Coisas que eu queria saber fazer | Ana Elisa Ribeiro | Digestivo Cultural

busca | avançada
52838 visitas/dia
2,0 milhões/mês
Mais Recentes
>>> “DESIGN versus DESIGUALDADES: Projetar um mundo melhor”
>>> “O Tempo, O Feminino, A Palavra” terá visita guiada no Sérgio Porto
>>> Marés EIN – Encontros Instrumentais | Lançamento Selo Sesc
>>> renanrenan e Os Amanticidas
>>> Ekena canta Elis
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
Colunistas
Últimos Posts
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
>>> Claude 4 com Mike Krieger, do Instagram
>>> NotebookLM
>>> Jony Ive, designer do iPhone, se junta à OpenAI
>>> Luiz Schwarcz no Roda Viva
Últimos Posts
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
>>> Transforme histórias em experiências lucrativas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> O frenesi do furo
>>> A vez dos veteranos
>>> Brasil em alemão
>>> O NAVEGANTE DO TEMPO
>>> Os donos da voz
>>> Simone de Beauvoir: da velhice e da morte
>>> O guia do consumidor de livros
>>> Admirável mundo novo — teatro
>>> Europeus salvaram o cinema em 2006
>>> Deus fala em Caps Lock
Mais Recentes
>>> Democracia Hoje: Novos Desafios Para A Teoria Democrática Contemporânea de Jesse Souza (org.) pela Unb (2001)
>>> Fronteiras de Tensão: Política e Violência nas Periferias de São Paulo de Gabriel de Santis Feltran pela Unesp (2011)
>>> A Elite do Atraso: Da Escravidão à Lava Jato de Jessé Souza pela Leya (2017)
>>> Maya Cultural Activism in Guatemala de Edward F. Fisher + R. McKenna Brown (edit.) pela University of Texas Press (2001)
>>> Urbanismo E Política No Brasil Dos Anos 1960 de Maria Silva da Cristina (org.) pela Annablume (2019)
>>> Origens da Habitação Social no Brasil de Nabil Bonduki pela Estação Liberdade (2025)
>>> História do Marxismo: O Marxismo na Época da Segunda Internacional 2 de Vários Autores pela Paz e Terra (1984)
>>> Um Critico Na Periferia Do Capitalismo: Reflexoes Sobre A Obra De Roberto Schwarz de Maria Elisa Cevasco + Milton Ohata (org.) pela Companhia Das Letras (2007)
>>> História do Marxismo: O Marxismo no Tempo de Marx 1 de Vários Autores pela Paz e Terra (1979)
>>> Análise De Circuitos de John O'malley pela Pearson (1994)
>>> Inteligência Emocional no Trabalho de Hendrie Weisinger pela Objetiva (2010)
>>> Caldeirão: A Guerra dos Beatos de Cláudio Aguiar pela Independently Published (2020)
>>> Sherlock: um Estudo em Rosa de Steven Moffat - Mark Gatiss - Jay pela Panini Comics (2017)
>>> Teoria da Metáfora de Francisco Filipak pela Hdv (1993)
>>> Pós-neoliberalismo de Vários Autores pela Paz & Terra (2010)
>>> Buda: No Reino De Kapilavastu - Vol. 1 de Osamu Tezuka pela Conrad (2025)
>>> Almas Gemelas (spanish Edition) de Deepak Chopra pela Ediciones B (2002)
>>> Roberto Silveira: a Pedra e o Fogo de Fogo José Ribeiro Rocha pela Casa Jorge (2003)
>>> Linguagens espacos e tempos no ensinar e aprender de Alda pela Gpa (2020)
>>> One-Punch Man 08 de one - Yusuke Murata pela Panini Comics (2017)
>>> O que faz a diferença de Fátima Zorzato pela Portfolio (2021)
>>> O Livro Alquimico De Saint Germain de Saint Germain pela Nova Era (1998)
>>> Bandeirantes: Raça De Gigantes de Renata de Castro Melo pela Zeca (2020)
>>> One-Punch Man 11 de One - Yusuke Murata pela Planet Manga - Panini Comics (2017)
>>> Como Usar As Leis Da Mente de Joseph Murphy pela Record (1983)
COLUNAS

