Gustavo Rezende: uno... duplo... | Humberto Pereira da Silva | Digestivo Cultural

busca | avançada
44126 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Teatro do Incêndio e Colmeia Produções convidam o público a partilhar saberes no ciclo Incêndios da
>>> ZÉLIO. Imagens e figuras imaginadas
>>> Galeria Provisória de Anderson Thives, chega ao Via Parque, na Barra da Tijuca
>>> Farol Santander convida o público a uma jornada sensorial pela natureza na mostra Floresta Utópica
>>> Projeto social busca apoio para manter acesso gratuito ao cinema nacional em regiões rurais de Minas
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
Colunistas
Últimos Posts
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Aproximações políticas, ontem e hoje
>>> Surf em cima do muro
>>> E não sobrou nenhum (o caso dos dez negrinhos)
>>> Semana da Canção Brasileira
>>> Cartas@de.papel
>>> 24 Horas: os medos e a fragilidade da América
>>> Ai de ti, 1958
>>> Cultura, técnica e uma boa idéia
>>> Aqui você encontra?
>>> Desvirtualização no Itaú Cultural
Mais Recentes
>>> O tarô zen, de Osho de Osho pela Antier (2022)
>>> O Catador de Pensamentos de Monika Feth pela Brinque Book (2013)
>>> Educação Excepcional Manual para Professores de Ottilia Braga Antipoff pela Pestalozzi (1983)
>>> O Cemitério Dos Anões Livro 2 de Marcos Mota pela (2017)
>>> O Poder do Agora de Eckhart Tolle pela Sextante (2000)
>>> Codigo Penal Para Concursos Sanches de Rogerio Sanches Cunha pela Juspodivm (2022)
>>> Os Três Lobinhos e o Porco Mau de Eugene Trivizas e Helen Oxenbury pela Brinque Book (2010)
>>> 50 Gershwin Classics - Piano / Vocal de George Gershwin pela Warner Bros (1989)
>>> As Sete Leis Espirituais Da Ioga de Deepak Chopra pela Rocco (2008)
>>> Ozzy - O Menino da Cabeça Erguida de Anna Padilha Moura pela Quatro Ventos (2024)
>>> Frank Sinatra Songbook de Frank Sinatra pela Warner Bros (1989)
>>> Uma aventura de Asterix o gaules - O adivinho de Uderzo - Goscinny pela Record (1985)
>>> Autobiografia De Um Iogue de Paramahansa Yogananda pela Self-realization Fellowship (2016)
>>> Para minha amada Julieta de Natália Soares pela Literíssima (2024)
>>> A Corrosão Do Caráter de Richard Sennett pela Record (2012)
>>> Bíblia Sagrada - Show da Fé, Edição Comemorativa de Sociedade Bíblica do Brasil pela Sociedade Bíblica do Brasil (2006)
>>> Anjo Da Morte de Pedro Bandeira pela Moderna (2001)
>>> Manual de processo penal de Fernando da costa tourinho filho pela Saraiva (2013)
>>> Pocesso penal de Fernando da costa tourinho filho pela Saraiva (2000)
>>> Direito e processo do trabalho de Estêvão mallet,vários autores pela Ltr (1996)
>>> Processo penal de Fernando da costa tourinho filho pela Saraiva (1990)
>>> Código penal de Juarez de oliveira pela Saraiva (1993)
>>> Código comercial de Antonio luiz de toledo pinto pela Saraiva (2005)
>>> Código comercial de Antonio luiz de toledo pinto pela Saraiva (2004)
>>> Clínica médica medicamentos e rotinas médicas de Ênio roberto pietra pedroso,reynaldo gomes de oliveira pela Blackbook (2007)
COLUNAS

Quarta-feira, 22/1/2014
Gustavo Rezende: uno... duplo...
Humberto Pereira da Silva
+ de 5700 Acessos

O imperador e seu Dorso

O imperador e seu Dorso, 1991, madeira, 98 X 70 X 12 cm, foto de Eduardo Brandão

A exposição Gustavo Rezende: Mergulho, curadoria de Ivo Mesquita, está aberta ao público na Pinacoteca de São Paulo desde 9 de novembro e vai até 26 de fevereiro. Nela estão reunidos cerca de 40 trabalhos, realizados da década de 1980 até os dias de hoje, que exibem diferentes momentos e inquietações do artista. Assim, nos trabalhos iniciais de Rezende predominam o uso de materiais como madeira, bronze, gesso e chumbo; já a partir dos anos de 1990, há uma ampliação de suportes: ele passa a explorar novas possibilidades de linguagem por meio de mangás, colagens com fitas crepe etc.; na exposição, destaque também para suas experiências com fotografia, que ganham densidade em sua trajetória no final dos anos de 1990.

