se corre.

No texto que Charles Bukowski escreveu, em 1979, para a reedição de Pergunte ao pó nos Estados Unidos, o Velho Safado conta que utilizava método semelhante para tentar achar algo que valesse a pena ser lido quando era adolescente e vagabundeava sem destino pela Biblioteca de Los Angeles. "Eu continuava dando voltas na grande sala, tirando livros das estantes, lendo algumas linhas, algumas páginas, e depois os colocando de volta. Então um dia puxei um livro e o abri, e lá estava. Fiquei parado de pé por um momento, lendo. Como um homem que encontrara ouro no lixão da cidade, levei o livro para uma mesa".

A maneira como Bukowski "achou" Fante é um bom exemplo de como um começo de livro pode prender o leitor e incentivá-lo a ir adiante. Bukowski, mais dia menos dia, descobriria Fante e sua obra, mesmo que o início de Pergunte ao pó fosse uma coisa meio... proustiana. Mas é certo que aquele início de livro, com Arturo Bandini sentado na cama decidindo se pagava a pensão onde estava hospedado ou fugia de lá sem deixar rastro, cativou o adolescente Bukowski, que, anos depois, viria a ser o fã número um de John Fante.

O mais engraçado é que, mesmo não sendo um recurso muito seguro, o método do primeiro parágrafo é, pelo menos para mim, certeiro. Para fazer a listinha que segue abaixo, não consegui lembrar de nenhum início genial de livro meia-boca. Então parece que há, sim, uma relação entre um bom começo e uma grande obra. Como em toda boa lista, a minha não tem critério algum. Há espaço para o início com vírgula de Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres, da grande Clarice Lispector (aliás, uma expert em bons parágrafos de abertura), e para a síntese máxima da História que abre O Manifesto Comunista, de Karl Marx. Portanto, aviso que posso ter cometido grandes e pequenas heresias, já que minhas escolhas foram feitas única e exclusivamente de acordo com o meu gosto pessoal. É claro que há outros começos empolgantes, mas há de se dar um desconto à minha rasa pesquisa, que se limitou aos exemplares da minha modesta biblioteca. Então, segue abaixo grandes aberturas de livros que valem pelo todo.

Memórias póstumas de Brás Cubas (Machado de Assis): "Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo: diferença radical entre este livro e o Pentateuco."

Medo e delírio em Las Vegas (Hunter S. Thompson): "Estávamos em algum lugar perto de Barstown, à beira do deserto, quando as drogas começaram a fazer efeito. Lembro que falei algo como 'estou meio tonto; acho melhor você dirigir...' E de repente fomos cercados por um rugido terrível, e o céu se encheu de algo que pareciam morcegos imensos, descendo, guinchando e mergulhando ao redor do carro, que avançava até Las Vegas a uns 160 por hora, com a capota baixada. E uma voz gritava: 'Jesus Santíssimo! Que diabo são esses bichos'".

O Estrangeiro (Albert Camus): "Hoje mamãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem. Recebi um telegrama do asilo: 'Sua mãe faleceu. Enterro amanhã. Sentidos pêsames'. Isso não esclarece nada. Talvez tenha sido ontem."

Recordações do escrivão Isaías Caminha (Lima Barreto): "A tristeza, a compreensão e a desigualdade de nível mental do meu meio familiar, agiram sobre mim de modo curioso: deram-me anseios de inteligência. Meu pai, que era fortemente inteligente e ilustrado, em começo, na minha primeira infância, estimulou-me pela obscuridade de suas exortações. Eu não tinha ainda entrado para o colégio, quando uma vez me disse: Você sabe que nasceu quando Napoleão ganhou a batalha de Marengo? Arregalei os olhos e perguntei: quem era Napoleão? Um grande homem, um grande general... E não disse mais nada. Encostou-se à cadeira e continuou a ler o livro. Afastei-me sem entrar na significação de suas palavras; contudo, a entonação de voz, o gesto e o olhar ficaram-me eternamente. Um grande homem!..."

O Manifesto Comunista (Karl Marx): "A história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestre de corporação e companheiro, numa palavra, opressores e oprimidos, em constante oposição, têm vivido numa guerra ininterrupta, ora franca, ora disfarçada; uma guerra que terminou sempre, ou por uma transformação revolucionária, da sociedade inteira, ou pela destruição das duas classes em luta."