Sexta-feira, 18/1/2013
Coisas que eu queria saber fazer
Ana Elisa Ribeiro
+ de 6600 Acessos

Dia desses, numa cidade bem longe daqui, surpreendi um arquiteto começando a desenhar a planta baixa de uma casa. Era uma encomenda. Alguém queria uma casa que começasse do zero. Uma criação. Morar em uma ideia que nunca tinha existido.

Ele sustentava a cabeça com uma das mãos enquanto a outra mão segurava um lápis que ameaçava tocar, de leve, uma folha de papel milimetrado. E antes que o grafite marcasse o branco, eu apareci na porta e perguntei o que era aquilo. Eu já sabia, mas eu queria saber mais, saber certo, saber pra poder me declarar. Eu acho arquitetura uma das coisas mais lindas do universo.

Eu disse ao arquiteto que achava aquilo muito bonito. Pedi a ele, feito uma criança, que me deixasse ficar ali vendo-o trabalhar, mas acho que isso não funciona com os arquitetos, nem com os poetas, nem com os músicos. Meus olhos e minha respiração ali podiam desconcentrar o moço, que passou, então, a me explicar coisas. Explicou como começa, de onde vinha aquele projeto, qual era o fluxo que ele preferia seguir; explicou sua ideia inicial, mas disse que ela mudaria muito, tantas vezes, e que isso seria normal; e que o pedido de alguém é muito difícil de traduzir, de atender, de entender; e explicava que ele imaginou uma casa com base nas palavras imprecisas de alguém que queria morar.

Se eu soubesse desenhar casas e antever combinações de cores, coisas que não sei fazer mesmo, eu projetaria minha casa para muitas felicidades. Mas minha casa foi feita assim, aos remendos, então não sei como apurá-la. Nem sequer soube escolher as cores das paredes ou o desenho das peças de cerâmica que pus no chão. Na minha casa não teve espaço pra sonho e nem pra descanso.

E ninguém me seguraria se eu soubesse desenhar. Uma das coisas mais bonitas que há é ver alguém tirando da ponta do lápis um dragão, uma abelha, uma pessoa ou um corpo nu. Ilustrar livros, então, é coisa divina, não tem precedentes nesta Terra. Ouvir ou ler uma história e transformá-la numa cena, num texto de ver, com cores ou não. Ninguém me seguraria nesta vida se eu pudesse fazer quadrinhos ou cartuns. Imagina a ironia em um quadro só. A escrita pede uma lógica mais miúda, parece. E eu a tenho. Mas não aprendi a desenhar.

Sempre dizem que nossa curtição com desenho é de criança. Muita criança (pra não dizer toda) desenha, desde muito cedo, e se expressa nessa linguagem. E acusam, por aí, a escola e tudo o mais de irem podando essa nossa expressão, até que ela se torne mínima, ínfima, quase invisível. O desenho não é a expressão mais importante, mais necessária ou mais solicitada do nosso mundo escolar. Há campanhas de ler e escrever, mas não as há de desenhar. E se havia um artista futuro, é tratar de ensiná-lo a se esconder atrás das redações e dos concursos de vestibular. Vai desenhar pra brincar, não pra fazer coisa séria.

Mas eu não sei se acredito nisso. Onde estava meu talento de desenhista? Nunca tive. Já vim castrada desde o útero. Minha expressão já queria ser, há séculos, aquela que emprega as palavras. Mas eu sei, de fato, de gente que se exprimia no desenho e teve de despistar. Ou, ao menos, teve de controlar melhor os impulsos. Lá adiante, na engenharia ou na arquitetura, é possível exprimir um desenho mais controlado, sistematizado e científico. Arquiteto que inventa é poeta. Mas ser poeta não é coisa que se diga por aí.

