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Segunda-feira, 8/1/2018
Blog de Fabiano Leal
Fabiano Leal
 
Trump e Jerusalém

Bastou um golpe de caneta, para o presidente dos EUA, Donald Trump, consumar o inconsumável: reconheceu formalmente Jerusalém como capital de Israel; assinalando uma mudança sem precedentes da política externa americana para o Oriente Médio. A decisão vem se somar a outras já tão comuns em nosso contexto de recrudescimento do nacional-populismo em que a política se move por apelos subjetivos, sendo por esse motivo, promessa certa de mais instabilidade não só na Palestina, mas em toda região.

O cerne da questão remonta ao Plano de Partição da ONU de 1947. Na esteira da fundação do estado israelense, esse plano previa a divisão da Palestina histórica entre judeus e árabes. Desse modo, Jerusalém seria colocada sob soberania internacional em face de sua importância religiosa para as três religiões abraâmicas. Porém, com a eclosão da Guerra árabe-israelense de 1948, em que Israel se sagrou vitoriosa, precipitou a ocupação do lado ocidental e a declaração deste como território do estado.

Já a outra metade oriental foi anexada em 1967, após outro conflito militar, agora contra a Síria, Jordânia e Egito, ocorrido após a escalada da tensão entre árabes e israelenses nos anos seguintes a Crise do Canal de Suez, em que Israel atuou preventivamente contra o considerava ser clara ameaça a sua existência, desfechando um ataque a posições árabes nas colinas de Golã e na Península do Sinai. A resposta da comunidade internacional veio através da ONU que, por meio da Resolução 242, não cumprida por Israel, determinava retirada dos territórios ocupados. No início da década de 80, Israel, por sua vez, viria aprovar a Lei de Jerusalém; que estabelecia uma “Jerusalém completa e unida como capital de Israel”, ato que mereceu novamente pronta resposta do Conselho de Segurança da ONU, desta vez pela Resolução 478, que sustou os efeitos da referida Lei. Desde então, esse é o cenário que fez de Jerusalém o ponto de tensão permanente na solução do conflito palestino-israelense.

Mas o verdadeiro campo em que o drama se desenrola é dos direitos humanos. O tema aqui é o não reconhecimento à dignidade a que todos os palestinos têm direito: negação solene de uma sociedade legítima, porque fundada na visão liberal de um estado democrático moderno, radicado na existência de um contrato social entre iguais e recíproco, ou seja, plena realização do ideal cristão de liberdade e igualdade humana universal. Assim, alguns pretensos “liberais” deveriam ter mais cuidado ao comemorar tão entusiasticamente a decisão de Trump. Pois, se esquece facilmente que a anexação de Jerusalém Oriental se deu a contrapelo às normas do direito internacional. Uma vez que potência ocupante jamais detém soberania sob o território por ela ocupado. Não sendo possível ignorar os cerca de 420.000 palestinos que não possuem cidadania israelense; reféns de um limbo legal que os faz verdadeiros apátridas no solo em que nasceram, sendo forçados a cumprir um conjunto de requisitos sem os quais a condição de residente pode cassada.

O quadro de arbítrio é agravado pela política de assentamentos. Essa política tem como finalidade precípua a consolidação paulatina do controle de Israel sobre a cidade, violando diretamente a Quarta Convenção de Genebra que proíbe que um país ocupante transfira sua população para as áreas que ocupa. E existem boas razões para isso, como evitar a presença em longo prazo por meio de força militar, proteger os civis sob ocupação da subtração de recursos e frear qualquer tentativa de apartheid que leve a mudanças da composição populacional. Porém, o que Israel tem feito desde 1967 foi construir mais de uma dúzia de assentamentos, alguns situados no coração dos bairros palestinos. Com isso, há 200 mil cidadãos israelenses, aproximadamente, vivendo em Jerusalém Oriental sob proteção de forças policiais e militares que, para manter a ordem violam direitos como a liberdade de ir e vir dos palestinos.

A realidade de Israel é uma só: a garantia de cidadania aos israelenses se faz as expensas da violação dos direitos do povo palestino. Trata-se de uma deplorável fuga ao reconhecimento de que todos são iguais perante a Lei. Prevalecendo a forma restrita que conhecemos hoje, decorrente da concessão de privilégios a determinadas parcelas da sociedade, tendo por distinção seja a identidade nacional, racial, étnica ou religiosa. Nessa conduta, o reconhecimento confinado à identidade de grupo, só pode ser o que sempre foi: irracional; pouco importando seus pressupostos particularistas, pois estes não são naturais, mas sim um constructo cultural.

