Horizonte perdido | Elisa Andrade Buzzo | Digestivo Cultural

busca | avançada
68515 visitas/dia
2,1 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Nouveau Monde
>>> Agosto começa com música boa e grandes atrações no Bar Brahma Granja Viana
>>> “Carvão”, novo espetáculo da Cia. Sansacroma, chega a Diadema
>>> 1º GatoFest traz para o Brasil o inédito ‘CatVideoFest’
>>> Movimento TUDO QUE AQUECE faz evento para arrecadar agasalhos no RJ
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Two roads diverged in a yellow wood
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
Colunistas
Últimos Posts
>>> As Sete Vidas de Ozzy Osbourne
>>> 100 anos de Flannery O'Connor
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Não contem com o fim do livro, uma conversa com Umberto Eco
>>> Sem música, a existência seria um erro
>>> Realeza
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> A felicidade, segundo Freud
>>> As deliciosas mulheres de Gustave Courbet
>>> A arte contemporânea refém da insensatez
>>> O turista imobiliário
>>> O assassinato e outras histórias, de Anton Tchekhov
>>> Choque de realidade no cinema
Mais Recentes
>>> Discover Costa Rica (full Color Country Travel Guide) de Matthew Firestone pela Lonely Planet (2010)
>>> Batman - O Que Aconteceu Ao Cavaleiro Das Trevas? de Neil Gaiman; Andy Kubert pela Panini (2013)
>>> Touchstone Level 4a, Student's Book (book & Cd) de Michael Mccarthy, Jeanne Mccarten, Helen Sandiford pela Cambridge University Press (2006)
>>> Terra Friburguense de Décio Monteiro Soares pela Desconhecido (1960)
>>> Todo Mundo Odeia Um Vencedor de Donald John Trump, Charles Leerhsen pela Citadel Grupo Editorial (2019)
>>> As Origens Do Mal - Uma Historia Do Pecado Original de Georges Minois pela Fisicalbook (2021)
>>> Estranhos animais do passado de Roy Chapman Andrews pela Record (1964)
>>> Conserto Para Uma Alma Só de Luiz Antonio Gasparetto pela Vida e Consciência (2008)
>>> O Caminho Dos Currais Do Rio Das Velhas. A Estrada Real Do Sertao. de Eugenio Marcos Andrade Goulart pela Coopmed Cooperativa Médica (2009)
>>> Desenvolvimento E Conflitos Ambientais de Seminário André Zhouri , Klemens Laschefski pela Ufmg (2010)
>>> Minha História de Michelle Obama pela Objetiva (2018)
>>> Black magick Vol. 1: O primeiro livro das sombras de Greg Rucka pela Mythos (2023)
>>> Uma Pausa Para O Espírito de Lídia María Riba pela Vergara (2025)
>>> Como Chegar Ao Sim: A Negociação De Acordos Sem Concessões de Roger Fisher pela Imago (1994)
>>> O Diário De Suzana Para Nicolas de James Patterson pela Arqueiro (2011)
>>> Oppenheimer: O Triunfo E A Tragédia Do Prometeu Americano de Kai Bird pela Fisicalbook (2023)
>>> Probabilidade, Variaveis E Processos Estocásticos de José Paulo de Almeida e Albuquerque , José Mauro Pedro Fortes, Weiler Alves Finamore pela Interciência e Editora PUC Rio (2008)
>>> Eu Sou Malala: como uma garota defendeu o direito à educação e mudou o mundo de Malala Yousafzai, Patricia McCormick pela Seguinte (2018)
>>> Tecnologia Da Indústria Do Gás Natural de Célio Eduardo Martins Vaz, João Luiz Ponce Maia, Walmir Gomes dos Santos. pela Edgard Blucher (2008)
>>> Perfuracao Direcional de Luiz Alberto Dos Santos Rocha , Denise Azuaga, Renata Andrade, João Luiz Bastos Vieira, Otto Luiz Alcântara Santos pela Interciência (2011)
>>> Working with emational intelligence de Daniel Goleman pela Bantam books (1998)
>>> Fundamentos De Engenharia De Petróleo de Jose Eduardo Thomas pela Interciência (2025)
>>> Quimica Organica - Combo de John Mcmurry pela Cengage Learning (2008)
>>> Acerto De Contas de Marcelo Cezar pela Academia (2018)
>>> O consolador orlo edpirito de Emmanuel de Francisco Cândido Xavier pela Fed.espírita Brasileira
COLUNAS

