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Quarta-feira, 26/11/2014
É Tabu, Ninguém Quer Saber
Marilia Mota Silva
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Na saída do metrô, no centro do Rio, um menino de uns doze anos sentava-se todos os dias, com uma criança nos braços, uma menina esquelética, cor-de cera, com olhos semi-abertos, embaçados. Parecia morta, não reagia se tocada, mas vivia, respirava. Vê-los ali, todas as manhãs, doía até nos ossos.

As pessoas paravam, ofereciam dinheiro, comida, roupas, conselhos. O menino recebia as doações. Respondia com evasivas às perguntas que lhe faziam. No outro dia, a mesma cena, o menino suplicante, o bebê amarelo, vestido com trapos, os olhos mortos, a pele emaciada. Não sei como conseguiram manter a criança naquele estado de agonia, por tanto tempo. Não era bem um bebê. Era como uma criança que parou de crescer aos seis, sete meses.

Um dia perguntei aos colegas, no trabalho, se tinham visto essas crianças, na saída do metrô. Sim , disse um, eles alugam essas crianças, você sabe. Não devem nem ser irmãos.

Insisti no assunto: tinha que haver um jeito de ajudar crianças como essas! Um prefeito, uma Secretaria da Saúde que enviasse assistentes sociais. Um trabalho sério, tinha certeza, atrairia voluntários de toda parte. Antes de tudo seria preciso identificar pai e mãe de cada criança encontrada nas ruas, nos sinais, trabalhando à noite. E ligar as trompas e fazer vasectomia nessas pessoas. Com a concordância deles. Devia haver uma lei que autorizasse a esterilização de toda mulher e todo homem que abandonasse os filhos ou que os explorasse desse jeito!"

Meu colega pulou da cadeira: Mas isso é uma violência, Marilia! Você gostaria que fizessem isso com você?

Sim, gostaria! Tanto que fiz! Paguei para fazer. Para não ter mais filhos do que queria ter; para criar bem as que tinha, com os recursos, tempo e energia emocional de que dispunha.

Acho uma violência, ele repetiu!

E o que acontece com essas crianças não é violência? Não é crime?

Afinal, eu não estava falando em castração ou cadeia. Vasectomia e laqueadura evitariam que crianças fossem jogadas no mundo para uma vida de miséria e abandono. Teríamos condições de cuidar melhor das que já estão nas ruas.

O colega sacudia a cabeça, ultrajado em sua retidão. Convencido do pátrio direito à irresponsabilidade. Incapaz de pensar nas crianças, .

Isso faz quase trinta anos. Agora, outro dia, li no Facebook, o desabafo de uma jovem pediatra, Patricia Mota Oliveira, que me trouxe de volta, com uma nitidez doída, a imagem daquelas duas crianças, e o mesmo sentimento de fracasso, de angústia.

Meu Deus, o que podemos fazer para dar um jeito nisso !!! Não aguento mais receber recém-nascidos filhos de usuárias de crack...são mulheres sem auto-estima,obcecadas pelo vício. Possuem 5,6,7,8 ...11 filhos. Na sua maioria moradoras de rua. Não se importam em sair do hospital e deixá-los para trás. Nao possuem nem mesmo o instinto mais primitivo dos mamíferos que é o instinto materno. Será que seria desumano laquear essas pacientes? Nao seria desumano deixar que esses seres descontrolados que vivem como zumbis coloquem no mundo crianças e mais crianças sem amor, sem o mínimo de educação e com diversas limitações ? Onde fica a proteção da criança ? Qual vai ser o nosso futuro? Como podemos acabar com isso?

Essas perguntas repercutem profundamente na maioria de nós, acredito. Impossível viver em paz, sabendo que há crianças nas ruas, sem a menor chance na vida. Conversei com amigos sobre o assunto.

Primeiro seria preciso dar oportunidade social a todos eles, aquelas coisas de sempre, trabalho, escola, tratamento, dignidade, disse um deles.

Mas não se trata disso. Estamos falando do que está acontecendo agora, de orfanatos superlotados, crianças nas ruas, que os pais abandonaram, pais que já tiveram outros filhos e os deixaram.