A racionalidade está mesmo é ao lado do estado liberal. Pois este é o único capaz de assegurar a mútua aceitação, em função de a base de identidade do individuo se fundamentar no ser humano enquanto tal. O estado liberal, simplesmente, é aquele que garante a cidadania a todos – um contexto do qual Israel, obviamente, está a léguas de distancia. Já que não é um estado universal e homogêneo apregoado pelo liberalismo, garantia de um amplo conjunto de direitos políticos, econômicos e sociais, que confere a cada indivíduo a efetiva liberdade de escolha, isto é, de serem senhores de si mesmos e devotados à livre participação nas grandes decisões públicas. Em Israel, o reconhecimento de reciprocidade legítima, – fundada na dinâmica onde um estado assegura os direitos dos indivíduos e estes concordam em obedecer às Leis –, não só está ausente, como implica em uma ameaça maior: que é retroceder a paisagens anteriores à modernidade, onde prevalecia a regra que opunha senhores e escravos, condição tantas vezes experimentada pelo povo judeu em sua diáspora histórica.

A verdade é que se Trump fosse afeito aos ensinamentos de Clio, veria imediatamente quão frágil e perigosa pode ser a tomada de decisão unilateral; nesse caso, apoiada somente em aspectos jurídicos. Uma vez que, “Uru-Shalem”, a cidade fundada há cerca de 5.000 anos por “Shalem”, Deus venerado pelos cananeus, nunca esteve sob o domínio de uma única pessoa, povo e muito menos de uma crença. O certo é que, o local ocupado pelo Templo de Salomão, foi outrora um antigo santuário de devoção cananeita, muito antes do surgimento das três religiões monoteístas. De modo que essa natureza ancestral está evidente no uso bíblico do termo “Zion”, que remonta aos cananeus, e significa “colina”; palavra empregada frequentemente para se referir a Jerusalém, o terreno alto em que foi construída a fortaleza que define a atual fisionomia histórica da cidade.

Mais modernamente, lembra ainda o historiador Lorenzo Kamel, cerca de 80% da população vivia em bairros mistos no início do século passado, em que judeus e mulçumanos compartilhavam o mesmo espaço, resultando daí fortes laços de solidariedade social. O que não quer dizer que conflitos inter-religiosos fossem historicamente inexistentes, pois desde a Idade Média confrontos têm sido fartamente registrados. Todavia, o testemunho daqueles que estiveram na Jerusalém sob o jugo do Império Otomano, como do cônsul Britânico James Finn, não deixariam de notar que “existem poucos países no mundo onde, apesar das aparências em contrário, pode-se ver tanta tolerância prática como na Palestina”.

Ainda, a favor dessa longa relação intercultural, Amnon Cohen, nos sugere visão complementar. De acordo com esse dileto scholar, perito no tribunal religioso da Sharia (Lei Islâmica), os judeus, no período compreendido entre 1530-1601, davam preferência aos tribunais islâmicos ao invés de seus próprios. Além disso, a história da Jerusalém otomana indica claramente que os judeus detinham autonomia religiosa e administrativa, o que lhes davam grande papel de destaque na economia. Essas são provas indiretas que, juntamente com outras, vem cada vez mais corroborar a tese de que o fundamentalismo é um resultado inadvertido da modernidade.

Assim, as três grandes religiões monoteístas não estão encerradas em si próprias, mas em constante interação. Uma relação ora mais aberta, ora mais fechada, oscilando irregularmente através do tempo, uma característica que um pensador como Lévi-Strauss divisou ser a natureza das verdadeiras culturas.

Enfim, a história força-nos a reconhecer que reivindicações absolutistas carecem de amparo, cabendo prevalecer o entendimento de que a cidade sagrada deve ser compartilhada entre as três grandes religiões. E nesse caso, o passado pode muito bem fazer a diferença a favor de uma Jerusalém “moderna”. Simplesmente porque nenhum estado liberal pode sobreviver sem recorrer a apelos comunitários compartilhados por todos em algum momento ao longo de sua história.

No que tange as relações exteriores, a decisão de Trump dá margem a arroubos ao invés da meticulosa análise diplomática. Nessa perspectiva, ronda uma perigosa ilusão, a tentativa de reviver a geopolítica da Guerra-Fria e, no que pior, tendo por base o mito do isolacionismo.