Quinta-feira, 27/7/2006
Horizonte perdido
Elisa Andrade Buzzo
+ de 5300 Acessos
+ 4 Comentário(s)


foto: Sissy Eiko

Aqui na cidade sinto falta de uma linha de horizonte, de uma natureza exagerada, arrebatadora, saída de romance indianista. Sentir em desabrigo a fúria de uma tempestade, sem toda essa parafernália que a vida urbana proporciona. Ou restringe. Não esquecer que afinal não há nada acima da cabeça (ainda que o teto do apartamento crie a ilusão de abrigo), apenas o todo e vazio negro. E a única proteção concreta é a das mãos em reflexo. Ver a lua, lembrar que somos mais um ponto (pálido?), sondar os mistérios do universo.

Sou toda urbana, distanciada de mim mesma. A urbe é bell jar de Sylvia Plath, arcaica abóbada celeste medieval - mas o céu aqui nem é abaulado, são pontas de ferro empinadas de orgulho paulistano pela riqueza e altura gratuitas. Pontas de lança. Pontas que já espetam. Vaidade vazia.

Na busca por um traço de céu, procuro alguns dos edifícios mais altos da cidade para clarear meus olhos míopes. Enxergar as cidades devastadas dentro dessa metrópole que vai se demolindo e se reerguendo a cada piscar de olhos. Haverá algo que eu ainda possa ver da mesma maneira que um habitante de seus primórdios?

Subir os lances da escada ao lado da estação Vergueiro do metrô tirava o fôlego e dava a sensação de que uma altura considerável estava sendo enfim alcançada. No décimo andar de um prédio comercial na Praça Santo Agostinho, beber água no final do expediente era um pretexto para comer minha fatia diária de céu. Tudo cinza, começando a resplandecer, era o que as grandes janelas de vidro diziam. Enquanto o céu anoitecia, a cidade amanhecia num brilho de colar de pérolas. No longe aquele desenho em lápis mole era fixo, calmo; pois a cidade vista assim das alturas é massa amorfa, os problemas parecem menores, os desenganos se amenizam, e mais, os olhos descansam numa sensação de liberdade que apenas a altura proporciona (ou que apenas ver a própria gaiola em amplitude representa).

Vejo uma dama de família quatrocentona apoiando um cálice na mureta ainda pouco cinza de poluição no terraço do Edifício Martinelli. Era um tempo em que os grã-finos circulavam pelo centro da cidade. Ela meneia a cabeça para trás num movimento sensual - pescoço alvo, dentes à mostra, cabelos ao vento - sua risada longínqua e estridente é o som presente de buzinas.

Milhões de murmúrios, lagartos, trânsito, conversas, balões, cobras, juras de amor, tráfico, pactos, pássaros também sobem com o ar quente. O resultado é um zunido incessante e não há mais como dissociar as partes desse todo silenciosamente barulhento. Sinfonia aleatória, doce assim do alto - apenas solta no ar, encontrando o ápice, o invisível cálice.

O ambiente do terraço, a 30 andares acima da terra firme é propício para declarações contundentes, comícios, atos grandiosos. Hoje seguranças acompanham os visitantes ao local, ainda que ninguém mais vá até lá com segundas intenções, a não ser em busca do mágico horizonte, da visão aérea privilegiada: corpo nu de mulher estendido é a cidade ao norte sul leste oeste. Enfim poder visualizá-la até onde a vista alcança, e então pontilhar a retina do perdido que sempre fora visto. Nem chego perto da sacada, o máximo que faço é apoiar as mãos e resistir ao "venha", bala puxa-puxa lançada pela mulher.

Como hoje alguém se arriscaria ao embalo dos andares-nuvens se a queda é inevitável e o tempo presente não tem a maciez da nostalgia?

Um lugar garantido no Paraíso pode ser tão direcionado às classes mais robustas quanto na época da venda de indulgências. Haveria local melhor para satisfazer meu intento de contemplar a linha de São Paulo do que o edifício mais alto da cidade? 46 andares. Plantado na beleza sombria e folhuda da Avenida Ipiranga desde 1965. Edifício Itália. Pois eu não contava com a rápida ação da hostess; é necessário completar uma chique e cara refeição (a tal indulgência versão descarnadas-asinhas-de-codorna-no-buffet) num restaurante para ter acesso à vista, ao firmamento mais badalado e menos público da cidade. Nem tão bonito assim, devo dizer...

