150 anos de Miguel de Unamuno | Celso A. Uequed Pitol | Digestivo Cultural

busca | avançada
41875 visitas/dia
1,9 milhão/mês
Mais Recentes
>>> “O Menino Bach visita o Brasil”, apresentações de teatro de bonecos chega hoje ao Espirito Santo em
>>> Terreiros Nômades leva a cultura Guarani com Márcio Cacique a escolas da Zona Sul
>>> “cicatriz”: escritor Breno Ribeiro retrata em “thriller familiar” as dores da perda de um filho
>>> LIVROS EM MOVIMENTO TERMINAIS PINHEIROS, PIRITUBA E CAMPO LIMPO PROMOVEM AÇÃO DE FOMENTO À LEITURA
>>> Circuito Arte e Cidade apresenta: Cidade Espetáculo - Aventura nos Três Poderes
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
>>> Xingando semáforos inocentes
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
Colunistas
Últimos Posts
>>> Sultans of Swing por Luiz Caldas
>>> Musk, Moraes e Marçal
>>> Bernstein tocando (e regendo) o 17º de Mozart
>>> Andrej Karpathy no No Priors
>>> Economia da Atenção por João Cezar de Castro Rocha
>>> Pablo Marçal por João Cezar de Castro Rocha
>>> Impromptus de Schubert por Alfred Brendel
>>> Karajan regendo a Pastoral de Beethoven
>>> Eric Schmidt, fora do Google, sobre A.I.
>>> A jovem Martha Argerich tocando o № 1 de Chopin
Últimos Posts
>>> O jardim da maldade
>>> Cortando despesas
>>> O mais longo dos dias, 80 anos do Dia D
>>> Paes Loureiro, poesia é quando a linguagem sonha
>>> O Cachorro e a maleta
>>> A ESTAGIÁRIA
>>> A insanidade tem regras
>>> Uma coisa não é a outra
>>> AUSÊNCIA
>>> Mestres do ar, a esperança nos céus da II Guerra
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Risca Faca, poemas de Ademir Assunção
>>> O Cabotino reloaded
>>> Anzol de pescar infernos, de Ana Elisa Ribeiro
>>> Internet 10 anos – 1996
>>> O Leão e o Unicórnio
>>> Serviço de Aviltamento do Consumidor
>>> Amazon! Google! Help me!
>>> A aposentadoria anunciada de Steve Ballmer, sucessor de Bill Gates
>>> Solidão Moderna
>>> Um Daumier no MASP
Mais Recentes
>>> Introduction to the Reading of Lacan - the Unconscious Structured de Joel Dor pela Jason Aronson (1997)
>>> A Ladeira Da Saudade de Ganymédes José pela Moderna (1983)
>>> The Evolution of Psychoanalysis - Contemporary Theory and Practice de John Gedo pela Other Press (1999)
>>> Essais Sur La Théorie de La Science de Max Weber pela Plon (1965)
>>> Jacques Lacan de Anika Lemaire pela Routledge & Kegan Paul (1982)
>>> Livro Identidade Juventude E Crise de Erick H Erikson pela Guanabara (1987)
>>> Leer Es Resistir de Mario Mendoza pela Edito Planeta (2022)
>>> Perestroika de Mikhail Gorbachev pela Best Seller
>>> Dinos do Brasil de Luiz E. Anelli pela Peiropolis (2021)
>>> Frida de Jonah Winter pela Cosac & Naify (2009)
>>> Como e Por Que Ler Os Clássicos Universais Desde Cedo de Ana Maria Machado pela Objetiva (2002)
>>> Vicky de Helena Lima pela Lago de Historias (2017)
>>> Entre Sonhos e Dragoes de Adriana Carranca pela Companhia das Letrinhas (2022)
>>> Mais Felizes do Que Sempre de Helena Lima; Anabella Lopez pela Lago de Historias (2016)
>>> O Pequeno Livro do Charuto de Marvin R. Shaken pela Dba (1997)
>>> Amal e a Viagem Mais Importante da Sua Vida de Carolina Montenegro pela Caixote (2019)
>>> As Incriveis Aventuras de Nirobe na Terra do Não de Janine Rodrigues pela Piraporiando (2021)
>>> Dictionnaire de la Civilisation Égyptienne de Georges Posener pela Fernand Hazan (1959)
>>> Um Filme é um Filme - o Cinema de Vanguarda dos Anos 60 de Ruy Castro; José Lino Grünewald pela Companhia das Letras (2001)
>>> Teoria da Musica de Bohumil Med pela Musimed (1986)
>>> Livro Einstein Reflexões Filosóficas de Irineu Monteiro pela Martin Claret (1988)
>>> Livro Macmillan Essential Dictionary For Learners of English Com CD de Macmillan Education pela Macmillan (2003)
>>> Contos de Dinossauros de Ray Bradbury pela Ofícios (1993)
>>> Tributação da Economia Digital de Tathiane Piscitelli pela Revista dos Tribunais (2018)
>>> Direito Penal Ilustrado Parte Geral -2 Livros de Denise Cardia Saraiva pela Ediçoes Ilustradas (2000)
COLUNAS