Porém, três pontos desmentem tais crenças. Primeiro, a realidade atual não se curvará a vontade de quem quer que seja, retornando ao nível de complexidade do período anterior. O mundo atual é uma configuração emergente, em grande parte moldado pelo passado que se deseja reviver, em que as decisões dos governantes não são única variável, embora sejam de reconhecida importância. Segundo, o isolacionismo é um mito que jamais tivera lugar na política externa americana pós-45, pois o desafio soviético exigia acima de tudo uma formidável capacidade de construir alianças. Essas, por sua vez, são forjadas com vistas a valores, sem as quais possíveis alianças não passam meros agregados disformes. E terceiro, a verdade cabal a respeito de um mundo multipolar é que, além de exigir soluções criativas e inovadoras, esta requer o entendimento essencial que, mesmo a maior das potencias se tornou pequena demais frente aos problemas globais; sendo necessário conceder a outros países o pleno direito de engajamento nessa liderança e, nesse palco, a concertação fala mais alto que a mera vontade unilateral. Todavia, parece que os EUA declinaram do xadrez ou do go, jogos mais próximos de nossa realidade mundial, preferindo, infelizmente, a política da clava, do posso, logo mando. Feita todas as contas, o resultado é que Trump está colocando seu país não em primeiro, mas em último lugar.

A começar pela própria liderança frente ao processo de Paz no Oriente Médio. Uma negociação que demanda uma postura não inclinada a maniqueísmos, caso queira realmente estabelecer uma interlocução viável entre os vários atores envolvidos no conflito. Enquanto a outra fonte presumível de perda liderança advém da primazia do poder militar como esteio de decisões unilaterais. Aqui, os EUA de Trump estão também na contramão da história, porque renuncia ao desenvolvimento de outras dimensões do poder. Uma prerrogativa legitima que, consolidada da força bélica, fornece a uma potência a expressão maior do poder: ser garantidora da paz e não do conflito perpétuo.

Vai se delineando uma perigosa tendência decisória no mundo. A troca sistemática da abordagem paradigmática por outra calcada no mais grotesco voluntarismo. Por sua vez, esse não é um fenômeno isolado, mas um sinal dos tempos, ou seja, da volta dos “Homens de Peito”, que Nietzsche via como modelo de conduta frente à racionalidade liberal a qual deplorava. Essa característica está presente em Trump, se levarmos em conta que sua decisão abdica de qualquer exame mais detido às complexas variáveis que conformam o problema, mirando exclusivamente na satisfação de um grupo de eleitores que vem crescendo cada vez mais, os chamados “cristão-sionistas”; grupos neopentecostais conservadores fortemente imbuídos de uma crença fundamentalista que julgam ser a solução para os males da sociedade moderna.

No entanto, mais que satisfazer uma parcela do eleitorado, essa decisão veio mesmo é animar o espírito conservador, cujo núcleo atual se embrenha através de um cipoal onde várias tradições inventadas concorrem entre si para dar vazão à nostalgia da gemeinschaft. Uma nostalgia que, como observou Hayek, se trata de um anseio totalitário, contrário às democracias liberais, porque se respalda num retorno tão infundado, quanto arcaico aos ditames da solidariedade tribal.

Nesse sentido, a clássica metáfora do “efeito borboleta”, comumente empregada para se referir aos fenômenos relativos ao caos determinístico pode, enfim, ser reescrita: assim, a mensagem proclamada do púlpito de uma igreja evangélica do interior dos EUA pode ser o estopim de conflitos armados do outro lado do mundo.

Desse modo, não foi por menos que a decisão de Trump encontrou eco em segmentos de nossa sociedade. O que só atesta o alcance global do nacional-populismo. Essa ressonância se fez presente no regozijo com que membros de seitas evangélicas reagiram à decisão do presidente americano. A tarefa de pensarmos um movimento político de “direita”, seja lá o que isso possa significar, foi abolida em favor da mais desinibida macaqueação, que é emular o comportamento conservador norte americano, acreditando que com isso chegaremos à vanguarda da modernidade. Quando muito seriamente, estamos apenas promovendo o encontro nada benfazejo de dois monstros, isto é, entre o atraso patrimonial e o fundamentalismo político-religioso.