Outro amigo disse: E por que esterilizar quem está roubando pelas ruas e não os que estão nos roubando nas mansões? Por que eles tem como sustentar os filhos?

De novo, confundiram tudo. Ninguém vai esterilizar quem está roubando pelas ruas. Nem nas mansões. Roubar não gera filho!

Deixa isso de lado, me disseram ainda, é um tabu, ninguém quer saber.

Conversei com a médica autora do desabafo, e pedi-lhe mais detalhes sobre sua experiência, seu ponto-de-vista, citando os argumentos que tinha ouvido. Ela respondeu:

Uma pessoa que usa crack tem uma chance muito pequena de cura. Eles são considerados doentes mentais tanto é que quando internados ficam no setor da psiquiatria.
Nao possuem a mínima condição de cuidar de outro ser humano. Nao estamos falando de esterilizar quem está roubando mas de proteger as crianças de uma "família" que nao tem a mínima estrutura para cuidar e protegê-los.
Essas pessoas moram na rua, a maioria delas sem parceiro fixo, agem por impulso e movidas pelo crack.
Nao falo de mutilação e esterilização dos pobres. Estou analisando o lado do recém-nascido que com certeza terá sequelas em todos os sentidos .
No hospital em que estou agora todos os dias nasce pelo menos um bebê filho de mãe usuária de crack. Enquanto elas estão internadas algumas até mostram o desejo de parar de usar mas é só receberem alta que retornam para a rua e para as drogas. Fiz amizade com a Celina, 42 anos e 11 filhos.
Nenhum estava com ela. Ela é uma mulher muito boa, se expressa muito bem, teve várias chances de sair das drogas e não conseguiu. Ela realmente sabia quanto mal tinha feito a seus filhos, inclusive matou um deles ao dormir sobre ele depois de usar drogas.
Conversei bastante com ela durante os 2 meses em que ficou internada; ela lia muito e atraia a atenção dos outros pacientes devido aos seus conhecimentos,vivência e carisma.Visitava seu bebê na UTI todos os dias. Recebeu alta e se recusou a ir para uma clinica de tratamento, garantindo que iria se cuidar. Retornou alguns dias depois, espancada pelo companheiro. Mais uma vez conversei com ela, e conseguimos novamente a clínica, mas ela preferiu voltar para a rua. E deixou o seu bebê...
Não é falta de oportunidade social.
O crack é o fim da linha.
Pode ser fruto da desigualdade social, miséria, desamor, falta de educação, embora o vício esteja longe de ser restrito aos pobres, como todos sabemos.
Logo no inicio quando acompanhava a Celina um enfermeiro que trabalhava no setor da psiquiatria me dizia para eu não me iludir pois ele nunca tinha visto nenhum dos pacientes abandonar as drogas.
A visão de quem diz que tudo isso é simplesmente falta de oportunidade,é a visão de quem não lida diretamente com o situação. Essa era a minha visão também, bastante ingênua, quando não se está em contato com a realidade.
A Celina pediu para fazer laqueadura.
Elas querem, em sua maioria. Não seria feito contra a vontade delas. O problema é o excesso de burocracia. São necessárias várias reuniões com psicóloga, médico, assistente social, acompanhamento no posto de saúde e participação das orientações sobre planejamento familiar.
Que família ? Que planejamento?
Nao se trata de fazer algo escondido e/ ou imposto. Será que 11 filhos, todos longe da mãe, nao seriam uma razão?
Nenhuma delas tem 1 ou 2 filhos somente. Nenhuma delas cuida do seu próprio filho. Não é proibir o pobre de ter filho. É dar à pessoa que não quer a responsabilidade de ter filhos, que não consegue nem cuidar de si mesma, o direito de não ter esses filhos, que ela irá abandonar, como fez antes.



Menos burocracia. Menos indiferença ao sofrimento das crianças, é disso que se trata. E a vasectomia, um procedimento simples, menos invasivo, mais barato e reversível, deveria ter prioridade no tratamento desse problema. Quando se trata de reprodução, todos se esquecem que a mulher não gera filhos por mitose.

Nascem crianças destinadas ao abandono todos os dias. Não há ninguém por elas. Ninguém as protege. E temos responsabilidade nisso, como sociedade.


Marilia Mota Silva
São Paulo, 26/11/2014

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