A exposição também foi ocasião para o lançamento do livro Gus (Ed. Martins Fontes, 270 pág.), que reúne parte de sua obra e textos de Felipe Chaimovich, Fernando Oliva, Juliana Monachesi, Regina Teixeira de Barros e Tadeu Chiarelli. São redações curtas, mas instigantes e que procuram desvelar pontos cardeais das obras e das motivações implícitas do artista; com destaque, principalmente, para o lugar que ele ocupa no cenário artístico brasileiro nas duas recentes décadas. Nesse ponto, vale ressaltar, o modo como a obra de Rezende reflete os impasses da arte contemporânea: premida entre a ideia do artista como criador e injunções sociais e de mercado que colocam em xeque sua autonomia criativa.

Sendo assim, deve-se ter em vista em sua obra a persistência de duas constantes: a profusão de duplos de Gustavo Rezende e o caráter hermético na relação entre título de obra e obra referida pelo título.

Na primeira constante, os muitos "autorretratos" - ou imagens de Gustavo - são identificados com nomes próprios: Maxwell, Allan, Thompson, Gus...; ou um substantivo, como Hero. Para um olhar sem a devida cautela, a impressão de que o nome revelaria um processo de despersonalização: Maxwell seria um personagem, portanto, uma criação imaginária, com existência própria independente do artista (nesse sentido, do mesmo modo que Shakespeare e Hamlet não são o mesmo). Mas não é essa a ideia que está por trás do processo de nomeação de Gustavo Rezende. Sagaz, sua obra propõe um instigante e enigmático jogo entre a dimensão ontológica do nome e este tomado por mera etiqueta.

Seu próprio corpo é o meio que permite a nomeação. Sendo assim, Gustavo Rezende não se confunde com o corpo que lhe serve de nome; assim como seu corpo não se confunde com a imagem deste. Do mesmo modo, Maxwell não se confunde com a imagem que recebe este nome; tampouco, com o corpo que serve de modelo para a imagem. Contudo, da mesma maneira que o rosto - físico - de Gustavo Rezende não se confunde com o corpo que o prende, tal rosto assim considerado compõe com outros membros para que se tenha, efetivamente, o corpo. Assim, pelo menos, é como ele se expressa: "Não, não acho que seja eu, mas (ali) também tem eu. Às vezes é meu corpo, mas é claramente outra pessoa".

Ora, o nome "Maxwell", como o rosto no corpo, bem pode se separar do nome "Gustavo Rezende" e ganhar autonomia própria; do contrário, "Maxwell" é parte do que, na soma, é "Gustavo Rezende"; ou ainda, "Gustavo Rezende" é parte do que é "Maxwell". Certo, mas não é só a questão de se saber o que é "Maxwell", que está em jogo na obra do artista Gustavo Rezende. Nessa opção, na criação de personas, o nome concebido como etiqueta.

Se assim se deve considerar, levemos em conta a relação entre o nome e uma mercadoria exposta na prateleira de um supermercado. No nome, na etiqueta, está subsumido o valor. No nome, portanto, o quanto um produto se oferece como objeto de fetiche. A etiqueta pode separar, assim, o que na soma de incidentes traduz o mesmo sentido: saciamos a sede com água, ou com uma garrafa de coca-cola.

Ao jogar com duplos de si, assim me parece, a obra de Gustavo Rezende traz, justamente, um elemento de ambiguidade para se pensar a sociedade de consumo; o nome (a etiqueta) escolhido casualmente não é senão o sinal que aponta para uma coisa (um produto); mas, do ponto de vista simbólico - o campo dos chamados significados - essa coisa se adensa e carregá-la implica movimentar um peso que agrega mais do que a mera denotação.

Maxwell seria, então, apenas um nome a mais que se agregaria com outros duplos de Gustavo Rezende; sua obra, contudo, sugere que, assim como uma garrafa de coca-cola, esse não é o caso. O significado de "Maxwell" transborda, ao lado de Allan, Thompson, Gus..; como coca-cola ao lado de pepsi, sprite...

Maxwell sentado

Maxwell sentado, 2012, ferro fundido, madeira, folha de ouro, 33 X 19 X 17 cm

Outra constante que chama a atenção na obra de Gustavo Rezende refere-se ao caráter hermético dos títulos que ele dá. Tadeu Chiarelli observa que numa obra como "O imperador e seu dorso" não se percebe conexão entre "o imperador" e "seu dorso". Para ele, estas expressões não são equivalentes, nem com respeito ao significante nem quanto ao significado. Mas a questão interpretativa se estende ainda - mesmo que não observada por Chiarelli - ao nexo entre título e obra. Esta, uma escultura em madeira, com a forma de duas jarras de chope interligadas pelas alças.