Uma consequência disso é o desprezo pelo debate democrático. Debate necessário para um arcabouço institucional robusto, responsável por políticas públicas duradouras. Nesse, não há vencedores ou vencidos – não ao menos totalmente; estando todos certos de que em algum momento precisarão renunciar as suas opiniões por outras melhores e advindas de outrem. Esse deveria ser o caminho, mas a voga atual se pauta por posicionamentos unívocos. Por isso, os americanos assistem a algo que nós latinos há muito conhecemos: o desmontar de políticas, ainda que bem sucedidas ou passíveis de revisão e aperfeiçoamento, em nome de um projeto de poder que tem como meta a obstinada eliminação das demais forças políticas.

Assim, a convivência, um elemento chave tão importante para as democracias liberais, tem sido varrida dos nossos horizontes; sobretudo quando se trata do convívio de visões opostas, uma realidade necessária e só alcançada se não nos despojamos da justa tolerância e do gosto pela individualidade. Embora, o que vemos é a preferência pelo isolamento. Não do individuo que se isola buscando entendimento de si. Mas daquele que mergulha na sedutora ilusão da harmonia do grupo, crente em uma bonança que jamais virá e que no fim lhe roubará a ultimo suspiro de independência crítica.

Em outras palavras, a volta desse “ismo” sombrio, o nacional-populismo que, juntamente, com outros vigentes há mais tempo como patrimonialismo – este, um vício tipicamente nosso –, ou como fundamentalismo, – que se fez mais presente nas últimas três décadas –, são alguns dos novos caminhos para a servidão. Uma autêntica catapulta ante a um novo e indesejado ciclo de estatismo e autoritarismo. Afinal, se crer cada vez menos no farol da democracia liberal, cuja luz é a única capaz de nos revelar que a realidade não se passa em preto e branco, mas é modulada por tons variados em que ninguém, absolutamente ninguém, tem a última palavra.
BR> Escrito em 26/12/2017. Solicitação de cópia PDF: [email protected]

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Postado por Fabiano Leal
8/1/2018 às 19h35

 
Por Que Impeachment?

Porque o impeachment não é um golpe como alardeia o governo, mas um antídoto constitucional, decerto extremo, só aplicado aos que insistem em tolher a ordem vigente em nome de interesses particularistas. Para o governo, o impeachment era um recurso destinado a outrem, e não a si próprio. A razão para isso está no fato de o partido se conceber como a verdadeira encarnação da vontade do povo. Sob tal pretensão, repousa a idéia de democracia popular, ou seja, de que ao governo bastaria o apoio dos que lhe concederam o voto. Porém, esta é uma condição necessária, não suficiente; pois nas modernas democracias governa-se para todos e não para um grupo seleto, o que pressupõe uma boa dose de observância às regras do estado de direito. Daí as democracias populares serem uma miragem do ideal democrático que, invariavelmente, se degeneram sob o ímpeto voluntarista da liderança popular. Por isso, vale recordar a sagaz lição de J. G. Merquior, em A "Natureza do Processo" (1983), de que a verdadeira democracia é a liberal, pois só nesta reside à oportunidade de se vivenciar o poder como autoridade, jamais como força ou violência.

Impeachment, porque, além de ser um instrumento legal, o crime de responsabilidade que lhe dá vida, se faz presente. As ditas “pedaladas fiscais”, em que pese o nome simpático, são a marca de um retrocesso. Pois, nelas se esconde o desejo de voltarmos a um estado de desmazelo a respeito das contas públicas, com a finalidade de satisfazer o saudosismo por um nacional-desenvolvimentismo. Trata-se da velha estória de que, para vencermos o subdesenvolvimento, um pouco de inflação não faz mal a ninguém; decorrendo assim a expansão dos gastos públicos, a generosa, mas nem sempre realista desoneração de impostos, o aumento de salários acima das taxas de produtividade e, "last but not least", o controle de preços.

O resultado é que só uns poucos se beneficiam dessa trágica conduta emanada do filantropismo populista, cabendo aos demais pagar a conta, via inflação e/ou aumento de impostos. Eis aí, diria Roberto Campos, a receita para se empobrecer mais rápido. Nisso, reside a mais notável ignorância acerca da interdependência das variáveis, um dos fatores decisivos de nossa complexa vida contemporânea, cuja lição é que não se pode agir arbitrariamente sobre uma variável sem que as demais sejam afetadas. Assim, temos adiado o inadiável, isto é, o encontro com as boas maneiras da lógica, que nos ensina que o desenvolvimento econômico se faz com robustos sacrifícios de poupança, constante aprimoramento do capital humano e uma indefectível dose de bom senso.