Se eu soubesse desenhar, faria casas bonitas pra a gente morar; pessoas lindas pra a gente namorar; ilustraria histórias pra a gente curtir; projetaria cidades pra a gente sossegar. Mas não é isso o que eu sei fazer. E não sei mesmo. Saem aqui minha menina de palitos e meu carrinho de bolotas. Nada mais.

A expressão que eu escolhi e que eu exercitei foi a das palavras. Isso também não escapou do controle e da sistematização. Quiseram me ensinar a me recolher, a usar o verbo comum e a não criticar demais. Ensinaram lá umas regras da quantidade de parágrafos e um jeito padrão de desenrolar o assunto. Eu fingi. Eu fingi direitinho que ia obedecer. Eu pegava escondido meus cadernos com pautas regulares e escrevia do jeito que eu queria, do jeito que eu achava que ia ficar mais bonito. Se era esquisito? Não achava. Achava engenhoso. Achava charmoso. Vez ou outra, mostrava pra alguém e fazia arrepiar. Mas eu escondia tudo de novo, na mesma gaveta, pra fazer minha obrigação.

Escrever também não é coisa que se deixe alguém fazer livremente. Tem campanha pra ler, pra consumir, mas não tem campanha pra todo mundo escrever. O que vão dizer? Melhor não saber. Ler calado é coisa garantida. E, mesmo assim, não ensinam a ler direito. A quietude, aqui, não é desejo, é impotência. Ler e escrever dão poder. A quem?

Eu fiquei ali olhando o arquiteto trabalhar. Vi que ele riscou, apagou, riscou de novo, aumentou, diminuiu, trocou de lugar. Para acabar, tinha de ir pro computador, colorir, calcular. Ele gastou muitas daquelas folhas quadriculadas para projetar o que ainda iria mostrar. E me deu, então, uma vontade danada de escrever.


Ana Elisa Ribeiro
Belo Horizonte, 18/1/2013

Quem leu este, também leu esse(s):
01. A utopia das paredes de vidro de Carla Ceres
02. Caio Fernando Abreu, um perfil de Rafael Rodrigues
03. Leituras, leitores e livros – Final de Ana Elisa Ribeiro
04. Um curso para editores de Ana Elisa Ribeiro
05. A dama brasileira do crime de Luis Eduardo Matta


Mais Ana Elisa Ribeiro
Mais Acessadas de Ana Elisa Ribeiro em 2013
01. Elogio ao cabelo branco - 16/8/2013
02. Coisas que eu queria saber fazer - 18/1/2013
03. A bibliotecária de plantão - 18/10/2013
04. O fim e o café solúvel - 26/4/2013
05. Se ele não me lê - 8/3/2013


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Optical Mineralogy
Austin F. Rogers Paul F. Kerr
Mcgraw
(1942)



Molestias Hereditarias Do Sistema Tireoideo - Medicina
Geraldo Medeiros Neto
Roca
(1996)



Livro Gestão De Rh Por Competências E A Empregabilidade
Aguinaldo Neri
Papirus
(2005)



Mouros Franceses e Judeus três presenças no Brasil
Luís da Câmara Cascudo
Global
(2005)



Robert Lepage: Conversas Sobre Arte e Método
Renate Klett
Sesc
(2016)



Microsoft Windows 2000 Server
Eduardo Bellincanta Ortiz
Érica
(2001)



Os Milagres de Fátima 351
Renzo Allegri
Paulinas
(2013)



Style a to Zoe - the Art of Fashion, Beauty & Everything Glamour
Rachel Zoe
Grand Central Publishing
(2007)



Amor, Trigo e Traição
Joao Alberto
Zennex Publishing
(2006)



Livro Quem Ama, Educa!
Içami Tiba
Gente
(2002)





busca | avançada
52838 visitas/dia
2,0 milhões/mês