Terça-feira, 14/10/2014
150 anos de Miguel de Unamuno
Celso A. Uequed Pitol
+ de 3000 Acessos

Em artigo publicado no jornal argentino La Nación em 1922, o italiano Giovani Papini colocava o escritor espanhol Miguel de Unamuno em companhia ilustre. Para ele, o autor de Vida de Dom Quixote e Sancho era para seu país o mesmo que Fichte, na Alemanha, e Carlyle, na Grã-Bretanha: um verdadeiro "apóstolo espiritual" da pátria. E não foi o primeiro elogio que direcionou a Unamuno: já havia publicado artigo sobre ele em sua revista, Il Leonardo, onde qualificava-o como um dos principais nomes do pensamento europeu daquele momento.

Tudo isto disse um entusiasmado Papini naquele momento. E foi com entuasiasmo semelhante que hoje, 30 de setembro de 2014, quando se comemora os 150 anos de nascimento do grande escritor, muitos jornais de língua espanhola disseram algo parecido de Unamuno. "Um mestre", "pensador chave", "nome de maior altura filosófica", "paradigma de intelectual comprometido", dentre tantos outros elogios distintos que têm em comum o fato de colocarem-no em cima de um púlpito, a falar às multidões lá embaixo.

Há muitos elogios a se fazer a Unamuno. Foi precursor do existencialismo, foi leitor de Kierkegaard de primeira hora (leu-o em dinamarquês), foi talvez mesmo, como disse Borges, o maior escritor em língua espanhola de seu tempo. Mas os elogios de mestre, sacerdote e apóstolo espiritual, proferidos por Papini há quase um século, e muitos outros há quase uma semana, ele dificilmente os merece.

Não me é fácil negar um elogio a Unamuno. Para mim, don Miguel faz parte daquele grupo seleto de autores que levamos para toda a vida em nosso cânone pessoal, visitando-os periodicamente para leituras e releituras. Tem sido assim desde que o descobri, ao entrar na universidade, através das "Obras Completas" editadas pelas Escelicer, cujos nove volumes tomei emprestado diversas vezes. Li todos os seus principais livros - Del sentimiento trágico de la vida, Vida de Don Quijote y Sancho, La agonía del cristianismo, Paz en la guerra, Niebla - e também seus textos jornalísticos, seus diários de juventude, seus relatos de viagem (Por tierras de Portugal y España segue sendo o melhor livro de viagens que li até hoje) e suas páginas de crítica literária. Aprendi muito de todos eles: aprendi, inclusive, o idioma castelhano, que Unamuno manejava como ninguém, e através dele conheci outros nomes do pensamento e das letras hispânicas que foram objeto de sua mirada. E, sobretudo, tornei-me um interessado no seu tema central, o da agonia do homem (no sentido original, do grego "agon", "luta"), da luta entre a razão e a vida na busca pela imortalidade. Repito: devo muito a Unamuno para negar-lhe um elogio. Mas sou obrigado a tal: não vejo neste homem de quem tanto aprendi um líder espiritual, sacerdote ou qualquer outro destes títulos.

Comigo parece concordar o grande Julián Marías, um dos maiores pensadores espanhóis do século passado e autor de um excelente ensaio sobre Unamuno, para quem ele "no era sólo un genial escritor, un intelectual, un profesor de lengua griega en Salamanca, sino, ante todo, una persona, un hombre de esos con los que es forzoso contar, que están ahí viendo las cosas y hablándonos de ellas, sobre todo, viviéndolas con los demás". Algo natural, para quem, como ele, só entendia o "hombre de carne y hueso" e não as coletividades abstratas, as massas e os públicos lá debaixo do palco.

Por isso, ainda que reitor da Universidade da Salamanca, ainda que professor de filologia durante décadas, ainda que intelectual autorizado, a verdade é que o púlpito não caia bem a Unamuno e o papel de grande mestre nacional não lhe servia. Servia, claro, a Fichte, o homem que subia em caixotes de madeira diante do povo para pronunciar seus discursos à nação alemã; servia, também, a Carlyle, que sempre se imaginou um reformador social. Estes foram educadores, sacerdotes, homens de púlpito. O papel de educador da nação espanhola não coube a Unamuno: seria assumido poucos anos depois por José Ortega y Gasset, um dos maiores responsáveis pela definitiva integração da Espanha à cultura europeia. Filósofo, professor de metafísica da Universidade de Madrid e jornalista militante, Ortega foi um grande renovador do ambiente cultural peninsular (e também latinoamericano) com as principais novidades em ciências humanas daquele tempo, das quais a sua Revista de Occidente foi um autorizado veículo e seus ensaios, escritos num estilo claro e elegantíssimo, atraíam todo tipo de leitor culto, especialista ou não, para o mundo do pensamento.