Por isso que dissemos sim ao impeachment. Não se tem, somente, o crime de responsabilidade. Mas todo um conjunto de circunstâncias que nos leva à outra metade da acusação, os chamados aspectos políticos. Pois, como tem sido averiguado na recente história dos países que dão lume ao que Samuel Huntington chamou de "third wave democratic", presidentes se tornam vulneráveis a processos de impeachment a partir da convergência de três fatores principais: escândalos de corrupção, envolvendo o núcleo central do poder; perda da maioria da câmara; recessão econômica, do tipo em que a causa está nas decisões tomadas pelo governo, e não em eventos exógenos, além dos protestos massivos que eclodiram em 2013. Dificilmente um presidente verá seu mandato ameaçado por um ou outro fator. Porém, o governo Dilma Rousseff, devido à vasta capacidade de prodigalizar erros, conseguiu dar ensejo aquilo que muitos analistas chamam de "a tempestade perfeita".

Consequentemente, a corrupção não é apenas mais um escândalo, mas uma atividade sistêmica. Como se das urnas se tivesse lavrado o monopólio de uso da corrupção, canhestramente justificado pelos petistas como um instrumento legítimo de dominação. A Providência, segundo a metafísica social petista, teria lhes conferido um papel especial no que tange à corrupção, permitindo-lhe usá-la contra aqueles que tradicionalmente a tinham como um prêmio por vencer o embate eleitoral. O saldo dessa utopia às avessas foi o agravamento de vários aspectos do sistema político, que o faz voltar-se para si mesmo, como se pode corroborar com o exponencial crescimento no número de partidos.

Já a recessão, que desponta como a mais severa desde a última, nos distantes anos 30, teve como antecipamos acima, as digitais do governo. Adicionalmente, refletem um estatismo vulgar de antes da queda do muro de Berlim, amplamente desacreditado pela fartura de evidências contrárias em razão da importância, ainda não completamente entendida por certas seitas políticas, da natureza complementar entre democracia e mercado. Nesse sentido, deveríamos está debatendo como ajustar o tamanho do estado ao do PIB, sabendo que não há estado para todos, tal como vislumbrado pelo modelo cesáreo-papista-populista ainda em voga.

E a perda da maioria no parlamento? Esta se deu, ao menos, por três razões. Primeiro porque a maioria era artificial, ou seja, a aglutinação se devia menos às ideias políticas e mais ao fisiologismo reinante. Segundo, o projeto político petista é muito recalcitrante em não compartilhar os despojos. Assim, lideranças partidárias que se atribuíam alguma importância foram relegadas a papéis secundários junto às esferas de decisão, incluído aí o vice-presidente. Terceiro: em algum momento, o governo nutriu a vil ambição de reduzir o poder de aliados importantes como o PMDB. Um erro que deflagrou uma corrida armamentista tácita nos bastidores, pois na política, assim como no mundo natural, impera o espectro da Rainha Vermelha, em que todos precisam correr continuamente para permanecer nos mesmos lugares. Destarte, ante a menor suspeição monopolista, o que fora uma vasta maioria se transforma numa oposição renhida.

Por último, temos as manifestações, cujo choque fora acachapante para o governo, visto que nasceram de forma espontânea e emergente, isto é, fora dos círculos políticos tradicionais. Na raiz dos protestos, está uma profunda insatisfação não só com o projeto petista, mas também com o sistema político como um todo, devido à sua incapacidade de responder satisfatoriamente aos anseios da população. Finalmente, a sabedoria das multidões tinha emergido; e ao emergir, se deparou com um limite bem claro: o sistema é frágil não só porque é inábil em não suprir aquilo que promete, mas, sobretudo, por permitir que determinados grupos políticos acalentem pretensões autocráticas.

No âmago lulopetista, existe uma séria propensão que faz com que o partido se veja como o portador da verdade final. Nas origens dessa maneira de ver, está a junção de marxismo e populismo. Cada qual oferecendo o que o outro não tem, a saber, a liderança carismática de cá e o conteúdo revolucionário de lá. Sendo que ambas estão definitivamente irmanadas quanto ao alto pendor messiânico, ao ponto do filósofo francês Raymond Aron denominá-las de "religiões seculares". Da crença populista, resultam governos que debilitam propositalmente as instituições de modo, que estas se transformem em apêndices da vontade da liderança carismática e do partido-estado. Opiniões contrárias não são permitidas, quando não são encaradas como inimigas da causa. Uma rápida vista de olhos no panorama de nossa Latino-América nos dá uma ideia dos resultados catastróficos. A única tendência real no populismo é o ímpeto rumo a maiores apelos irracionais.