Nada impede o apreciador em visita à Pinacoteca de buscar aproximação entre a forma da escultura e seu título. Com isso, uma possível significação. Mas para Chiarelli o enigma está no próprio título, cujas partes estariam desconectadas. Tenho, contudo, outro viés de observação: a obra está lá, autônoma em si mesma, inefável às palavras. Estas não explicam, ou esclarecem o que ela significa, pois a obra tão somente se mostra. Tentar significá-la é retirar dela seu caráter místico, conforme o filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein.

Se a pista sugerida por Wittgenstein for sensata, eis um dado para se pensar no nexo entre título e obra no conjunto de trabalhos de Gustavo Rezende. O título apenas sugere, revela traços imprecisos, oferece senhas falsas. Assim, a inefabilidade da obra se exibe por meio do título, que por sua vez se exibe como nonsense. Ora, por trás desse jogo entre procura de sentido e suspeita de absurdo, algo similar à relação entre Gustavo Rezende e seus duplos; entre Gustavo Rezende e Maxwell: ambos são e não são o mesmo. Ou seja, os sibilinos títulos de suas obras referem-se e não se referem às obras designadas.

Um observador atento poderá ver na junção de duas jarras de chope um dorso - uma questão de "ver como" wittgensteiniano; assim como poderá indagar sobre a "nobreza" da madeira que serve de suporte para a forma obtida. Mas se ele vir outra forma - e disser o que viu -, isso indica como as palavras são inefáveis para "dizer" sobre a obra (outro título podia ser pensado, algo como "O imperador e duas jarras de chope"...).

Esse dado inquiridor, constantemente presente na obra de Gustavo Rezende (no título e sua extensão material), desafia o olhar do observador; mas igualmente importante para perceber a relevância de seus propósitos, sua sagacidade para lidar com a tensão entre autonomia de criação e sujeição ao mercado (essas duas possibilidades são afirmadas e negadas, num paralelismo de espelhos cujas imagens se refletem ao infinito), assim como sobre os limites do que uma obra "queira dizer", com sentido, tendo por referência o mundo. Um tanto wittgensteiniano, "O imperador e seu dorso" está lá, e assim se mostra àqueles que visitem a exposição "Gustavo Rezende: Mergulho".

O título da exposição, por sinal, talvez inadequado; sem sentido, mas num nível diferente do nonsense dos títulos das obras. "Mergulho" sugere a tradução literal de "Hero", imagem de Gustavo Rezende nadando. Mas por um lado isso limita o alcance do que é exposto; e por outro sugere um sentido ausente no trajeto do artista (mais adequado, quiçá, "Mergulho e a vã busca de sentido para as palavras"...). Já o título do livro, "Gus", carrega o mesmo nonsense dos títulos das obras "retratadas", os duplos do que se vê na exposição.

Hero

Hero, 2000, fotografia sobre triedro [painel giratório com acabamento em aço inox] 200 X 140 X 12cm


Humberto Pereira da Silva
São Paulo, 22/1/2014

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Contos em pianíssimo, de Patricia Maês de Jardel Dias Cavalcanti
02. Lei de Imprensa, Diploma e Questões Afins de Ricardo de Mattos
03. Jogos olímpicos na China de Jardel Dias Cavalcanti
04. Papel, tinta, bluetooth e wireless de Tati de Roterdã
05. Por dentro do Joost: o suco da internet com a TV de Tati de Roterdã


Mais Humberto Pereira da Silva
Mais Acessadas de Humberto Pereira da Silva em 2014
01. Tectônicas por Georgia Kyriakakis - 13/8/2014
02. O medo como tática em disputa eleitoral - 8/10/2014
03. Gustavo Rezende: uno... duplo... - 22/1/2014
04. Monticelli e a pintura Provençal no Oitocentos - 5/2/2014
05. O caso Luis Suárez - 16/7/2014


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Bush 2 a Missão e outras reflexões sobre o mundo do século XXI
Nelson Franco Jobim
Nova Prova
(2006)



Seefahrt in Aller Welt Nr 20
Anker Hefte
Moewig Verlag
(1955)



Os Jornais Podem Desaparecer?
Philip Meyer
Contexto
(2007)



Wander Piroli uma Manada de Búfalos Dentro do Peito
Fabrício Marques
Conceito
(2018)



Godenslaap
Erwin Mortier
Bezige
(2009)



Livro Literatura Estrangeira O Vermelho e o Negro Volume 23
Stendhal
Abril Cultural
(1971)



Matemática Aplicada às Ciências Gerenciais
Dimas Felipe de Miranda; João Bosco Laudares; Trajano Coutinho de Almeida
Fumarc
(1983)



Caridade
Francisco Cândido Xavier; Outros
Ide
(1984)



Amiga Do Diabo - Coleção Negra
Peter Robinson
Record
(2010)



O Cérebro e o Sistema Nervoso Central - Seu Corpo , Sua Saúde
Readers Digest
Readers Digest
(2007)





busca | avançada
44126 visitas/dia
1,7 milhão/mês