Não é certo colocar os dois lado a lado, e eles nem gostariam disso. Unamuno deplorava o que classificava como "pedanterias kantianas" de Ortega. Este, como a confirmar o que dele pensava Unamuno, disse que não dominava o castelhano como um nativo pelo fato de ser vasco e que por isso seu texto tinha defeitos de estilo típicos de quem aprendeu o idioma, e não o sentiu desde cedo - um grave e absurdo insulto. E quando Ortega assumiu, em 1910, a cadeira de metafísica, Unamuno felicitou-o da seguinte forma: "A Pepe Ortega dale la enhorabuena y dile que si no le escribo directamente es porque no tengo nada objetivo que decirle, y no quiero molestarle con mis arbitrariedades y querellas. Que Dios, el Dios del engaño, le dé luces y fuerzas para engañar a sus discípulos con la filosofía e infundirles la suprema ilusión" . Estas, definitivamente, não são palavras de quem se imagina um educador de um povo.

Por isso, em carta de resposta ao seu admirador Papini, Unamuno saúda a simpatia do italiano da seguinte forma: "Hay una red invisible que une a todos los solitarios que desparramados por el mundo vamos en busca del sobre-mundo, de otra vida con raíces en la eternidad y copa en el infinito. Siento en torno mío voces lejanas de hermanos ignorados; el cielo de este principio de siglo está preñado de aurora". Como poucos soube colocar-se junto ao leitor - não pelo expediente mais fácil, que seria o de simplificar sua linguagem para chegar ao nivel do leitor médio, mas sim, de outra forma, superior: considerar que ele e o leitor, sendo homens, são seres em luta, em busca da imortalidade, em verdade companheiros de caminho, o que está consubstanciado no seu belo prólogo da Vida de Don Quijote y Sancho que emociona a qualquer um:

"Te consume, mi pobre amigo, una fiebre incesante, una sed de océanos insondables y sin riberas, un hambre de universos, y la morriña de la eternidad. Sufres de la razón. Y no sabes lo que quieres. Y ahora, ahora quieres ir al sepulcro del Caballero de la Locura y deshacerte allí en lágrimas, consumirte en fiebre, morir de sed de océanos, de hambre de universos, de morriña de eternidad. Ponete en marcha, solo. Todos los demás solitarios irán a tu lado, aunque no los veas. Cada cual creerá ir solo, pero formaréis batallón sagrado: el batallón de la santa e inacabable cruzada."

Unamuno, o reitor, professor, jornalista, escritor, mestre, gênio, caminhou ao nosso lado e falou a cada um de nós em meio ao caminho a que empreendemos. Não a todos os seus leitores: a cada um deles. Eis aí, nesta capacidade única, partilhada por muito poucos, a razão pela qual sua obra permanece conosco ainda hoje, 150 anos após o seu nascimento.


Celso A. Uequed Pitol
Canoas, 14/10/2014

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Os bigodes do senhor autor de Renato Alessandro dos Santos
02. Tecnossauros rex de Ana Elisa Ribeiro


Mais Celso A. Uequed Pitol
Mais Acessadas de Celso A. Uequed Pitol em 2014
01. Miguel de Unamuno e Portugal - 12/8/2014
02. Entrevista com Dante Ramon Ledesma - 9/9/2014
03. A vida exemplar de Eric Voegelin - 10/6/2014
04. Ler Oswald Spengler em 2014 - 25/3/2014
05. Émile Zola, por Getúlio Vargas - 6/5/2014


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Cândido Portinari a Vida dos Grandes Brasileiros
Editora Três
Três
(2003)



Livro Literatura Estrangeira O Príncipe Coleção Grandes Obras do Pensamento Universal
Maquiavel
Lafonte
(2017)



Laberintos de Lo Cotidiano
Federico Sanri
Federico Sanri
(1998)



As Regras da Inovação
Davilae Epsteine Shelton
Bookman
(2006)



Um Hotel na Esquina do Tempo
Jamie Ford
Agir
(2012)



Livro Metodologia do Ensino de Geografia
Maria Eneida Fantin , Neusa Maria Tauschek
Intersaberes
(2013)



O Bau E A Serpente
Amilcar Doria Matos
Bagaço
(1994)



Dialectica e Sociologia
Georges Gurvitch
Publicacoes Dom Quixote
(1971)



Brunner e Suddarth - Tratado de Enfermagem Médico-cirúrgica - 2 Vol.
Kerry H. Cheever; Janice L. Hinkle
Gen Guanabara Koogan
(2016)



A História de um Buscador
A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada
The Bhaktivedanta Book Trust
(2022)





busca | avançada
41875 visitas/dia
1,9 milhão/mês