É por isso que, tal como muitas Molly Bloom , dizemos sim ao Impeachment, porque o governo que ora desvanece só tem uma vocação, a do poder perpétuo, que gira em torno de um único pensamento: a busca irrefreável da sacralização de todas as coisas, detendo-se nas mais altas pretensões e esquecendo-se do essencial profano de nossas vidas que não pode ser redimido porque, como nos lembra a célebre frase de Immanuel Kant, tão ao gosto de outro iminente liberal, Sir Isaiah Berlin,"do madeiro tão torto de que é feito o homem, nada perfeitamente retilíneo pode ser talhado".

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Postado por Fabiano Leal
16/4/2016 às 20h34

 
A Incômoda Normalidade Democrática

A quem a democracia tanto incomoda?

A pergunta é legítima diante das declarações do ministro da Comunicação Social Edinho Silva, quando disse que os protestos ocorreram dentro da normalidade democrática. Na entrevista coletiva, conclamou os brasileiros a acreditarem no Brasil e disse que o momento é de diálogo. Mas, com a sutileza paquidérmica que caracteriza os petistas, frisou também que as manifestações tinham uma agenda que pedia o "fim da democracia". Em nota, o PT seguiu a mesma toada, apontando para os propósitos conservadores e antidemocráticos e, no final, incita à militância a defender o governo.

Ora, em que pese à participação de conservadores, as manifestações reuniram grupos dos mais diferentes matizes políticos. E, diante de um espectro tão amplo, e mutável a cada protesto, se mostra pouco útil aplicar um rótulo, tal como nossa cultura política oficial tanto gosta de fazer. Assim, não conviria chamar pautas que clamam pelo combate à corrupção, à observância as regras do orçamento, reforma política e a defesa dos valores da ética e da liberdade, como exemplos de um pendor antidemocrático. Mesmo o impeachment é uma reivindicação legítima. Pois, este não figura na Constituição? Se a população está ou não a par dos meandros do processo legal, aí já são outros quinhentos. O que não dá para dizer é que se trata de um genuíno furor golpista com tem sido freqüentemente alegado.

Já ao pedir diálogo, o ministro apontou para o momento de intolerância em que vivemos. Só que mirou um só lado, como deixou implícito na coletiva, como se aqueles que saíram à rua neste último domingo, encarnassem o emblema derradeiro da intolerância. Afinal, a intolerância é uma doença típica do universo petista; sempre refratário que é às críticas, mesmo se essas se fazem acompanhar de sólidas evidências. Uma intolerância que não vem de agora. Trata-se de algo que há muito faz parte do DNA de um partido que sofre da febre de "nostalgia soviética" em que o efeito mais visível consiste em dividi o mundo de forma maniqueísta. Como se só a eles fosse dado o privilégio de conhecer o lado certo da história. Desse modo, nada mais parecido com alguém que pede a volta da ditadura, do que um petista, pois ambos insistem, teimosamente, em acreditar em soluções que não se aplicam mais ao nosso tempo.

O governo, disse também o ministro, vai trabalhar para superar as dificuldades que levaram às manifestações. A questão é que, para os que protestaram, o governo é parte do problema e não a solução. E é a parte principal. As pessoas já sabem o óbvio: que as dificuldades não são de ordem puramente econômica. Ao contrário, que por trás da crise da economia, estão ilusões ideológicas de um projeto monopolista de poder, tanto político quanto econômico, conjugadas a uma grave crise de representação em que o sistema político já não responde aos desafios da sociedade. E, para o qual, o PT contribuiu fortemente para enfraquecer ao presumir que manteria a base aliada cativa aos seus anseios se lhes fornecessem uma ração mensal de propina, na vil esperança de cessar, definitivamente, a natureza competitiva intrínseca ao mundo político.

A crise, portanto, é política. E, dificilmente, será superada pelo otimismo irreal que o governo atribui a uma possível melhora nos indicadores econômicos. Isto, quando muito, facilitaria a reconquista de alguma popularidade, mas longe do que se viu no passado, tendo que conviver com um país, cujo conflito político se fará mais presente no cotidiano.

O fato é que a população associa, corretamente, corrupção ao governo e que esta se tornou indissociável da imagem da presidente e do Lula. Simplesmente, porque não é possível esconder que o "sistema PT", com bem designou a escritora Rosiska Darcy de Oliveira em sua última coluna no Globo (15/08/2015), foi de uma organicidade modelar, ao ponto que as digitais do planalto se tornarão indisfarçáveis.