Vê-se o milagre do concreto despontando pelas ruas em repentina miniatura. Finos canais aonde os autos percorrem, num também milagroso senso de direção diante de tantos caminhos-serpentina possíveis. É de cima que se vê o labirinto armado, que se avista o esqueleto do fura-fila com pernas magras, desajeitadas. Inúteis.

Bonito mesmo é aquele horizonte que surge ao motorista, numa das retas do Minhocão, em final de tarde como névoa tremelicante de luzes ou, nas noites claras, fantasma inalcançável. O edifício Altino Arantes tem carne, osso e uma linda bandeira, que embora à distância seja diminuta, olhando-a diretamente do mirante do edifício, é enorme, flutuante. E os movimentos do pano em dobras se sobrepõem ao ruído de fundo da cidade no acontecer diário. A bandeira do Estado de São Paulo pesa muito assim hasteada sobre 11 milhões de cabeças.

E é do Prédio do Banespa que surgem, como última cerca de natureza exuberante, montanhas marrons, negras, azuis. Antiga fortaleza de São Paulo de Piratininga.


Elisa Andrade Buzzo
São Paulo, 27/7/2006

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Do amanhecer ao adormecer: leitura, ato de amor de Marcela Ortolan
02. Autodidatas e os copistas da vez de Carla Ceres
03. A aventura de educar os filhos de Alessandro Garcia


Mais Elisa Andrade Buzzo
Mais Acessadas de Elisa Andrade Buzzo em 2006
01. Mia Couto revisitado - 14/9/2006
02. Novos autores na poesia brasileira - 18/5/2006
03. FLAP! Uma bofetada na indiferença* - 10/8/2006
04. As crianças cheirando cola - 7/12/2006
05. Qual é o seu departamento? - 26/10/2006


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
27/7/2006
00h40min
O que dizer de um texto tão belo?
[Leia outros Comentários de Rafael Rodrigues]
28/7/2006
02h39min
Isso é quase um poema, esse texto. Li, atras dessa reflexão algo melancólica, calma e densa, um poema de amor pela cidade de São Paulo. Conheço muito pouco mas, depois de um texto desses, me sinto quase íntimo da cidade. A maturidade dos sentimentos expressos aqui faz crer que São Paulo é muito mais rica do que imaginamos. Nada da velha ladainha da "cidade grande e desumana" e sim o contrário, transformar uma cidade enorme numa coisa humana, tão humana quanto o sentimento que ela, a cidade, pode provocar em pelo menos um de seus habitantes, no caso a autora. Elisa, repetindo o que o Rafael Rodrigues já disse: o que dizer (mais) de um texto tão belo?
[Leia outros Comentários de Guga Schultze]
28/7/2006
11h58min
"e o tempo presente não tem a maciez da nostalgia?": sinto como se ela fosse macia demais... a se esfacelar. como se não a tivesse por a ter em outras vias. ótimo, tudo.
[Leia outros Comentários de Eduardo Lacerda]
28/7/2006
17h03min
Elisa... é incrível como o paulistano não enxerga a beleza-feiúra desta cidade (será que não?). Esta gaiola de cinzas que nos torna presos e que atordoa... e, no entanto, pode-se voar, de alguma forma. Esta cidade... eu amo e odeio tanto... Mas só consigo ficar perplexo ante a beleza deste texto, assim como eu, com meus 32 anos vividos aqui, ainda fico perplexo com a cidade.
[Leia outros Comentários de Alessandro de Paula]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Livro Administração Squawk! Pare de Fazer Barulho e Resolva Uma História Sobre Como Aprender as Três Virtudes da Grande Lidernaça
Travis Bradberry, Ph. D.
Gente
(2010)



Livro O Constante Correr Das Horas
Justin Go
Intrínseca
(2015)



Die Nutzpflanzen Unserer Kolonien
D. Westermann
Dietrich Reimer
(1909)



O Meu Próprio Negócio
Rogerio Chér
Negócio
(2002)



Livro Filosofia Essência e Existência
Scolnicov Samuel
Associação Universitária da Cultura
(1994)



A Ditadura Derrota
Elio Gaspari
Companhia das Letras
(2003)



Livro A Dieta Da Preguiça
Helena Alves de Carvalho Sampaio
Outras Palavras
(2009)



Livro Infanto Juvenis Retrato da Arte Moderna
Kátia Canton
Wmf Martins Fontes
(2002)



A Revolta Dos Bichos
Mykola Kostomarov
Ercolano Editora
(2024)



Os Grandes Líderes - João Xxiii
Mylton Severiano Ribeiro
Nova Cultural
(1988)





busca | avançada
68515 visitas/dia
2,1 milhões/mês