Poema Sujo (Ferreira Gullar):
"turvo turvo
a turva
mão do sopro
contra o muro
escuro
menos menos
menos que escuro
menos que mole e duro menos que fosso e muro: menos que furo
escuro
mais que escuro:
claro
como água? como pluma? claro mais que claro claro: coisa alguma
e tudo
(ou quase)
um bicho que o universo fabrica e vem sonhando desde as entranhas
azul
era o gato
azul
era o galo
azul
o cavalo
azul
teu cu
tua gengiva igual a tua bocetinha que parecia sorrir entre as folhas de
banana entre os cheiros de flor e bosta de porco aberta como
uma boca do corpo (não como a tua boca de palavras) como uma
entrada para
eu não sabia tu
não sabias
fazer girar a vida
com seu montão de estrelas e oceano
entrando-nos em ti..."

Pergunte ao pó (John Fante): "Uma noite, eu estava sentado na cama do meu quarto de hotel, em Bunker Hill, bem no meio de Los Angeles. Era uma noite importante na minha vida, porque eu precisava tomar uma decisão quanto ao hotel. Ou eu pagava ou eu saía: era o que dizia o bilhete, o bilhete que a senhoria havia colocado debaixo da minha porta. Um grande problema, que merecia atenção aguda. Eu o resolvi apagando a luz e indo para a cama."

A Metamorfose (Franz Kafka): "Certa manhã, ao despertar de sonhos intranquilos, Gregor Samsa encontrou-se em uma cama metamorfoseado num inseto monstruoso. Estava deitado sobre suas costas duras como couraça e, quando levantou um pouco a cabeça, viu seu ventre abaulado, marrom, dividido em segmentos arqueados, sobre o qual a coberta, prestes a deslizar de vez, apenas se mantinha com dificuldade. Suas muitas pernas, lamentavelmente finas em comparação com o volume do resto de seu corpo, vibravam desamparadas ante seus olhos."

Lolita (Vladmir Nabokov): "Lolita, luz da minha vida. Labareda da minha carne. Minha alma, minha lama. Lo-li-ta: a ponta da língua descendo em três saltos pelo céu da boca para tropeçar de leve, no terceiro, contra os dentes. Lo-li-ta."

O apanhador no campo de centeio (J. D. Salinger): "Se querem mesmo ouvir o que aconteceu, a primeira coisa que vão querer saber é onde nasci, como passei a porcaria da minha infância, o que os meus pais faziam antes que eu nascesse, e toda essa lenga-lenga tipo David Copperfield, mas, para dizer a verdade, não estou com vontade de falar sobre isso. Em primeiro lugar, esse negócio me chateia e, além disso, meus pais teriam um troço se contasse qualquer coisa íntima sobre eles. São um bocado sensíveis a esse tipo de coisa, principalmente meu pai. Não é que eles sejam ruins ― não é isso que estou dizendo ― mas são sensíveis pra burro. E, afinal de contas, não vou contar toda a droga da minha autobiografia sem nada. Só vou contar esse negócio de doido que me aconteceu no último Natal, pouco antes de sofrer um esgotamento e me mandarem para aqui, onde estou me recuperando."

Ulisses (James Joyce): "Majestoso, o gorducho Buck Mulligan apareceu no topo da escada, trazendo na mão uma tigela com espuma sobre a qual repousavam, cruzados, um espelho e uma navalha de barba. Um penhoar amarelo, desamarrado, flutuando suavemente atrás dele no ar fresco da manhã. Ele ergueu a tigela e entoou: Introibo ad altare Dei."

Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres (Clarice Lispector): ",estando tão ocupada, viera das compras de casa que a empregada fizera às pressas porque cada vez mais matava o serviço, embora só viesse para deixar almoço e jantar prontos (...)."


Luiz Rebinski Junior
Curitiba, 24/6/2009

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COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
25/6/2009
07h41min
Usa-se o fragmento consubstancial para o entendimento do texto. Uma análise fragmentada e mais consistente do que olharmos apenas o primeiro capítulo.
[Leia outros Comentários de Manoel Messias Perei]
25/6/2009
09h47min
Puxa, e eu que achava que era a única a fazer isso! hehehe Particularmente, eu amo os primeiros parágrafos de PG Woodehouse. Mais do que um bom começo, é a representação do que vem pela frente.
[Leia outros Comentários de Kelly]
13/7/2009
17h53min
Costumo ler mais do que o primeiro parágrafo para me entusiasmar, acredito nas pessoas, dou chance para os parágrafos seguintes. Mas confesso que depois desse artigo vou dar mais valor aos primeiros parágrafos... Fiquei seco para ler Ferreira Gullar e o "O apanhador no campo de centeio". =) Forte abraço.
[Leia outros Comentários de Alex de Miranda]
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