Nesse ínterim, cabe afirmar que os brasileiros continuam acreditando no Brasil. Só não acreditam mais é no governo.

Em meio à convulsão governista, o mais grave é o planalto insistir em noções de democracia e legitimidade que satisfaz o gosto do partido e das tradicionais platéias circenses, mas que estão em profunda dissonância com o que diz a regra da lei. Isto é, a legitimidade do voto não é um cheque em branco para flertar livremente com a irresponsabilidade à revelia das instituições formais e as da sociedade civil. Nesse sentido, o significado da democracia nem é relativístico ou, como pensam muitos, propriedade de um único partido.

O que se esconde sob um pacato dia de céu azul?

Manifestações que passam ao largo da normalidade. E que deveras aborrece a retórica dos que estão assentes no poder. Manifestações que não podem ser subestimadas, já que são exemplos não de menos, mas da luta por mais democracia que ressurge, justamente, nas ruas e com o qual o PT, em especial, e os demais partidos têm muito a aprender.

Logo, os que propalam que isto ou aquilo é antidemocrático, conservador, intolerante ou pró-ditadura, estão na verdade dizendo, nesse caso, mais a respeito de si mesmos, como faz a presidente e o PT, dos que dos seus críticos.

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Postado por Fabiano Leal
20/8/2015 às 18h08

 
Festim Macunaímico

O clamor provocado pelos crimes cometidos por armas brancas é legítimo. Mas isso, por si só, não é suficiente para se conceber boas leis. Assim, esperava-se dos membros da Câmara e do Senado, minimamente, coerência e parcimônia, ao invés do deplorável fervor futebolístico com que o tema tem sido abordado, como se a excessiva falta de lucidez não lhes fosse suficiente.

O projeto exumado pelo Congresso, cuja proposta revista prevê três anos de reclusão para quem portar objetos cortantes, é de uma ilusão estarrecedora. Dificilmente os meliantes renunciarão voluntariamente ao crime devido à simples aprovação de uma lei. E uma vez aprovada, não estaríamos livres de um cipoal de regras, impondo obstáculos kafkanianos ao uso dos mais simples objetos do dia a dia. Sem consideramos os prejuízos a que empresas e indústrias estariam sujeitas pela sanha regulatória que, cedo ou tarde, resulta em maiores despesas e ineficiências. Tudo isso sem que o indivíduo esteja realmente protegido até porque, criativo como o crime é, não demoraria a substituir facas por outros artefatos. Diante disso, só nos restaria o consolo de não só criminalizar tais objetos, mas também decretar que todos são suspeitos até que se prove o contrário.

A origem dessa fantasia reside em dois aspectos principais. Primeiro, em uma tradição estatutária e codiciliar, típica da ordem jurídica brasileira, que acredita no imperativo da doutrina sobre aquilo que é o comportamento ideal do indivíduo, ao invés de se pautar na cultura anglo-saxã, onde a lei é o resultado da observação dos fatos e costumes. O segundo é como essa tradição foi reforçada pela praga do politicamente correto, que atribui à lei o papel de redimir todas as injustiças históricas, superprotegendo o indivíduo na ilusão de assegurar uma sociedade isenta de riscos e preconceitos. A meu ver, ambos os aspectos estão impregnados daquilo que Hayek chamou de "construtivismo", a tentativa de moldar a realidade a partir de um projeto teórico da sociedade. Uma vez que isso acontece, não há limites sobre o que se pode propor, levando os governos ao encontro do que Miguel Reale chamou de "totalitarismo normativo", que nada mais é, dizia Hayek, que "deixar a jarra de leite sob os cuidados do gato".

A questão, portanto, não está na escassez de leis, mas no excesso - resultado da falta de cumprimento das leis existentes. Sendo isso o reflexo de uma sociedade desigual, lastreada por uma cultura patrimonialista, cujo status quo só sobrevive se a impunidade for garantida. Afinal, como sabiamente distinguiu Tácito, "muitas são as leis num país corruptíssimo". Previsivelmente, essa sobreposição acaba por perpetuar privilégios de grupos de interesse, além de, em grande medida, ser responsável pela ineficiência dos serviços públicos, acabando por incutir na sociedade um comportamento fatalista de que a crença no império da lei seria indigna de qualquer prece. Não é à toa o fato de as regras não serem iguais para todos, e do nosso fetiche estatutário ser um perigoso passatempo aristocrático, do qual muitos incautos participam já que preferem adiar o confronto com a realidade pela promessa da Terra Prometida.

Assim, sem levarmos em conta o cerne do problema, pouco adiantará o debate em torno da maioridade penal ou sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. A maioridade penal, tema de reconhecida importância, jamais deve se vista como uma panacéia, dado as peculiaridades da violência juvenil. Ao menos, há dois bons argumentos em defesa da redução maioridade, estes são: (1) o fato de que crimes hediondos praticados por menores não sejam enquadrados como mera delinquência, pouco importando o percentual de crimes cometidos, e (2) porque se espera um poderoso golpe ao tráfico, pois elevaria os custos de recrutamento, indicando que o combate às drogas não deve ocorrer apenas no âmbito segurança, mas também atentar para alguns aspectos, digamos,típicos de uma economia-política, a saber, a forma como o crime se nutre de "incentivos anormais", oriundos muitas vezes de políticas públicas que tem como finalidade precípua combater o crime. No entanto, não há nada que indique que a eficiência vai se instalar automaticamente na vasta rede que envolve o aparato de justiça; porque esta depende de outras condições que ultrapassam em muito a existência da mera norma legal. Cabe alertar, porém, que esse argumento, bem como suas variantes, não deve servir de desculpas para transformar o assunto em um tabu.

O mais grave problema é o ECA. Simplesmente, porque já não se pode dizer que muitos dos seus fracassos sejam apenas pontuais. Na verdade, estes são causados pela vasta utopia presente em vários de seus artigos o que torna parte de suas exigências impossíveis de serem cumpridas. Sendo assim, seria infecundo perguntar sobre o que precisa ser feito para que o ECA funcione plenamente, visto deste não passar de um playground ideológico de certas seitas políticas que sancionaram aos menores a condição de intocáveis, como se estes fossem de sua propriedade.

Ora, o que a proposta da redução da maioridade penal conseguiu, ao se aprovada nesta madrugada na Câmara, foi revisar justamente aquilo que no ECA é tido como dogma. A lição é óbvia: aquilo que resiste à revisão acaba sendo passível de substituição.

O certo é que seríamos poupados de muita discussão inútil se atentássemos para o óbvio: assegurar a vigência da natureza igualitária das "regras de justiça" liberal. Assim que isso toma forma, instala-se um ambiente de relativa paz social que, em longo prazo, proporciona às regras condições de aperfeiçoamento paulatino, expurgando-as de ineficiências e incertezas. À diferença das sociedades liberais democráticas, baseadas na convicção, de que podemos melhorar continuamente, a despeito dos solavancos, é que as culturas patrimonialistas são avessas ao menor sinal de melhora por isso implicar, invariavelmente, num impulso para maior igualdade.

Logo, a proposta de proibição de armas brancas é um acinte à inteligência do cidadão crítico. Quando muito, trata-se de uma ilusão, em que políticos se creem infalíveis, por acreditarem que os complexos problemas de segurança pública possam ser resolvidos por meio de jeitinhos. A pergunta que todos se fazem é do por quê da inexistência de um padrão de policiamento capaz de identificar e coibir atos criminosos emergentes. Novamente, a conclusão é indisfarçável: de que foi o ECA que facultou, - e quero acreditar, inadvertidamente -, a realização desses crimes, em função de suas punições brandas não serem outra coisa senão o consentimento do direito de delinquir. Daí nossa bizarrice sócio-política ter alcançado níveis inauditos, ao ponto que nem Lewis Carrol faria melhor, pois na república das rainhas vermelhas se ouve um só coro: "punam-se às facas, punam-se às facas, punam-se às facas..."

(A propósito: o estado do Rio de Janeiro, como não podia deixar de ser, chegou primeiro ao rol da insensatez ao aprovar um projeto que proíbe o porte de armas brancas.)

Enfim, precisamos escolher entre a piada e a prosperidade. A prosperidade repousa numa ordem livre necessária ao desenvolvimento, não só econômico, mas também social. Já a piada fica por conta de que em Brasília, neste momento, algum político esteja burilando um projeto de lei, quiçá um estatuto, para regulamentar o ir e vir das nuvens. Resta-nos torcer que o verdadeiro clamor seja pela prosperidade, até porque piadas, mesmo as melhores, são efêmeras.

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Postado por Fabiano Leal
2/7/2015 às 14h11

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